Redação

No dia 25 de janeiro, dois trabalhadores morreram e cinco ficaram feridos em um grave acidente na indústria química Adelbrás, fabricante de produtos adesivos (fitas crepes e adesivos em geral), em Vinhedo, interior de São Paulo.

A empresa, vendida recentemente para uma multinacional canadense, possui cerca de 220 trabalhadores nesta unidade, além de outra fábrica em Manaus. Atuando com produtos altamente inflamáveis, e com um histórico de acidentes, nos quais, inclusive, frequentemente as próprias vítimas são responsabilizadas, com advertências e punições, a empresa escancara o mais absoluto descaso com a segurança e os trabalhadores.

O Opinião Socialista conversou com um membro da Cipa, não identificado para evitar retaliação da patronal, que explicou como ocorreu o acidente e falou sobre a postura da empresa.

Explique como ocorreu o acidente

O acidente aconteceu no setor de adesivos, onde trabalhamos com solventes, algo altamente inflamável. Até agora, o que a gente sabe é que houve vazamento de um dos solventes e uma faísca atiçou o fogo. Estavam fazendo o procedimento normal, jogando o produto no tanque, e, num outro tanque, estavam testando uma nova válvula automática. Então, provavelmente houve um vazamento, inclusive um dos trabalhadores avisou: ‘Olha, está tendo um vazamento ali’. Desceram pra ver e, no que desceram, veio uma bola de fogo que ocupou tudo.

Os brigadistas conseguiram agir de forma muito ágil, se não poderia ter sido muito pior, porque, aqui, os setores são muito próximos. Tem um tanque muito grande com solvente e, do lado, tem um recuperador, que é um setor muito crítico. E, do lado, há uma caldeira que, se explode, leva o quarteirão inteiro.

O que pode ter causado esse acidente?

Na minha avaliação, com base nas informações que já temos e que ainda estão sendo apuradas, o mais provável é, principalmente, a falta de procedimentos de segurança. Porque, se tem um vazamento, não há um procedimento para conter isso, quando se derrama no chão, por exemplo. Se existe alguma coisa que provoca faísca, também não poderia estar lá. Então, demonstra que a empresa tem pouco cuidado com a segurança.

O vazamento, lá, é comum. Sempre que se mexia com uma válvula, se constatava que tinha vazamento. Os funcionários sempre falavam sobre isso. E sempre pediram mais treinamento, porque o pessoal que está lá, muitas vezes, não conhece o material em que está mexendo. E a desculpa é sempre a mesma: não dá, gera custos etc.

A empresa continua funcionando mesmo após o acidente?

Voltou a funcionar normalmente. Só os setores atingidos estão parados. Mas os outros setores, incluindo o meu, de conversão, já voltaram a rodar, desde ontem (31 de janeiro). Inclusive, o diretor falou pra mim que já vão comprar matéria-prima, que a fábrica não pode parar, porque ‘é um dia após o outro, né?’, segundo ele.

Qual é o sentimento dos trabalhadores na fábrica?

Olha, primeiro de muita tristeza, né? Foi uma coisa que abalou muito todo mundo, principalmente o pessoal do 1º turno, os brigadistas que viram o pessoal ferido, queimado. Foi uma cena de guerra. Todo mundo comentou. No dia seguinte, inclusive, os brigadistas viram pedaços de pele e roupas queimadas no chão.

O pessoal está tendo dificuldade pra dormir, com aquelas imagens vindo sempre na cabeça. Muita tristeza por isso. Foram amigos nossos que morreram ou se feriram. E, depois, muita revolta também, porque todo mundo sabe que isso poderia acontecer. É muita gambiarra, no próprio setor em que houve o acidente, tudo sem procedimento, tudo sendo feito de qualquer jeito. Então, tudo isso gera uma indignação muito grande.

Qual foi a postura da empresa?

Isso também gerou muita revolta. Ela não se comunicou direito com os funcionários. Ninguém sabia se deveria ir ter que trabalhar ou não. Depois, no dia seguinte, soltaram uma nota ridícula, dizendo que tinha ocorrido só um ‘princípio de incêndio’ e que foi só um ‘incidente’. Pra quem está familiarizado com acidentes de trabalho, ‘incidente’ é quando tem uma ocorrência que não tem vítima ou lesão, sendo que havia cinco pessoas internadas e dois mortos.

Não falaram que foi um acidente grave nem nada. Depois, não teve nenhuma outra atualização. Ontem (dia 31), inclusive, as duas únicas postagens da empresa foram comemorando o “Dia do Publicitário” e o “Dia da fita adesiva”. Não se falou nada sobre os falecidos, dos que estão gravemente feridos. Isso gerou muita revolta aqui e, também, o fato de termos que voltar a trabalhar. Sem sabermos nada da segurança, sem ter nem o luto. E sabendo que a única preocupação da empresa é continuar produzindo.

Enquanto estamos conversando, acabaram de ocorrer dois protestos na empresa. O que reivindicaram?

Isso! Houve dois atos. Um na entrada do 1º turno e outro, no 2º turno. O primeiro reuniu sindicatos, organizações de esquerda e centrais sindicais. Denunciamos a empresa, por ter deixado o acidente acontecer, cobramos que ela se responsabilize pelo ocorrido e que tome medidas concretas. É preciso que haja uma investigação rigorosa, com a participação dos sindicatos, e a responsabilização da empresa. O pessoal também se solidarizou com os trabalhadores daqui, as famílias dos feridos e dos companheiros que faleceram.