Moradores da ocupação do Pinheirinho preparam resistência à ordem de reintegração de posse
Redação

 

Uma das polêmicas surgida entre os ativistas das passeatas de junho e das mobilizações que se seguiram foi sobre a violência da polícia e de como combatê-la.

É um fato que existe uma maior polarização da luta de classes.  O país não é o mesmo desde os protestos. Muitos trabalhadores e jovens que nunca participaram de mobilizações vieram para as ruas. Lutaram e gostaram, porque aprenderam que  “é possível lutar, é possível vencer”. Depois de junho, essa mudança na consciência continuou a se manifestar nas inúmeras mobilizações populares, sindicais e estudantis ocorridas.

Hoje, o que era “normal” se tornou intolerável. Os trens sempre quebraram, mas agora tem quebra-quebra quando um deles para no meio da viagem. A juventude negra sempre foi morta nos bairros da periferia. No entanto, recentemente, houve um levante popular após o jovem Douglas ser assassinado pela PM em São Paulo. O leilão de Libra provocou uma greve nacional dos petroleiros.  Como a situação concreta dos trabalhadores e do povo em geral só tende a piorar, é possível prever uma polarização crescente da luta.

Repressão vai aumentar
Os governos vão apostar nas eleições para desmobilizar as mobilizações, apontando uma falsa saída. Por outro lado, vão utilizar todas as formas possíveis de repressão para evitar que a Copa de 2014 seja questionada por mobilizações gigantescas, como ocorreu na Copa das Confederações.

A justiça está buscando criminalizar os movimentos sociais, com leis dos tempos da ditadura, e cria novas leis ainda piores. A polícia reprime duramente toda vez que pode. A greve dos professores no Rio mostrou uma repressão violenta contra os trabalhadores. A ilegalidade da ação da polícia é impressionante. Passam por cima do direito constitucional de greve.

A ordem dos governos (começando por Dilma) é tentar intimidar os movimentos sociais para evitar as mobilizações durante a Copa. A mesma postura pode-se observar com a ação da polícia nos bairros pobres e negros. Dá para se observar uma postura policial ainda mais dura. Vão querer impor o terror nesses bairros para “evitar problemas” durante a Copa.

O direito de autodefesa
E o movimento, o que pode fazer frente a isso? Não pode ser que a violência policial decida a sorte do país. A ditadura militar, cujo aniversário de 50 anos se completa em março de 2014, caiu há três décadas.

Dizem que o gigante acordou em junho. Não pode ser que cassetetes, gás lacrimogêneo e balas de borracha o façam dormir de novo. Os trabalhadores têm o direito de fazer greve. Os estudantes de ocupar as ruas. O povo de exigir saúde, educação e transporte público decentes. Não pode ser que o PT – que sofreu essa mesma repressão nas greves da década de 1980 – agora queira acabar com as mobilizações na porrada.

Os movimentos sociais têm o direito de se defender contra a violência policial. A autodefesa do movimento é uma tarefa que deve ser assumido por trabalhadores em greve, por ocupações de terras e pelas mobilizações estudantis.

Um exemplo a ser seguido
O exemplo da ocupação William Rosa é importante. As 3.900 famílias que ocuparam um terreno em Contagem, em Minas Gerais, foram brutalmente reprimidas no dia 1° de novembro pelo 18º batalhão da PM. Segundo o Frei Gilvander Moreira, da Comissão Pastoral da Terra, a polícia jogou bombas no meio das barracas, atiraram com balas de verdade e lançaram gás lacrimogêneo de helicópteros. A ocupação não se amedrontou e se manteve.

Depois disso, os ocupantes se organizaram para resistir à polícia. Conseguiram montar seus escudos e sua defesa com materiais conseguidos ali mesmo. Querem que a polícia saiba que será mais difícil bater em gente desprevenida. Esse povo tem o que defender: seu direito de lutar pela moradia, sua esperança de conseguir escapar do aluguel.

Autodefesa do movimento ou ‘tática Black Bloc’?
O exemplo da autodefesa da ocupação Williams Rosa deve ser conhecido por todos os ativistas das greves, passeatas e ocupações do país. A luta militar coletiva dos moradores da ocupação é uma extensão da luta popular. É necessário estender essa prática para os outros setores.

Os Black Blocs surgiram durante as passeatas de junho. De certa maneira são uma expressão da radicalização do movimento. Expressam uma enorme indignação com a polícia e com as grandes empresas. Alguns vêm da classe média, outros dos bairros pobres e assistiram a polícia matar outros jovens. Assim, é fácil entender como conseguem ter popularidade em setores da juventude.

É fácil entender, mas é necessário discutir se essas ações ajudam ou atrapalham as mobilizações. A nosso ver atrapalham.

Para os Black Blocs as mobilizações devem terminar em quebradeira para mostrar que são contra os bancos e empresas. No entanto, isso afasta os trabalhadores das manifestações. O resultado é que a luta coletiva contra essas empresas se enfraquece.

Da mesma forma, para os Black Blocs, a decisão sobre como e onde enfrentar a polícia não é dos trabalhadores em greve ou dos ocupantes de um terreno, como a Wiliiam Rosa. Para eles, um Black Bloc tem o direito de iniciar um conflito com a PM sem que isso tenha sido decidido pelo movimento. Mais precisamente as passeatas devem sempre terminar em confronto com a polícia, independente da relação de forças concreta e oportunidade política.

Isso significa que a luta militar, a defesa do movimento não é uma extensão da luta sindical, popular ou estudantil, que deve ser assumida pelos movimentos sociais. É uma atividade em si, descolada de tudo, que pode ser decidida pela cabeça de cada um deles na hora em que queiram.

O resultado, em geral é a precipitação de derrotas. A ação dos Black Blocs facilita a reação da polícia que encontra o movimento despreparado. As passeatas são dissolvidas e terminam de forma prematura. Para o movimento, o resultado é desastroso. Para os Black Blocs muitas vezes não.

Os Black Blocs se auto-intitulam os “defensores do movimento”. Mas ninguém lhes concedeu, ou votou essa tarefa. Assumem muitas vezes a linha de frente das passeatas, tentando impor sua política e sua metodologia. Isso não tem nada de democrático, menos, muito menos “horizontal”. Na verdade é uma postura antidemocrática, burocrática perante os movimentos.

Por esses motivos é importante que os movimentos sociais assumam sua própria autodefesa, a exemplo da Ocupação William Rosa.

Publicado originalmente no Opinião Socialista 473