Soraya Misleh, de São Paulo

Tecnologias e treinamento desenvolvidos às custas do sangue palestino derramado seguem a servir ao derramamento de sangue negro e indígena. Mais uma vez o governo paulista, agora sob gestão do bolsonarista Tarcísio de Freitas, vai buscar capacitação para a repressão e genocídio em Israel.

Treinamento que, vale dizer, não é novo e já está sendo amplamente aplicado, assim como as tecnologias militares israelenses compradas pelos governos anteriores. Mostra disso é a repressão brutal da PM contra os Guarany Mbia do Jaraguá, na capital paulista, neste dia 31 de maio, quando protestavam contra a votação no Congresso Nacional do Projeto de Lei 490/2007, relativo ao nefasto marco temporal para demarcação de terras e apelidado com razão de PL do genocídio indígena.

Além de bater nos indígenas em luta por seus direitos, o governador bolsonarista nem bem havia esquentado a cadeira do Palácio dos Bandeirantes e já deixou sua marca no contínuo genocídio negro no Estado: somente durante o primeiro bimestre deste ano, as mortes cometidas por policiais aumentaram 25%. “As polícias Civil e Militar do Estado de São Paulo mataram uma pessoa por dia ao longo dos quatro primeiros meses do governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos). Foram 151 vítimas do Estado contabilizadas entre janeiro e abril deste ano, o que representou um aumento de 8,6% em comparação ao primeiro quadrimestre do ano passado, quando as duas polícias mataram 139 pessoas”, conforme reportagem de Jennifer Mendonça publicada em 26 de maio último no portal Ponte Jornalismo.

Mãos sujas de sangue

Tarcísio parece querer bater o próprio recorde. Mostra disso é que seu secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, participa de encontro em Israel para discutir cooperação de treinamento entre as forças de ocupação sionistas e as policiais do Estado, além do “uso da tecnologia no combate ao crime” – como descreve o governo paulista em seu site oficial. Correto seria dizer à criminalização do povo trabalhador, sobretudo pobre e negro.

“Derrite está no país a convite do Governo de Israel, que promove o seminário Combate ao Antissemitismo e Terror Global. Autoridades de segurança pública de diferentes estados brasileiros e diversos países participam do encontro. […]”, descreve a nota do governo de São Paulo. E continua: “No programa, além das apresentações voltadas aos comandos das forças de segurança, estão previstos, por exemplo, a análise de casos reais por representantes das delegações e um workshop sobre sabotagem e o uso de explosivos por criminosos. Além do secretário Guilherme Derrite, também integram a comitiva o delegado-geral da Polícia Civil, Dr. Artur Dian, o coordenador operacional e do chefe da inteligência, ambos da Polícia Militar do Estado de São Paulo.”

O próprio evento é parte da propaganda do apartheid, que busca criminalizar internacionalmente os que se levantam contra o regime de segregação e colonização e denunciam Israel, sobretudo o movimento BDS (boicote, desinvestimento e sanções). Para a criminalização, iguala antissemitismo (discriminação contra semitas) a antissionismo (ser contra o projeto colonial sionista), o que é uma falácia. E se apresenta como ponta de lança no combate ao terror global, quando é quem promove o terror na vida dos palestinos cotidianamente, na contínua Nakba (catástrofe desde a formação do Estado racista de Israel em 15 de maio de 1948 mediante limpeza étnica).

No caso sionista, ainda, “casos reais” ou “testes em campo”, como seus representantes gostam de apresentar, nada mais é do que a conversão dos palestinos em cobaias humanas para o desenvolvimento de suas tecnologias da morte e treinamento, o que reverte em lucros com a exportação como destino prioritário. Somente em 2023 já são mais de 130 palestinos assassinados pelas forças de ocupação.

Estes negócios e apertos de mãos sujas de sangue sustentam o apartheid e a colonização na Palestina, enquanto servem para armar cada vez mais e melhor as polícias ao genocídio pobre e negro e extermínio indígena.

São Paulo tem uma longa ficha corrida de acordos criminosos com o Estado de Israel. Para ficar em apenas alguns exemplos recentes, em 2015, o então governador e agora vice-presidente da República Geraldo Alckmin adquiriu seis blindados israelenses para o Batalhão de Choque da Polícia Militar, a um custo de R$ 30 milhões. Um ano antes já anunciava a compra de 14 deles. Esses blindados foram amplamente utilizados para reprimir manifestações.

Já em 2020 João Doria anunciou a compra de dez metralhadoras Negev 7.62 fabricadas pela Israel Military Industries (IWI), que disparam de 600 a 750 balas por minuto, para colocar nas mãos das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) – no ano anterior, esta havia matado 98% mais, e o projeto era municiá-los com verdadeiras armas de guerra, as mesmas que as forças de ocupação utilizam na limpeza étnica de palestinos. O advogado israelense de direitos humanos, Eitay Mack, entrou com uma ação para tentar impedir isso.

Em tempos de mais repressão, criminalização e prenúncio de mortes pelas mãos da polícia, é urgente articular a solidariedade com o povo palestino, oprimidos e explorados, para denunciar e barrar novos acordos com o apartheid israelense. Vidas palestinas, negras e indígenas importam.