Após 31 anos de atividade, grupo de Michael Stipe anuncia o seu fim‘A qualquer pessoa que se sentiu tocada pela nossa música, nossos maiores agradecimentos’. Foi assim que o grupo REM anunciou o término de suas atividades, após 31 anos de carreira. A lacônica despedida postada no dia 21 de setembro no site oficial foi inversamente proporcional à importância que a banda ocupou no cenário do rock nas últimas décadas.
O REM deixa assim os palcos para entrar na história da música. Não só pela qualidade das canções, mas pela integridade de sua carreira. O nome vem de Rapid Eye Movement´, o estágio mais profundo do sono. Surgida na pequena Athens, na Geórgia, mesma cidade de grupos como B-52´s, a banda teve início em 1980 quando o então estudante de arte Michael Stipe se uniu a outros amigos como o baixista Mike Mills, o guitarrista Peter Buck e o baterista Bill Berry a fim de tocar no efervescente circuito universitário da região.
A banda se tornaria marco do que viria a ser conhecido como college rock´, ou simplesmente rock alternativo´, que se proliferava através das estações de rádio dos campi universitários, principalmente dos EUA e Canadá. Influenciados por diferentes estilos como o punk, o pós-punk e o New Wave, esse circuito era a alternativa aos artistas que buscavam liberdade de criação por fora do mainstream´.
O rock direto, em até certo ponto simples e de letras inteligentes que se emolduram perfeitamente na bela voz de Stipe, ganhou notoriedade e respeito nesse meio. As letras do REM sempre foram repletas de críticas, principalmente ao governo. No álbum Document de 1987, por exemplo, a música Exhuming MacCarthy´ (Exumando McCarthy´), atacava o presidente Ronald Reagan, envolvido na época com o escândalo dos Irã-contras´, que Stipe na música compara ao mccartismo.
Apesar de já contar nos ano 80 com uma sólida carreira no underground e vários sucessos, foi com The One I Love´ que o grupo assinou um contrato com uma grande gravadora e foi considerada, em 89, a melhor banda de rock dos EUA. No entanto, enquanto alguns grupos vêem sua criatividade escorregar enquanto escalam a montanha da fama, deixando-se levar pela pressão comercial e formatação imposta pelas grandes gravadoras, o REM parecia imune a isso.
Em 1991, lançam o que seriam seu mais conhecido álbum, o Out of the time´, com seu maior sucesso, Losing my religion´. Numa época em que proliferavam os clipes´, insuflados pela MTV, o vídeo da música se tornou um dos mais conhecidos da história. Losing my religion´ é uma expressão típica do sul dos EUA, que significa perder a paciência´, ficar no limite´ e, segundo Stipe, se refere a um amor não correspondido, uma obsessão.
Apesar disso, o vídeo da música com versos como “That’s me in the corner/That’s me in the spotlight/Losing my religion” “Aquele sou eu no canto/Aquele sou eu na luz/Perdendo minha religião” chegou a ser proibido em alguns países. O diretor do vídeo, o indiano Tarsem Singh, inspirou-se em pintores como Caravaggio, o próprio Michelangelo e em diretores como Tarkovsky para criar uma verdadeira obra-prima.
Outro sucesso do mesmo álbum foi o alegre´ Shiny Happy People´, canção gravada com a vocalista do B-52´s e de tom marcadamente irônico que, segundo alguns, faz referência ao massacre da Praça da Paz Celestial ocorrido dois anos antes. Já no ano seguinte o grupo lança o Automatic for the People, com músicas como Man on the Moon´ e a bela e triste Everybody Hurts´, cujo vídeo é outro primor, mostrando que é possível perfeitamente conciliar uma boa canção pop a um vídeo clipe´ elaborado.
Mesmo que no esquema das grandes gravadoras, o REM atravessou a década de 1990 quase como uma ilha de originalidade em meio ao mar de mediocridade que dominou o cenário do rock no período, excetuando o efêmero fenômeno grunge de Seattle. Não por acaso, Kurt Cobain era fã declarado da banda de Stipe. E assim seguiu por toda a década seguinte, o grupo agora já transfigurado em baluarte do rock.
Michal Stipe, em 2008, fez questão de assumir plenamente sua homossexualidade. Disse que antes não entendia no que isso fosse interferir na vida das outras pessoas, mas depois percebeu que o ato poderia ajudar as outras pessoas na mesma situação e na luta contra a homofobia.
Na justificativa para o derradeiro comunicado oficial da banda, Stipe afirmou que um sábio sabe a hora de se retirar de uma festa. O REM, assim, sai de forma digna da história da música pela porta da frente, ao contrário de outros grupos que vêem na atividade um mero caixa eletrônico para sacar dinheiro a cada dois ou três anos. Mostrou que a massificação imposta pela grande indústria fonográfica não é capaz de acabar com a inteligência e a originalidade de belas canções.
Sem mistificações, foi uma grande banda e que fará falta. Principalmente aos milhões de pessoas que se sentiram tocadas´ por suas músicas nas últimas três décadas.