Crescem as ocupações de terra e a burguesia tenta criminalizar os movimentos sociais. Nesse jogo, O governo não está no time da reforma agrária. Enquanto Lula fala em defender a lei, os latifundiários organizam milícias

A questão agrária sintetiza um dos pontos altos da tremenda polarização social existente no Brasil. Os números da Comissão Pastoral da Terra (CPT) demonstram a extrema concentração da propriedade.

Defendendo o latifúndio produtivo, o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, diz que o agronegócio é a chave para o Brasil se tornar o maior produtor agrícola mundial.

O que ele não diz é que os carros chefes da produção agrícola nacional são a soja e os produtos para exportação. Uma política que só beneficia os patrões do latifúndio. O modelo agro-exportador é gerador de miséria: destrói a agricultura familiar, causa êxodo, desemprego e concentração de terra.

A POLíTICA AGRÁRIA DO GOVERNO LULA

O governo cortou verbas da reforma agrária para pagar juros aos banqueiros. Dos R$ 462 milhões previstos originalmente no Orçamento deste ano, sobraram R$ 249 milhões. Agora, o Incra só pode dispor de R$ 162 milhões.

Lula prometia assentar 140 mil famílias este ano, depois baixou para 60 mil e, segundo o superintendente regional do Incra no Rio de Janeiro, a verba existente permite assentar apenas 15 mil em todo o país.

A CRIMINALIZAÇÃO DO LUTADOR SOCIAL

As ocupações encontram latifundiários armados até os dentes. Entre 1985 e 2001 – no “Estado Democrático de Direito” – foram assassinados 1.208 sem-terra e apenas 8 mandantes foram condenados. Neste ano, mais de 30 já foram assassinados.

A violência ocorre também na forma de despejos, torturas, prisões arbitrárias, destruição de casas, etc. A violência legal só tem crescido a cada ano: ameaça de despejo (20,44%); despejo jurídico (7,72%) e prisões (5,03%).

A prisão de José Rainha é simbólica: lutador social é preso, levado para presídio de segurança máxima, acusado de “furto qualificado e formação de quadrilha”, considerado bandido.

REFORMA AGRÁRIA DE ACORDO COM QUE LEI?

A mídia burguesa fez enorme estardalhaço com a frase de João Pedro Stédile: “A luta camponesa abriga hoje 23 milhões de pessoas. Do outro lado há 27 mil fazendeiros. (…) Será que mil perdem para um? (…) O que nos falta é nos unirmos, para cada mil pegarem um.” Essa frase, comum e óbvia para qualquer lutador, foi motivo de escândalo para a burguesia e desautorizada pelo governo.

O ministro da Agricultura declarou que isso era “uma ameaçadora agressão ao Estado de Direito e à democracia.” Já o da Justiça, defendeu a ação armada “legal”, dizendo que jagunço não pode, mas segurança privada pode.

Lula, por sua vez, disse: “Não vamos permitir a ilegalidade por parte de um lado ou outro”. Mas a Constituição e a lei defendem a propriedade capitalista.

Até hoje a Lei de Crimes Hediondos é utilizada para combater movimentos sociais, com acusações de formação de quadrilha. A Medida Provisória 2.183 editada por FHC não foi alterada pelo PT. Esta MP anti-invasões criminaliza o movimento e retira do programa de reforma agrária, durante dois anos, as terras ocupadas e os que participaram das ocupações.

Baseado nela, o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) disse que a lei será cumprida: “Ninguém revogou a medida provisória anti-invasão. Temos de respeitar a lei. Em São Paulo não há reintegração de posse que não seja cumprida”.
Segundo a Lei Estadual 4.957/85, para se cadastrar uma família precisa morar há dois anos na região e ter “vocação agrícola”, avaliada pelo governo. Ela exclui os acampados do Pontal do Paranapanema. O ministro Miguel Rosseto prometeu dar prioridade ao assentamento no Pontal, mas foi desautorizado pelo secretário de Justiça, Alexandre de Moraes: “As famílias acampadas não terão prioridade. Estão se formando verdadeiras quadrilhas para fomentar invasões.”

O LATIFÚNDIO ESTÁ SE ARMANDO

Enquanto o governo Lula fala em defender a lei, os latifundiários organizam milícias. A União Democrática Ruralista (UDR) é uma das entidades que oficializa esta organização. Federações da Agricultura também. Em Pernambuco, “empresas de segurança” dão fachada legal à pistolagem. Há organizações paramilitares. E há os que se apresentam como são: grupos de pistoleiros contratados por fazendeiros, como no Pará.

Qualquer que seja a forma, a pistolagem existe alimentada pela impunidade.
Gilmar Mauro denunciou: “Não há uma investigação séria” da Polícia Federal das denúncias de formação de milícias. “Uma investigação séria significa averiguar os crimes do latifúndio, significa dizer que quem é violento neste país não são os trabalhadores rurais, mas os latifundiários que se armam (…) e assassinam trabalhadores, infelizmente sem a punição da Justiça.”

Post author Américo Gomes,
de São Paulo
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