Quintana

Lançada a coletânea completa de um dos poetas mais populares do país“Todos esses que aí estão
atravancando meu caminho,
eles passarão…
eu passarinho!“

(Poeminha do Contra)

Essa é uma das perolas que expressam a genialidade e o humor de Mario Quintana, o poeta cuja obra tem se tornado cada vez mais popular. O mestre na arte de lutar com as palavras destacou-se pelo estilo breve, coloquial e surpreendente. Na forma, experimentou todas e não seguiu nenhuma. Poeta que sempre foi, até a sua prosa é cheia de lirismo. Esmerou-se em cantar, criticar e humorizar a vida, as coisas simples, os costumes, o tempo e a morte.

Hoje, 11 anos após seu falecimento (em 5 de maio de 1994), os fãs de Quintana podem encontrar nas livrarias os primeiros volumes da Coleção Mario Quintana (Editora Globo), que abarca a obra completa do poeta. No dia 28 de abril, na Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre, foram lançados os três primeiros volumes da coleção: A Rua dos Cataventos, primeira e mais importante obra, de 1940, Canções (1946) e Sapato Florido (1948).

A coletânea tem o grande mérito de recuperar a seqüência original do trabalho do autor. As sucessivas antologias reuniram várias obras em um só volume, nem sempre com o devido cuidado. Se essa era uma dívida do meio editorial com Quintana, o mesmo não acontece com o público-leitor, que tem aumentado a cada dia.

Longe do hermetismo, da metafísica e do rebuscamento, Mário Quintana possui estilo breve e um humor saboroso. Sua temática, que envolve a vida cotidiana, reflexões sobre o amor, a morte e o tempo, contribui para tornar seus poemas acessíveis, sem perder a qualidade estética. Pertencente a segunda geração do modernismo brasileiro, escreveu poemas livres e brincou com a sonoridade e musicalidade das palavras.

“Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese”, afirmou o próprio poeta. O trecho abaixo é exemplo de sua visão poética de uma cena comum:

“Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
nem desconfia que se acha conosco desde o início
das eras. Pensa que está somente afogando problemas
dele, João Silva… Ele está é bebendo a milenar
inquietação do mundo!“

Como escreveu a Agência Carta Maior, “ao lado de Vinícius de Moraes, Mario Quintana tornou a poesia lírica uma experiência alcançada com prazer por todo tipo de leitor, sem perda de qualidade, facilitações ou concessões à moda”.

Em 1966, a primeira Antologia Poética de Quintana, organizada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos, inseriu o autor no circuito nacional e contribuiu para popularizar sua obra. No lançamento, Manuel Bandeira recita um poema em sua homenagem: “Quinta-essência de cantares… Insólitos, singulares… Cantares? Não! Quintanares!” (trecho).

De fato, o estilo de Quintana é tão particular que merece nome próprio. No Brasil, possui 28 títulos publicados (entre poemas, prosas poéticas e poesia infanto-juvenil), quatro antologias e traduções em espanhol e inglês. “Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão”, afirmou o autor, aos 78 anos, no texto publicado no site da Casa de Cultura Mario Quintana.

Nasceu em 30 de julho de 1906, em Alegrete (RS). Viveu também em Porto Alegre e no Rio de Janeiro. Lá em meados da década de 30, foi jornalista e tradutor – trabalhou com obras de Balzac, Aldous Huxley, Joseph Conrad, Marcel Proust e Virginia Woolf. Recebeu, em 1981, o Prêmio Machado de Assis e o Prêmio Jabuti de Personalidade Literária do Ano.

Depois de tantos “quintanares”, Mario Quintana morreu aos 87 anos, e sua filosofia de vida, sem qualquer autoridade ou academicismo, aparece em mais essa preciosidade:

“A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos“.

  • Páginas relacionadas
    Casa de Cultura Mario Quintana