O cantor, compositor e músico Luiz Melodia, morreu nessa sexta-feira (4) no Rio de Janeiro. Melodia faleceu em decorrência de complicações de um câncer na medula óssea. O cantor tinha 66 anos e estava internado no hospital Quintal D’Or. Chegou a fazer um transplante de medula mas não vinha tendo bons resultados com a quimioterapia. Foi casado com a produtora Jana Reis e pai de dois filhos: Hiran e o rapper Mahal Reis.
Luiz Carlos dos Santos nasceu em 7 de janeiro de 1951, na cidade do Rio de Janeiro. Cresceu no Morro de São Carlos, no bairro do Estácio, um dos berços do samba nacional. Samba, aliás, que desde cedo acompanhou de perto. Luiz era filho do sambista Oswaldo Melodia, de quem herdou o nome artístico. Afeito à música desde pequeno, durante sua infância e adolescência acompanhava as rodas de samba e boemia da região. Além do samba, Melodia também passou pelo bolero e pelo rock n’ roll, que começava a estourar na década de 1950. Também era fã da música nordestina de Luiz Gonzaga.
Embora fosse filho de músico e tenha começado a tirar seus primeiros acordes nos instrumentos de seu pai, durante muito tempo não teve seu apoio para a carreira artística. Oswaldo queria ver seu filho formado “doutor”. Com o tempo, mudou de opinião e quando faleceu, Luiz Melodia afirmou que junto com pai perdia um de seus maiores fãs.
Luiz Melodia começou sua carreira em 1963, tocando em casas noturnas e bares com seus amigos. Durante o dia, trabalhava como vendedor e fazia outros bicos. Também tocava em festas de aniversários e chegou a participar de inúmeros programas de calouros, cantando algumas músicas de Jovem Guarda. Seu primeiro conjunto foi Os Instantâneos, formado em parceria com Manoel, Nazareno e Mizinho. Nessas idas e vindas na boemia carioca, acabou conhecendo o poeta Wally Salomão e o jornalista e também poeta Torquato Neto, grande entusiasta da contra cultura e, em especial, do movimento tropicalista.
Através deles conheceu Gal Gosta, que já fazia sucesso na época. Gal logo se identificou com suas composições e em 1971 gravou Pérola Negra. A música tornou-se um sucesso de seu álbum Fa-tal – Gal a todo vapor. No ano seguinte, em 1972, Maria Bethânia gravou Estácio, Holy Estácio, em seu álbum Drama. Estavam abertas as portas para que Luiz Melodia gravasse seu primeiro álbum, quem veio em 1973: Pérola Negra.
Pérola Negra é hoje um dos grande discos da música brasileira. Além de toda sua vivência no samba, Luiz Melodia pôs em suas faixas também sua influência herdada do choro e do forró, mas também do blues, do jazz e do soul. Isso fica claro nas faixas oito, Farrapo Humano, e nove, Objeto H.
Com esse trabalho, Luiz Melodia apresentava o samba da Estácio à guitarra elétrica, se aproximando do movimento tropicalista. Em 1975 gravou seu primeiro sucesso autoral: Ébano, música com a qual chegou a final Abertura, exibido pela TV Globo. “Meu nome é Ébano”, cantava Luiz em referencia à negritude. Não só a sua, mas a de muitos. Desde sempre Melodia cantou a negritude do nosso povo. Ébano é uma madeira escura e muito resistente, que durante muito tempo foi usada na fabricação de instrumentos musicais como clarinetes, oboés e as teclas pretas do piano.
Gravou em 1976 o álbum Maravilhas contemporâneas, em que trazia o sucesso Juventude transviada. “Lavar roupa todo dia, que agonia / Na quebrada da soleira, que chovia”. Em 1978 gravou Mico de circo; em 1980 gravou Nós, e em 1983, Felino e outros. Foram ao todo 14 álbuns sendo o último, Zerima, gravado em 2014. Luiz Melodia recebeu em 2015 o Prêmio Música Popular Brasileira por esse disco.
Luiz Melodia não fez sucesso apenas no Brasil. Participou de importantes festivais internacionais na Suíça e na França, onde, em 2004, foi destaque no Festival de Jazz de Montreaux. Seu último show foi em Jaú, interior de São Paulo, em 2016. Nesse mesmo ano teve um princípio de Acidente Vascular Cerebral (AVC) e foi diagnosticado com câncer, que tentava combater desde então.
Bamba que desceu o morro e dono de uma voz aconchegante, Luiz Melodia transitou pelo samba, pelo choro, forró, soul, blues e jazz de maneira única. Habilidade que só possuem os muito íntimos da música. Soube casar sua genialidade com toda negritude herdada, sem nunca perder as raízes.
Se alguém quer matar-me de amor
Que me mate no Estácio
Bem no compasso, bem junto ao passo
Do passista da escola de samba
Do Largo do Estácio