Em 1920 foi fundada em Moscou, na então União Soviética, a Internacional Sindical Vermelha (ISV), logo após o III Congresso da Internacional Comunista. A iniciativa buscou agrupar os sindicatos de orientação revolucionária que se opunham ao reformismo.

Faziam parte dela os sindicatos sob orientação dos partidos comunistas e uma parte daqueles sob a direção dos anarco-sindicalistas e sindicalistas revolucionários. Os debates em torno de seu programa de fundação e seus estatutos resumiram toda a experiência acumulada pela classe operária até então. Procuraremos neste artigo tratar alguns pontos, deixando os demais para outra oportunidade.

A independência e a neutralidade dos sindicatos
Um dos debates mais vivos desse período foi sobre as relações da ISV com a Internacional Comunista. Nas negociações iniciais os representantes dos sindicatos russos haviam se pronunciado pela transformação da ISV em uma simples seção da III Internacional. Todas as delegações, à exceção da búlgara, se opuseram a essa fórmula. Foi votada uma resolução defendendo a criação de uma organização independente, mas ligada ideológica e organicamente à III Internacional.

No entanto, essa resolução gerou uma tempestade de protestos dos anarco-sindicalistas e sindicalistas revolucionários de diversos países, de tal forma que o Conselho Central da ISV, reunido em 22 de fevereiro de 1922, teve que esclarecer seu verdadeiro conteúdo: “Considerando que a ISV representa a união de todas as forças revolucionárias do movimento sindical internacional e agrupa em suas fileiras sob uma mesma bandeira os operários sindicalistas, comunistas, e sem partido (…) o Conselho Central da ISV declara que a resolução formulada não implica a subordinação dos sindicatos aos partidos comunistas ou da ISV à III Internacional, senão que persegue exclusivamente como fim a colaboração de todas as forças organizadas da classe operária na luta pela derrubada do regime capitalista.”

As discussões, porém, não cessaram. A delegação dos sindicalistas revolucionários franceses, dirigida por Monmousseau, defendeu no II Congresso da ISV (1922) a resolução do Congresso da Confederação Geral do Trabalho Unitária (CGTU) de aderir à ISV sob a condição de supressão do artigo 11 do estatuto que tratava do tema, exigindo a completa independência do movimento sindical. A delegação soviética fez uma concessão e concordou com a supressão. “O Congresso”, no entanto, “confirmou a necessidade indiscutível da colaboração entre as internacionais”. (Andrès Nin, “As organizações operárias internacionais”).

Mesmo assim, as discussões não tiveram fim e acabaram revelando o verdadeiro conteúdo das diferenças. Uma parte do sindicalismo revolucionário e do anarco-sindicalismo logo adotou uma atitude hostil perante a revolução russa e a ISV, vindo a romper com esta.

Não entendiam que na época de decadência do imperialismo os sindicatos estão numa encruzilhada: ou seguem uma política revolucionária ou cairão sob a influência do reformismo. Deste ponto de vista não há nenhuma possibilidade de autonomia política. Defender a total independência dos sindicatos dos partidos comunistas seria afastá-los de sua influência e, por conseqüência, da orientação revolucionária.

Autonomia garantida
No entanto, falar na impossibilidade de uma “independência” política frente ao partido comunista não significa violar a verdadeira autonomia dos sindicatos.

Trotsky, em seu texto “Comunismo e Sindicalismo”, esclarece: “A autonomia real, prática e não metafísica, da organização sindical não se vê perturbada nem diminuída, um milímetro que seja, pela batalha do partido comunista de influir nos sindicatos. Todo membro do sindicato tem direito a votar como melhor lhe pareça e a escolher o que julgar melhor. Os comunistas como os demais gozam deste direito. Que os comunistas ganhem a maioria nos órgãos diretivos está totalmente de acordo com o princípio de autonomia, ou seja, de auto-administração dos sindicatos.”

Mais à frente conclui: “o partido não lhes impõe nenhuma linha de conduta que contradiga a disposição nem as opiniões da maioria dos membros dos sindicatos”. Na verdade, somente sob a influência dos partidos comunistas os sindicatos poderiam seguir uma orientação política revolucionária e garantir a “verdadeira autonomia”.

Dividir ou conquistar os sindicatos?
Este foi outro importante tema em debate. As repetidas traições dos reformistas provocaram uma enorme indignação em alguns dos setores mais avançados do proletariado e algumas organizações, como o I.W.W. – Operários Industriais do Mundo – dos EUA. Eles passaram a defender o abandono dos sindicatos reformistas e a fundação de sindicatos paralelos.

A quase totalidade do congresso de fundação da ISV se pronunciou contra esse ponto de vista. Aparentemente revolucionária, essa tática divisionista encobre a impotência e o medo frente às dificuldades da luta. Decidiu-se pelo dever dos comunistas de atuarem, de maneira geral, no interior dos sindicatos reformistas para denunciar as traições dos seus dirigentes e ganhar a confiança dos trabalhadores.

Esta questão fez surgir no interior da ISV duas correntes opostas. A da maioria dos sindicatos russos defendia a unidade a qualquer custo. A outra, durante um período representada por Alexandre Losovsky (1878-1952), secretário-geral da ISV, defendia a ruptura como linha geral, ainda quando as condições fossem pouco favoráveis.

A resolução do II Congresso da Internacional Comunista de 1920 (“O movimento sindical, os comitês de fábrica e as usinas”) adota uma posição sobre o tema, reafirmando a orientação de manter o trabalho nos sindicatos reformistas, mas afirma que “a unidade não poderá significar o abandono do trabalho revolucionário”. E alerta: “Se acontecer de uma cisão se impor como uma necessidade absoluta, os comunistas não deverão temê-la. (…) No caso de uma cisão se tornar inevitável, os comunistas deverão prestar atenção para que essa cisão não os isole da massa operária”.

Post author Paulo Aguena, da direção nacional do PSTU
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