No dia 3 de junho vai acontecer a 22ª Parada do Orgulho LGBT em São Paulo. O tema desse ano será as eleições, com o slogan: “Poder pra LGBTI, Nosso voto, Nossa voz”. No site da APOLGBT (a ONG que organiza a Parada), está colocado a justificativa da escolha do eixo:

“Sim, nós podemos. Pois temos o poder nas nossas mãos; o nosso voto. Neste ano, ele será nossa voz, nossa arma e nosso trunfo. Precisamos nos empoderar das urnas e dos nossos direitos conquistados para elegermos presidente, governadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores que nos enxerguem como cidadãs e cidadãos e nos representem, sejam eles e elas LGBTI+ ou não. Pois estamos vivendo um momento em que é imprescindível nos colocarmos contra um discurso cheio de preconceitos e ódio, utilizado por políticos mal intencionados. ”

Muitas vezes nós escutamos que devemos votar em candidatos LGBT’s, negros ou mulheres, pois dessa forma conquistaremos mais políticas e talvez até nossa libertação pelas eleições, que a saída para a maioria dos nossos problemas está em votarmos de forma consciente. Gostaríamos de fazer uma discussão aqui de que a saída para nossa real libertação não está nas urnas, mas na luta independente.

A democracia que vivemos hoje é uma democracia que serve aos ricos e donos de empresas. As eleições são parte disso, por dois motivos. Em primeiro lugar porque é um jogo de cartas marcadas, com regras antidemocráticas; aparece mais para o povo nas campanhas e propagandas e ganha mais votos aqueles candidatos que recebem mais financiamento de empresas, ou seja, aqueles que mais se comprometem em aplicar o projeto dos empresários quando ganharem (é aquela velha frase: quem paga a banda escolhe a música). Em segundo lugar, porque todos que são eleitos são submissos à vontade dos banqueiros, burgueses e imperialistas.

Por exemplo, em São Paulo, o ex-prefeito Dória cortou mil linhas de ônibus, queria aplicar uma reforma da Previdência para os funcionários públicos, cortou o passe-livre estudantil, etc. Os trabalhadores eram a favor disso? Não! E o Dória perguntou à população se queriam essas reformas? Não! Além disso, Dória falou na campanha eleitoral que ia cortar do transporte, da educação, da Previdência, da saúde? Também não! Tentam passar para nós a ideia de que podemos mudar nosso destino pelo voto, mas na verdade não é bem assim. A cada quatro anos estamos escolhendo quem vai nos explorar. Muitos trabalhadores já percebem isso e perdem as esperanças nesse processo furado, não é à toa que Dória perdeu para nulos, brancos e abstenções.

Com as LGBT’s não é diferente. Todos os anos eleitorais vemos propagandas falando em defesa do casamento homoafetivo, pela criminalização da LGBTfobia, entre outros, mas quando chega na hora nossos direitos são vendidos e usados como moeda de troca.

Poderíamos então nos perguntar: como combater esses setores reacionários, Bolsonaro, Feliciano, Silas Malafaia, etc.? Não seria importante votarmos em gente como a gente?

Temos alguns exemplos de governantes LGBT’s, negros e mulheres que não estiveram ao lado dos oprimidos e dos explorados. Nas últimas eleições municipais, em São Paulo, foi eleito o vereador Fernando Holiday, do Movimento Brasil Livre (MBL). Ele é jovem, negro e gay assumido. Mesmo assim, em seu primeiro pronunciamento depois de eleito defendeu a extinção da Secretaria de Igualdade Racial e da “Secretaria LGBT”. Ele também é contra as cotas raciais e defende para a cidade um projeto neoliberal, de incentivo à privatização.

Outro exemplo importante é da ex-presidente Dilma Rousseff. Quando Dilma foi eleita, muitas mulheres acreditaram honestamente que sua situação de vida iria mudar. Porém, a situação de violência machista contra as mulheres piorou durante seu governo, bem como o feminicídio de mulheres negras, que aumentou em 60%. O governo de uma mulher não investiu em políticas de combate à violência, não avançou na legalização do aborto nem na criminalização da LGBTfobia.

As lições que podemos tirar desses dois exemplos é de que ambos, mesmo sendo negros, mulheres ou LGBT’s, tem por trás um projeto ligado aos banqueiros e empresários, que rifam os nossos direitos, e não estavam do nosso lado. Não basta ser do setor, é preciso estar com a classe trabalhadora.

Os direitos das LGBT’s trabalhadoras só serão arrancados dos exploradores pela luta e pela organização independente. Devemos ir às ruas contra violência LGBTfóbica, pela despatologização das identidades trans, contra a cura gay, por saúde e educação públicas de qualidade, contra as reformas dos governos e contra Temer e esse Congresso corrupto.

Mas não apenas isso, só conquistaremos tudo a que temos direito e a real liberdade se fizermos uma revolução socialista, para construir uma sociedade que quem mande de verdade sejam os trabalhadores e não os empresários. Isso vale não só para as LGBT’s, mas para as mulheres, negros, jovens da classe trabalhadora. As LGBT’s trabalhadoras precisam se unificar com os demais setores de trabalhadores para organizar os debaixo e derrubar os de cima!

Que papel cumpre hoje a parada LGBT?
Gostaríamos de trazer aqui também um debate sobre o papel que cumpre hoje as paradas LGBT’s pelo país afora.

Em 1996 aconteceu na Praça Roosevelt em São Paulo uma das primeiras manifestações públicas que reivindicava aberta e diretamente os direitos das LGBT’s. A partir dessa primeira manifestação foi impulsionada para o ano seguinte a primeira parada na cidade, que reuniu cerca de 2 mil pessoas na Avenida Paulista e lutava contra a discriminação e violência às LGBT’s. A marcha também buscou dar visibilidade ao tema, por isso o eixo: “Somos muitos, estamos em várias profissões .”

Essas primeiras paradas buscavam se espelhar nas marchas que aconteciam nos EUA, desde 28 de junho de 1969, quando explodiu a Revolta de Stonewall, momento em que lésbicas, transexuais, gays resistiram a uma batida policial nos bares que frequentavam e se enfrentaram com a polícia por dias. A revolta de Stonewall foi um marco no movimento LGBT internacional e virou referência na resistência contra LGBTfobia.

Com o passar dos anos, no Brasil, a parada começou a perder seu caráter de luta e isso aconteceu porque os empresários e os governos viram nesse espaço uma forma de cooptar o movimento e lucrar. A prefeitura e os empresários passaram a fazer grandes investimentos no evento e aos poucos ele foi perdendo seu caráter político e reivindicatório.

Atualmente, vão cerca de 3 milhões de pessoas à parada de São Paulo, que é uma das maiores do mundo, com patrocínio de várias empresas tais como a UBER, Burguer King, Doritos, entre outras. Só nas redes de hotéis localizados na Paulista ou no centro a estimativa é que na semana da parada se movimentem cerca de 2,4 milhões de reais por dia.

De acordo com o próprio ministro do turismo: “os números referentes à Parada do Orgulho LGBT em São Paulo só comprovam que grandes eventos são fundamentais na atração de um número cada vez maior de turistas para nossos destinos, movimentando, assim, a economia. E pensando em atender cada vez melhor os diversos perfis de viajantes, o Ministério do Turismo lançou, no final de 2016, a cartilha Dicas para atender bem o turista LGBT”.

O debate que estamos trazendo aqui é que os empresários e governantes ao longo desses anos usam a parada e o comércio especifico para pessoas LGBT’s para lucrar cada vez mais. É por isso que a Doritos, por exemplo, distribui salgadinhos coloridos, para mostrar que “está ao lado das LGBT’s”. Poderíamos nos perguntar: mas não seria bom essas empresas declararem esse apoio para nos dar mais visibilidade na luta?

Na verdade, quando as empresas parecem que se postulam ao lado dos setores oprimidos, o que querem centralmente é garantir que aquele público seja consumidor de seus produtos. Na hora de explorar os trabalhadores, porém, as empresas não hesitam na hora de retirar nossos direitos. Com as LGBT’s isso é muito latente, somos o setor que está nos piores postos de trabalhos e a precarização vai aumentar ainda mais com a aplicação da reforma trabalhista.

Também somos um setor com altos níveis de desemprego. Nossa situação dentro da sociedade capitalista não é fácil. Agora fica a questão: Essas empresas que se dizem amigas das LGBT’s são contra a reforma trabalhista, por exemplo? Definitivamente não. Ou ainda, essas empresas deixariam de retirar direito dos trabalhadores? Também com certeza não. Ou seja, eles nos querem para que sejamos mercado consumidor e mão-de-obra barata e precarizada! Elas lucram com a nossa opressão, a exemplo da Uber, que se beneficia do medo que as LGBT’s tem de voltar para casa sozinhas, dados os altos índices de agressões e homicídios dos quais somos vítimas.

Quais são nossas conclusões?
A conclusão que queremos chegar é que os empresários e governos cooptam a parada para garantir lucros e também para canalizar a luta das LGBT’s para uma grande festa do mercado pink e do turismo. Buscam domesticar nossas lutas e ganhar milhões em cima disso. Buscam apagar nossa história de lutas.

Nós discordamos da organização da Parada, acreditamos que a libertação não virá nem do voto, nem do consumo, mas da força das lutas independentes dos explorados e oprimidos.

Chamado: por um bloco classista a serviço da rebelião!
Nós do PSTU fazemos um chamado para a construção de um bloco classista e independente na parada desse ano, para dizer claramente: Nossa voz não vem dos votos, mas da luta! As eleições não vão acabar com a opressão, e precisamos seguir o exemplo dos caminhoneiros em luta para organizar uma nova greve geral para barrar as reformas e garantir nossos direitos, empregos e vida. Queremos resgatar a tradição de Stonewall e fazer do dia 28 de junho, aniversário dessa importante revolta, um dia de lutas contra todos os governos e o sistema que nos diz que nossas vidas não valem nada!

Chamamos as LGBT’s trabalhadoras a se organizarem para fazer uma rebelião socialista, que acabe de vez com a opressão e a exploração.

Nessas eleições, estamos apresentando a pré-candidatura de Vera e Hertz, não porque achamos que é assim que mudaremos nossas vidas, mas para apresentar de forma independente uma saída socialista contra a crise capitalista aos trabalhadores e jovens, contra essa falsa democracia. Uma saída que só é possível se dar através de uma revolução.

Nós defendemos o desarquivamento e aprovação do PL 122: criminalização da LGBTfobia já! O reconhecimento das identidades trans e despatologização da transexualidade. A regulamentação do nome social. Acesso ao atendimento médico que supra as demandas das LGBT’s pelo SUS. Uma educação que ensine o respeito e a diversidade. O fim da cura gay: As LGBT’s não são doentes, doente é o capitalismo! Mas não devemos parar por aí: só conseguiremos uma vida plena, sem opressão e exploração em outra sociedade, uma sociedade socialista. Chamamos a todas LGBT’s trabalhadoras e jovens a entrar nesse projeto conosco.