MARIUCHA FONTANA,

da Redação

O resultado do primeiro turno antes que nada significou uma derrota do governo. As urnas revelam que o povo em sua ampla maioria, mais de 70%, está na oposição e quer mudança.
Há um enorme descontentamento entre os de baixo.
As eleições são um terreno da burguesia, nas quais o poder econômico e a mídia têm peso preponderante. Os trabalhadores participam das eleições burguesas de forma diluída e individual – cada homem um voto – e não como coletivo, como classe e com seus métodos de luta. Por isso mesmo, as eleições sempre refletem de modo muito distorcido o que realmente ocorre na realidade.
O esgotamento do modelo de dominação burguesa – levado adiante nestes oito anos de FHC-FMI – levou à rachadura entre os de cima, expressa na divisão da base governista e de seus respectivos partidos e a uma guinada para a oposição não apenas da classe trabalhadora, mas também da pequena burguesia. Para Presidente do Brasil, 76% votaram contra o candidato do governo.
Nas urnas, esse descontentamento se expressou numa votação massiva na oposição, da qual o PT foi o partido mais beneficiado, elegendo a maior bancada de deputados na Câmara, indo para 14 senadores, elegendo dois governadores em primeiro turno e levando candidatos ao segundo turno em mais 8 estados.
Esse resultado de modo global expressa que há por baixo uma verdadeira panela de pressão abrindo fervura.
O PT ainda canalizou para o terreno eleitoral – e portanto do regime democrático burguês, da ordem – este descontentamento e desejo de mudança. Mas, a real correlação de forças entre as classes no Brasil ainda não se expressou de modo genuíno e em todo seu vigor. O que só ocorrerá com a entrada em cena do proletariado, com seus métodos de luta. O resultado eleitoral prenuncia que este momento não tarda a chegar.
O Brasil está se aproximando, do ponto de vista da luta de classes, da situação que sacode os demais países latino-americanos

DEMOCRACIA BURGUESA JÁ NÃO EMPOLGA COMO ANTES

Se nos votos houve uma enxurrada oposicionista e uma vitória eleitoral inequívoca do PT, na outra ponta – nas ruas – essa eleição foi uma das mais mornas dos últimos 20 anos.
No quesito empolgação a eleição de 2002 não tem nada que ver com a de 1989. O “Lulinha paz e amor”, os programas “emocionais” de Duda Mendonça, as alianças e o acordo com o FMI não apaixonam.
No sudeste e sul – ao menos – a inércia das ruas foi igual ou ainda maior do que a das eleições municipais de 2000, o que demonstra um desgaste da democracia burguesa. Traço esse, aliás, que é cada dia mais presente e mais profundo em toda a América Latina. Afinal, as pessoas votam e votam e a vida não melhora.
Nem mesmo a possibilidade alardeada pela mídia e pelas pesquisas de opinião de vitória de Lula em primeiro turno, foi capaz de levar as massas às ruas e nem mesmo de entusiasmar e mobilizar como antes uma ampla vanguarda para a boca de urna e para o corpo-a-corpo.
Em outros tempos, uma enorme vanguarda e uma parcela grande das massas, apaixonadas, polarizavam as ruas, vestiam-se de PT, faziam muito barulho. Hoje, as pessoas que querem derrotar o governo têm expectativas no PT, mas estas diminuíram muito em relação ao que já foram. Nas cidades onde governa o PT – como na maioria da grande São Paulo – as pessoas fizeram uma certa experiência e não viram nenhuma mudança substancial na sua vida. Entre Marta Suplicy, Palocci e Alckmin (PSDB), por exemplo, é difícil enxergar qualquer diferença

PLEBISCITO FOI A NOVIDADE

Contrastando com a despolitização das eleições, imposta pelas grandes candidaturas, seus programas parecidos, suas alianças e seus marqueteiros, o Plebiscito sobre a Alca surpreendeu.
Passando objetivamente por fora de todo o processo eleitoral, enfrentando o boicote de todo o establishment – desde a mídia, a máquina do Estado e, inclusive, os maiores partidos de oposição adaptados à ordem – como o PT (cuja direção e Lula desautorizaram o Plebiscito), o Plebiscito empolgou e se transformou na maior mobilização popular dos últimos anos.
Não houve cabos eleitorais pagos, houve mobilização voluntária e consciente de uma ampla vanguarda e uma adesão surpreendente.
Durante todos esses anos o PT foi um obstáculo, um freio consciente às lutas e à ação direta dos trabalhadores e da juventude. Um fator tremendo de contenção do descontentamento crescente que existe por baixo e buscou de forma permanente canalizá-lo para os trilhos da ordem eleitoral burguesa, convertendo-se num sustentáculo da ordem.
O curso à esquerda que faz o movimento de massas, que no terreno eleitoral distorcidamente deságua na estação da Frente Popular (a da colaboração de classes, mais à esquerda dentro da ordem) e fortalece conjunturalmente o reformismo, é a mesma que vai fazendo experiência com a democracia burguesa e tende a afastar-se dos trilhos do regime, para seguir o leito natural das lutas.
O Plebiscito sobre a Alca expressou no presente essa tendência latente que, de uma forma ou de outra, explodirá num futuro próximo. A Frente Popular – no governo – vai agir ainda mais abertamente e preventivamente para a desmobilização do movimento operário e popular. O curso objetivo, entretanto, vai no sentido das lutas e do enfrentamento com a ordem burguesa e com a própria Frente Popular no médio prazo. A falta de empolgação com as eleições é apenas um sintoma, também distorcido e amenizado, do desgaste da democracia burguesa e das eleições.
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