A recente declaração do Papa Francisco sobre o Big Bang foi bastante discutida pela imprensa e na Internet. Não faltou quem elogiasse a postura “progressista” do Papa em abrir um “diálogo” entre a ciência e a religião, que estas não seriam contrapostas, mas que se “completariam mutuamente”. E isso justamente num momento em que o fanatismo religioso cresce nas mais diversas formas em todo o mundo.

Estariam de fato a Igreja Católica e o Vaticano, na figura de seu maior hierarca, alterando suas posições em relação à ciência e abandonando seu passado de medievalismo e irracionalismo?

Comecemos com a declaração do Papa sobre o Big Bang “O início do mundo não é obra do caos, que deve a sua origem a outrem, mas deriva diretamente de um Princípio supremo que cria por amor. O Big Bang, que hoje se põe na origem do mundo, não contradiz a intervenção criadora divina, mas exige-a”. 

Ou seja:

1-      Que o Big Bang teria sido o início do mundo;

2-     Que o Big Bang não teria sido fruto do caos[1] e sim do amor divino;

3-     Que o Big Bang exige a intervenção criadora divina.

Nenhuma destas afirmações está de acordo ao que diz a física moderna. Pelo contrário, estão em contradição gritante com esta. Neste artigo pretendemos mostrar que o Big Bang não é o início do mundo, não é fruto do caos (nem muito menos do amor divino) e tampouco exige a intervenção divina!

Afinal, o que é a teoria do Big Bang?
Já discutimos este tema em artigo anterior, mas o Papa Francisco nos obriga a voltar ao tema. A Teoria do Big Bang é uma teoria sobre a evolução do universo, ou pelo menos daquela parte deste que podemos observar. Diz que o universo se expandiu (e segue se expandindo e se resfriando), a partir de um determinado momento no passado, em que este seria muito mais quente e denso do que hoje. E que tudo o que conhecemos: planetas, estrelas, galáxias e aglomerados de galáxias (ou aquilo que os compõem), estavam muito mais próximos entre si. Não foi uma teoria pensada a priori. Ao contrário, foi desenvolvida aos poucos, em direção oposta ao que se acreditava então.

Pouco após Einstein publicar sua Teoria da Relatividade Geral[2], percebeu que esta não permitia um universo estático, como era a crença de então. Sua teoria exigia um universo em movimento – ou em expansão, ou em contração. Este resultado foi uma surpresa para a época, pois a maioria das pessoas então considerava o universo estático[3]. O próprio Einstein, inconformado com o resultado, modificou suas equações para torná-las compatíveis com um universo estático.

Friedman, grande físico russo, aplicando as equações originais da Teoria da Relatividade Geral ao universo como um todo, construiu o 1º modelo cosmológico moderno, de um universo em expansão, se tornando assim, merecidamente, o pai da cosmologia moderna. Se no universo tudo estava em expansão, a conclusão óbvia seria que, no passado distante, as galáxias e aglomerados estariam mais próximos uns dos outros, até que num determinado momento ocorrido há muito tempo, estariam todos reunidos num mesmo ponto, infinitamente quente e denso (hoje calculado como ocorrido há cerca de 13,8 bilhões de anos).

Foi George Lemaitre, físico e astrônomo belga, quem deu este passo e criou a idéia de um Big Bang quente, que chamou então de ovo cósmico, ou ovo primordial[4]. Mais tarde, veio a descoberta experimental por Edwin Hubble do desvio para o vermelho na luz das galáxias distantes, resultado do efeito Doppler[5], devido a expansão do universo. Hubble descobriu que quanto mais distante a galáxia, mais sua luz se desviava para o vermelho, ou seja, mais rapidamente se afastava de nós, confirmando as análises de Friedman e Lamaitre. A partir deste momento, a Teoria do Big Bang passou a ser levada a sério (Einstein assumiu então que sua alteração da Relatividade Geral para possibilitar um universo estático havia sido o maior erro de sua vida).

O Papa Pio XII logo viu na hipótese do Big Bang a possibilidade de uma justificativa “científica” para o mito da Criação, no que foi criticado pelo próprio Lemaitre, apesar deste, além de físico, ser também padre católico. Lemaitre teria dito a Pio XII para “não misturar as coisas”.

George Gamow, outro físico russo, previu que se o universo teve uma origem tão quente e explosiva, algo deste imenso calor deveria ser detectável ainda hoje. Ele previu então que deveria haver um resíduo deste calor da explosão inicial, que teria se resfriado depois de tanto tempo, e estaria hoje na faixa da radiação de micro-ondas. Alguns anos depois esta radiação foi detectada, e é chamada hoje de radiação cósmica de fundo de micro-ondas. Gamow ainda propôs que a diversidade de átomos que vemos no universo hoje teria se formado na fornalha do Big Bang, suficientemente quente para fundir os átomos de hidrogênio em átomos mais pesados. De fato, calculou a proporção que deveria haver entre os diferentes átomos e seus isótopos se estes tivessem sido forjados no Big Bang e chegou a uma proporção entre os diferentes isótopos do hidrogênio e do hélio (que compõe a maior parte da matéria comum no universo) que batia exatamente com aquela experimentalmente observada[6].

Ou seja, a Teoria do Big Bang deriva naturalmente da Relatividade Geral, explica o desvio para o vermelho das galáxias distantes, previu e explica a radiação de fundo de micro-ondas e a proporção observada no universo entre os diferentes isótopos do hidrogênio e do hélio. Daí que hoje, depois de muita polêmica e teorias alternativas, a Teoria do Big Bang seja tão bem aceita na comunidade científica e inclusive pelo público em geral.

Até aqui parecemos estar dando a razão àqueles que identificam a Teoria do Big Bang com o mito da Criação, afinal, estamos dizendo que o universo supostamente teria começado a partir de um ponto (os físicos o chamam de singularidade), ou seja, do nada[7]. E segundo a Relatividade Geral, este teria sido o início não só da matéria como a conhecemos, como do próprio espaço e do tempo.

A filosofia positivista, muito influente então entre os físicos, afirmava que, como o Big Bang destruiria qualquer informação sobre o que havia antes dele, isso deveria ser interpretado como se não existisse nada antes do Big Bang e que ele seria o início do tempo, pois o que não podemos medir, não existe para esta filosofia[8]. Se o universo surgiu do nada, a conclusão óbvia é que somente algo externo ao universo, “transcendente”, poderia estar na sua origem – Deus. O Papa João Paulo II chegou a dizer que estava muito bem a Teoria do Big Bang, mas que os físicos não deveriam se preocupar em estudar o que havia antes deste, que este era o território não da ciência, mas da religião. Afinal, não poderia haver um “antes” do “sopro inicial”.

Um “esquecimento” fundamental: A Mecânica Quântica
Mas desde da formulação da Teoria do Big Bang, estava claro que havia aí um grande problema metodológico. Se chegou a ideia de “início” do universo e do tempo a partir de uma extrapolação da teoria de Einstein da Relatividade Geral para um momento em que imensas quantidades de matéria e energia estariam concentradas num volume menor que o de um átomo. E a teoria que trata de escalas subatômicas não é a Teoria da Relatividade, e sim a Teoria Quântica[9]. Ou seja, a conclusão de que o universo começou de um ponto (do nada) deriva da extrapolação de uma teoria para um território que não é o seu[10]. A verdade é que, sendo uma teoria que ignora a Mecânica Quântica, a Teoria do Big Bang não é uma teoria sobre o Big Bang em si, e sim uma teoria sobre a evolução do universo DEPOIS do Big Bang, já que o Big Bang em si, sendo um evento quântico, não pode ser investigado pela Teoria da Relatividade.

Para investigar o Big Bang em si, é necessária uma teoria que combine a Teoria da Relatividade Geral de Einstein com as leis da Mecânica Quântica. E elaborar essa teoria não é uma tarefa fácil. Há várias teorias que tentam fazer isso. Nenhuma está completa nem suficientemente corroborada experimentalmente. Mas há um fato inegável – todas as tentativas feitas até aqui, sem nenhuma exceção, apontam que o Big Bang não foi o início do universo, mas simplesmente um momento especial de sua história, da transição de uma forma de existência para outra. Diríamos nós, um salto de qualidade no seu permanente desenvolvimento dialético. Há muitos físicos hoje, que mesmo não sendo partidários do materialismo dialético, tem proposto modificar a expressão Big Bang por Big Bounce (o Grande Salto), outros para a Grande Transição (em analogia às transições de fase da matéria).

Inflação Cósmica, Supercordas, Gravidade Quântica de Laços, Supergravidade
Assim, por exemplo, a mais sólida entre as teorias que investigam o Big Bang em si, a Inflação Cósmica[11], propõe que o Big Bang seja o resultado de uma flutuação quântica num hipotético campo de energia, existente no período anterior ao Big Bang, quando o universo e a matéria existiam numa outra forma, chamada de falso vácuo. Na transição ao universo atual, a energia deste falso vácuo se converteu em uma curta e explosiva dinâmica expansiva do universo (o “bang” do Big Bang), e essa energia, ao cessar a inflação, se converteu na matéria e energia nas formas que nos são conhecidas hoje, que seguem se expandindo, mas de forma incomparavelmente mais lenta. A Teoria da Inflação propõe não somente isso, mas que estas flutuações seguem ocorrendo em regiões distantes, formando várias bolhas de universos coexistindo entre si (este cenário tem sido chamado de Multiverso, onde “nosso” universo seria apenas um, dentre incontáveis “outros” universos[12]).

Um outro modelo, derivado da Teoria das Supercordas (uma das teorias propostas para combinar a Relatividade Geral com a Mecânica Quântica), propõe que o universo atual se originou a partir de um alinhamento de fase das supercordas (hipotéticos elementos básicos microscópicos, constitutivos de tudo o que existe no universo) já existentes antes, que ao entrarem em fase entre si deram origem ao continuum do espaço-tempo como o conhecemos.

Outra hipótese, ainda mais exótica, também derivada da Teoria das Supercordas e chamada de Cosmologia de Cordas, propõe que nosso universo, com 3 dimensões espaciais mais o tempo, é apenas um, convivendo num espaço multidimensional, onde “vários” universos, de diferentes dimensionalidades e leis físicas, vagam para lá e para cá (outra variação da ideia de Multiverso). Estes assim chamados “mundos-brana[13]” de tempos em tempos se chocariam entre si devido a atração gravitacional entre eles, e estes choques liberariam imensa quantidade de energia que faria que internamente cada um destes “mundos-brana” se tornasse extremamente quente, o que daria início a um novo ciclo de existência dentro do mesmo, que nós hoje detectaríamos como a radiação de fundo de micro-ondas de um Big Bang quente. Ou seja, não só não seria um início, como a matéria e energia sequer estariam reunidas, neste momento, num único ponto[14].

Outro cenário cosmológico é o derivado da Teoria da Gravidade Quântica de Laços, principal concorrente da Teoria de Supercordas. Esta também evita a singularidade no Big Bang e afirma que o atual universo surgiu de um salto (o tal do Big Bounce) de um universo anterior, que ao colapsar-se devido a sua gravidade, não atingiu nenhuma singularidade, ao contrário, ao alcançar uma densidade suficientemente alta, teve sua gravidade alterada de atrativa para repulsiva, dando origem ao fenômeno da inflação.

Steven Hawking, estudando o Big Bang dentro da Teoria da Supergravidade (outra tentativa de unificar a Relatividade Geral e a Mecânica Quântica) chegou também à conclusão de que a inclusão da Mecânica Quântica na análise impedia falar de um instante zero do tempo[15].

O Big Bang e o Mito da Criação:  Uma confusão proposital
Ou seja, apesar de não haver consenso na comunidade física sobre as teorias de gravidade quântica e modelos cosmológicos derivados destas (a exceção da Teoria da Inflação Cósmica, bastante bem aceita), uma coisa é certa – a interpretação do Big Bang como início do universo se baseia numa extrapolação abusiva da Relatividade Geral ao reino da Mecânica Quântica (e as influências da filosofia positivista e da Igreja), e quando se tentam levar em conta os efeitos quânticos na teoria, TODAS as soluções apontam para um “antes” do Big Bang, sem absolutamente nenhuma exceção. E isso não é uma surpresa, pois um dos pilares da Mecânica Quântica é que a informação não se perde no universo, uma expressão particular mais do princípio da indestrutibilidade da matéria em movimento, base da concepção materialista dialética da natureza[16].

Ou seja, o Big Bang não foi o início, mas um momento importante da história daquela parte do universo por nós conhecida. Não foi fruto do “caos”, acaso ou “amor divino”, mas de processos físicos acessíveis a ciência. E mais importante que tudo, não tendo havido início, não houve Criação, e a figura de um Criador se torna, além de irracional, totalmente supérflua para a compreensão do universo[17].

Religião X Materialismo Dialético: O Marxismo contra a Igreja
Como vimos, não há nada em comum entre a cosmologia moderna e a doutrina da Criação da Igreja, de que a Terra e o universo teriam sido criados em 6 dias por um bondoso Criador. A declaração do Papa Francisco confundindo o Big Bang com o mito da Criação não passa de uma tentativa desesperada de esconder a verdadeira questão, de que todo o desenvolvimento da ciência confirma a cada dia não as ideias irracionalistas da Igreja, mas as determinações do materialismo dialético. Que o eterno movimento da matéria é a base da existência e que a Idéia, incluída a idéia de Deus, surgiu desta a partir da evolução da matéria desde formas anteriores de existência até os prótons e elétrons, destes aos átomos mais simples, destes aos mais complexos e às moléculas, da matéria atômica e molecular inorgânicas à matéria orgânica, da matéria inanimada à animada, da vida inconsciente à consciente, da vida biológica à vida social, até a construção da sociedade humana, ponto mais alto deste progresso, que para seguir adiante terá que obrigatoriamente livrar-se de todos os mitos usados para manter-nos na ignorância e passividade.

A religião surge na pré-história da sociedade humana como uma tentativa rudimentar de explicação de fenômenos que estavam fora do alcance da compreensão humana. Por isso, as primeiras religiões são politeístas, com um deus que explica os trovões, outro que explica as chuvas, outro que explica as secas, pragas, etc. O desenvolvimento da ciência foi diminuindo o espaço para estes deuses nascidos da ignorância em relação aos fenômenos naturais. Hoje nem o mais fanático dos religiosos tenta explicar os trovões através de Deus, o que poderia nos fazer pensar que a religião vai perdendo sua importância na proporção inversa em que a ciência evolui. Mas isso não é assim tão simples. Apesar de que a ciência moderna nos explica uma imensidão de fenômenos, existe um tipo de fenômeno que a ciência “oficial” não pode explicar por razões políticas, os fenômenos sociais.

O território privilegiado da Igreja hoje está na “explicação”, ou por vontade divina ou pela natureza pecadora do homem, dos males sociais existentes no mundo. Não há ciência, fora do marxismo, que explique porque no século XXI, quando a chegada do homem à Lua já é estudada nas aulas de história, siga existindo fome, miséria, guerras e mortes por doenças cuja cura a ciência já há muito desenvolveu. As religiões modernas não são fruto da ignorância em relação aos fenômenos naturais, e sim em relação aos fenômenos sociais. Tiram sua força da miséria da sociedade humana.

A única explicação para a miséria humana fora do marxismo é a religiosa, de que pagamos por nossos pecados, que o homem tem uma natureza pecadora desde Adão e Eva, e que a religião vem ao mundo para pregar a bondade, solidariedade e bom comportamento entre os homens, que se forem “bons”, ou seja, aceitarem passivamente a fome, miséria, opressão, exploração e injustiças, serão recompensados pelo Criador do universo, mas somente após a morte. Por isso a religião é inimiga irreconciliável do marxismo, única concepção científica da sociedade humana, que afirma que os males de nosso mundo não são reflexos nem da natureza humana pecadora, nem da vontade divina, nem do baixo desenvolvimento das ciências. As ciências e a técnica já estão adiantadas a tal ponto que seria possível acabar com a fome, desemprego, miséria e a imensa maioria das doenças que ainda afligem a humanidade e reduzir enormemente a jornada de trabalho, libertando a humanidade de conjunto, e não somente uma ínfima minoria desta, para o trabalho criativo nas ciências e nas artes, que conheceriam então um novo renascimento, incomparavelmente mais grandioso que em qualquer momento anterior na História. Já há condições objetivas de sobra para construir o paraíso sobre a Terra.

O mal que aflige a Terra é de outra natureza, nada divina. É a existência de uma sociedade dividida em classes sociais, baseada na busca do lucro, onde uma minoria, para manter seus privilégios, obstaculiza o desenvolvimento da humanidade em todos seus aspectos, a custa da miséria e atraso medieval de grandes massas. Por isso a esperança de muitos ateus de que o desenvolvimento da ciência venha a restringir cada vez mais o peso da religião e do ocultismo na sociedade humana e permitir a melhora permanente das condições de vida da humanidade, é infelizmente uma esperança vã. À medida que o capitalismo se afunda em sua crise insolúvel, as concepções religiosas, ocultistas e medievalistas retornam com força redobrada, assim como pioram as condições de vida da maioria da humanidade, dois fenômenos atualmente facilmente observados, em toda sua irracionalidade.

O pré-requisito para o avanço da humanidade é a destruição da atual ordem social capitalista e parasitária, que ameaça não só destruir as conquistas da ciência e cultura humanas, como afundar a humanidade de volta nas trevas da barbárie, ou inclusive com a sua própria aniquilação. Somente a reorganização em bases racionais, ou seja, socialistas, da economia mundial, pode dar sequência à incrível história do desenvolvimento humano da irracionalidade à ciência, da selvageria à sociedade moderna, das cavernas aos milagres da ciência e da técnica, colocando todas estas conquistas, finalmente e pela 1ª vez na História, a serviço da humanidade de conjunto e não só de uma ínfima minoria. Não há como prever os limites para o desenvolvimento futuro da humanidade finalmente liberada das amarras do capitalismo. Na opinião deste autor, estes limites simplesmente não existem.

D., do POI da Rússia

*Revolucionário e físico

 


[1] O Papa usa o termo caos no sentido de falta de ordem, de acaso, e também num sentido místico, obra “de outrem”. O sentido moderno de caos na ciência é o da existência de uma ordem de tipo mais complexo, nem sempre perceptível de início, e que não pode ser tratada da maneira determinística tradicional.

[2] Teoria da Gravidade de Einstein publicada em 1915. Afirma que a gravidade é efeito da curvatura do espaço-tempo, devida a distribuição de massa/energia no universo. Confirma a afirmação do materialismo dialético de que o espaço e o tempo são formas de existência da matéria, e que por isso não tem existência própria independente desta.

[3] O materialismo dialético já em sua origem criticava a concepção estática do universo, reivindicando a hipótese de Kant da nuvem primordial que teria dado origem ao universo como o conhecemos.

[4] O nome Big Bang (Grande Explosão) foi dado por Fred Hoyle, grande opositor da teoria, para ridicularizá-la. Hoyle defendia uma teoria rival, a do Estado Estacionário.

[5] Efeito mais conhecido por sua expressão sonora, quando escutamos o som de um carro que se aproxima como cada vez mais agudo, e cada vez mais grave quando se afasta. Da mesma maneira, a luz das estrelas se desvia para o vermelho quando se afasta (mais “grave”) e para o azul quando se aproxima (mais “agudo”).

[6] Na verdade a história é um pouco mais complicada, esta idéia funcionava bem para o hidrogênio e o hélio, mas a síntese dos átomos mais pesados da tabela periódica não seria possível no Big Bang. A teoria da síntese estelar dos elementos químicos pesados veio resolver o problema, explicando como no interior das estrelas, o hidrogênio e o hélio se fundem em elementos cada vez mais pesados.

[7] O próprio Einstein (que ao contrário das lendas, nada tinha de religioso) não aceitou esta hipótese, e numa tentativa de contorná-la, propôs a existência de pequenas velocidades tangenciais no movimento das galáxias que levariam a que elas não se encontrassem no passado, somente passassem próximas umas às outras, evitando a singularidade. Esta sua hipótese se mostrou equivocada mais tarde. Mas esta “teimosia” de Einstein refletia bem a opinião majoritária (e correta) entre os físicos de então, de que não poderia o universo haver surgido de uma singularidade, ou seja, do nada.

[8] Ao contrário, o materialismo dialético afirmava que toda a experiência humana demonstra que a matéria é indestrutível em seu eterno movimento, que não pode ser nem criada, nem destruída. Que existe objetivamente, independentemente da existência do observador. Que o Big Bang seria, portanto, uma transição de uma determinada forma de existência da matéria para uma outra forma – um salto de qualidade em seu eterno movimento. E se então não nos era possível investigar o “antes” do Big Bang, isso se devia as limitações de nosso conhecimento científico de então. Até hoje, os positivistas acusam o materialismo dialético de ser uma metafísica, exatamente por estas afirmações.

[9] Compõe, junto com a Teoria da Relatividade, a base da física moderna. Estuda o reino do muito pequeno, das escalas subatômicas. É em sua estrutura conceitual muito diferente da física clássica e da relatividade.

[10] De fato, se tomarmos em conta somente a Teoria da Relatividade, as singularidades são inevitáveis (como aliás, na física newtoniana também), como demonstrado na decada de 70’ por Roger Penrose e Steven Hawking. Daí todas as afirmações de Hawking naquela época de que a física ainda deixava um espacinho para Deus no universo, o momento mesmo do Big Bang.

[11] A análise não-quântica na Teoria do Big Bang levava a uma série de contradições não somente no plano filosófico, mas principalmente no físico. Os 3 mais importantes são o problema da informação, o da planitude e o dos monopólos magnéticos. O problema da informação é que a Teoria do Big Bang não explica porque a radiação de fundo é praticamente igual em todas as direções, já que não houve tempo suficiente desde o Big Bang para que estas regiões estivessem em contato entre si e pudessem trocar informação, entrando em equilíbrio térmico, para emitirem todas radiação na mesma temperatura. O problema da planitude é que a Teoria do Big Bang não explica porque o universo observado é tão perfeitamente plano, quando deveria ser curvo. A Teoria do Big Bang ainda prevê a formação de monopólos magnéticos (hipotéticos ímãs de um pólo só), nunca observados experimentalmente. A Teoria da Inflação resolveu todos estes problemas. Ao supor uma “inflação” ultra rápida do universo antes da expansão atual, deu tempo suficiente para que as diferentes regiões do universo pudessem entre si trocar informação e entrar em equilíbrio térmico; a extrema inflação inicial permitiu que um universo curvo e irregular se “esticasse”, como um balão sendo enchido, e que se esticou tanto que hoje seria plano em nossa escala. E ainda que a inflação tivesse diluído tanto a matéria no universo, que os monopólos magnéticos tivessem se tornado objetos extremamente raros, e que portanto não nos surpreende que nunca tenham sido detectados. Apesar de um incômodo aspecto ad hoc nesta solução, é evidente seu sucesso prático. Por mais exótica que pareça, a Teoria da Inflação cósmica tem feito uma série de previsões que vem sendo testadas nos últimos 30 anos com cada vez mais sucesso. Se ainda não é uma teoria definitivamente bem estabelecida, é inegável que contenha algo de verdade em sua formulação.

[12] Já expressamos em artigo anterior nosso desacordo com esta nomenclatura. Universo é, por definição, tudo aquilo que existe, materialmente. Por isso, falar em “outros” universos não tem sentido, além de atentar contra a unidade do movimento da matéria. Preferimos chamar de diferentes partes, bolhas ou setores de um universo infinito, ainda mais rico em variedade do que se poderia pensar anteriormente.

[13] Brana deriva da palavra membrana. Assim há na teoria diferentes objetos: 1-branas (linhas), 2-branas (membranas), 3-branas (volumes) e assim por diante.

[14] Aliás, sobre isso há muita confusão. Em geral se considera que no Big Bang todo o existente estaria concentrado num ponto, e isso não é sempre verdade. Há 3 soluções de Friedman da Relatividade Geral para a evolução do universo: um universo aberto (que se expande para sempre), fechado (cuja expansão se desacelera até voltar a contrair-se) ou plano (que também se expande para sempre, mas em ritmo menor). Somente o fechado poderia ser reduzido a um ponto inicial. E os dados empíricos sobre a densidade de matéria/energia no universo observado corroboram ou o universo plano, ou o aberto, que não poderiam ser reduzidos a um ponto, e que portanto o Big Bang se teria dado numa extensão infinita, num universo que já era infinito antes do Big Bang e que se expandiu ainda mais depois deste. Se lhe parece difícil imaginar um universo infinito se expandindo ainda mais, fique tranquilo, para os físicos profissionais também é. O truque é não imaginar um volume infinito crescendo, mas um universo infinito, onde tudo o que existe se afasta entre si.

[15] O que o levou a negar então a afirmação anterior, dizendo que não havia mais o tal espacinho para Deus na física.

[16] O princípio de que a matéria em movimento não pode ser nem criada nem destruída é um princípio filosófico, que se traduz em princípios concretos nas diferentes ciências, em especial na física. Nesta, há uma série de princípios de conservação, que são a base mesma de todo o seu edifício teórico, como a conservação da massa, da energia, da quantidade de movimento, do momento angular, da informação, da carga elétrica e outras cargas, do número bariônico, entre outras. Todas estas são expressões particulares, por isso não necessariamente absolutas. Por exemplo, Einstein descobriu com a Teoria da Relatividade Restrita, que a massa e a energia não se conservam sempre, podendo uma se transformar na outra através de sua famosa fórmula E=mc2. Mas com isso não negou o princípio geral, só o aprofundou, chegando ao princípio mais geral de conservação do conteúdo total de massa/energia. Este princípio foi descoberto primeiramente em sua forma particular da conservação da massa nas reações químicas, popularizado pelo químico francês Lavoisier em sua conhecida frase “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.

[17] Não são somente as teorias que contradizem o mito da Criação, mas também as novas evidências experimentais. Hoje já estamos em condições de analisar as flutuações e polarização da radiação de fundo de micro-ondas do Big Bang com grande precisão, o que tem confirmado as previsões da Teoria da Inflação. Ou aquela que é a maior descoberta experimental das últimas décadas, que o universo não somente se expande, como esta expansão hoje se está acelerando. Esta descoberta contradiz a idéia de um “sopro inicial divino”, origem de todo o movimento posterior, e reafirma um universo não somente em eterno movimento, mas um universo dinâmico, que não se limita a uma expansão passiva depois de um “início” misterioso, mas que evolui, em sua eterna marcha desde formas mais simples até as mais sofisticadas de existência da matéria. Ao mesmo tempo, a análise do universo em grande escala tem mostrado que este não poderia ter surgido de um cenário unicamente relativístico, que preveria um universo uniforme em grande escala, o que não corresponde as observações. Recém começamos a analisar detalhadamente a radiação de fundo, a expansão acelerada do universo e a estrutura do universo observável em grande escala, graças aos avanços técnicos das três últimas décadas. Muito nos espera nos próximos anos, não por acaso o período atual tem sido considerado por muitos a Era de Ouro da cosmologia moderna.