Presidente da Câmara pretende votar reforma política ainda este ano
ABr

O presidente da Câmara dos Deputados, deputado Marco Maia (PT-RS), declarou que pretende realizar a votação da reforma política ainda em dezembro. Para isso, o projeto foi fatiado em quatro principais pontos: coincidência das datas de eleições, fim das coligações, sistema de votação e financiamento público de campanha.

Calendário eleitoral
No Brasil, a população é chamada a debater política uma vez a cada dois anos. Com a coincidência das datas, as eleições seriam de quatro em quatro anos. Desta forma, o ritmo de debate sobre política de modo geral seria reduzido. Com isso, a pressão popular fica mais diluída. Por outro lado, o poder das oligarquias locais também passa a influenciar mais ainda o cenário nacional. Esta proposta é uma forma de retirar da população mecanismos de pressão. Ampliar a democracia seria dar ao povo o poder de, a qualquer tempo, revogar os mandatos e convocar novas eleições.

Atualmente, já existem várias restrições à chamada “campanha antecipada”, o que, na verdade, é uma forma de restringir o debate democrático na sociedade sobre a questão do Poder. Aos partidos, não é permitido debater diretamente com a população sobre o Poder. A legislação restringe a “democracia” ao período de três meses que antecede as eleições. Com a mudança proposta só haverá uma democracia formal de três meses a cada quatro anos. Nos demais 45 meses, haverá uma censura sobre o debate de Poder, sob o risco de ser considerado “campanha antecipada”.

Coligações
A proposta do fim das coligações vem com uma roupagem de moralização da política, mas isso é uma falácia. O argumento seria de que partidos de aluguel estariam coligados aos grandes partidos e que, acabando com as coligações, se acabaria com os partidos de aluguel.

Seriamente, pode-se dizer que o PMDB tem solidez ideológica? Este partido está no governo desde 1985, apoiando quem quer que seja o governo de turno. O PSD, recém fundado, recebeu todas as facilidades possíveis e imagináveis para tanto. Não tem crise de ter apoiado Serra em SP e compor o governo federal, pois o governismo está em seu DNA. Estes são partidos grandes, mas são na verdade partidos de aluguel. O aluguel dos partidos é feito por esquemas como foi o mensalão. Mas também se dá pelo financiamento das campanhas eleitorais.

A garantia de que diferentes partidos possam seguir existindo e nas eleições possam coligar-se é a garantia de pluralismo político. Ou seja, os partidos podem ter suas diferenças entre si, e quanto mais plural for tal representação melhor, pois atende as mais diversas ramificações da sociedade. Nas eleições, estes projetos podem confluir-se numa plataforma única, que pode se formar uma coligação, preservando a pluralidade dos partidos.

O fim das coligações poderá gerar, na verdade, uma concentração artificial de blocos, mas cada vez mais sem conteúdo programático distinto. É como nos EUA onde os Democratas ganham e agem como os Republicanos. Estes grandes Blocos se tornam uma disputa entre facções de um mesmo projeto. A história brasileira já rechaçou isto quando acabou com a polarização entre MDB e ARENA.

Sistema de votação
O sistema de votação proposto é o chamado sistema belga. Este Sistema consiste basicamente em mudar o sistema atual, que vota-se apenas nas pessoas. Passando a se votar no partido, mas garantindo ainda que, caso o eleitor queira especificar qual o candidato que receberá o voto isto pode ocorrer. É também chamando sistema de lista flexível, em que os partidos apresentam uma lista de candidatos, e o eleitor poderá modificar a ordem da lista apresentada, votando diretamente em um dado candidato.

Nosso sistema de distribuição de vagas no parlamento, que mantém o quociente eleitoral, continua o mesmo que foi feito pela ditadura, com seu Código Eleitoral de 1965. Em resumo, parte do seguinte cálculo: o número de votos válidos é dividido pelo número de vagas em disputa. O partido que não atingir este total de votos não terá representação no parlamento. Mudar o sistema de votação exige que a distribuição de vagas ocorra através da proporcionalidade direta, sem que o quociente eleitoral seja usado como cláusula de barreira.

Financiamento de Campanha
Já está claro que as maiores financiadoras de campanhas são as construtoras. Elas mantêm contratos com as prefeituras e governos estaduais. Para mantê-los, investem diretamente nas campanhas de praticamente todos os candidatos. Como foi revelado pelo escândalo da empresa Delta, Cavendish chegou a declarar que financiando campanhas eleitorais ganham-se muitos negócios em troca.

Desde antes da redemocratização, todas as eleições têm sido permeadas por escândalos que envolvem os financiamentos de campanha. Lembremos: o patrocínio dos candidatos da Arena; o escândalo PC que derrubou Collor; a “Privataria Tucana” do governo FHC; e o “Mensalão” do governo Lula.

O Financiamento Público de campanha é a melhor forma de financiamento das campanhas. Mas tem que partir da proibição expressa e absoluta de que haja doações de empresas e empresários a estas campanhas. Além disso a forma de distribuição das verbas, não pode reproduzir as desigualdades existentes.

Defender o financiamento público é fundamental. Mas a ampla maioria dos deputados, que foram eleitos com esta forma de financiamento não vão aceitar abrir mão de seus privilégios. As empresas não querem perder um mecanismo que tem de fazer um lobby legalizado. É necessária pressão popular para garantir está mudança. Acreditar que isso ocorrerá agora em dezembro é, novamente tentar enganar o povo e os trabalhadores brasileiros.

Colocar em votação estas propostas neste momento é uma a forma de levar qualquer proposta progressiva a derrota e privilegiar as propostas mais retrógradas. O formato fatiado de votação piora o cenário, fazendo passar o que há de pior. Não podemos aceitar que a Reforma Política seja votada neste Congresso retrógrado sem que haja antes uma grande discussão na sociedade e nos movimentos sociais.

*Instituto Latino-Americano de Estudos Socioeconômicos