Redação

Francisco de Oliveira, sociólogo marxista e professor da  Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP nos deixou no último dia 10. Foi um original pesquisador da realidade brasileira. Foram muitas as suas contribuições sobre o entendimento do nosso país. Destacamos a sua “Crítica à razão dualista”, editada em 1972, onde identificou o subdesenvolvimento como produto do processo histórico da formação do capitalismo no Brasil. Além de denunciar a miséria em que vive a maioria dos trabalhadores, desafiou o arsenal teórico da intelectualidade da época que estava preso a uma concepção que explicava o país por meio da dualidade atraso versus moderno. O sociólogo, ao contrário, via que o arcaico era condição para o desenvolvimento do moderno ou, para utilizar de empréstimo uma expressão de André Gunder Frank que influenciou o pensamento de Oliveira, o desenvolvimento do capitalismo produz o subdesenvolvimento dos países periféricos do sistema.
Na mesma obra, também demonstrou que as classes dominantes do país fazem a opção por uma forma de inserção divisão do trabalho que coloca o Brasil em posição subalterna no quadro da economia mundial. Desse modo, a burguesia brasileira torna-se “sócia-menor do capitalismo-ocidental”, ou das nações imperialista, para assegurar  a sua dominação social.
Outra obra de destaque é o seu ensaio “O Ornitorrinco” (2004), em que usa o mamífero semiaquático que tem bico de ave como metáfora da formação social brasileira. O ensaio marca sua ruptura com o PT quando esse partido se rendeu ao neoliberalismo nos governos Lula e Dilma.  No livro, ele analisa a aliança entre sindicalistas do PT ocupantes de postos de gestão financeira de fundos de pensão e banqueiros. Oliveira é taxativo ao apontar, já nos primórdios do governo Lula,  que o governo do PT não só realiza o programa do governo anterior de FHC, como o radicalizou.
Chico se manteve honesto quando tantos se adaptaram as práticas corruptas do Estado burguês, nas quais o PT se lambuzou. Foi um pensador original, com o qual tivemos diferenças, mas no marco de um respeito imenso.
Em tempos em que a desigualdade, a pobreza e o desemprego avançam pari passu com o processo de recolonização do país promovida pelo governo Bolsonaro; onde o capitalismo moderno exige cada vez mais o atraso (mais precisamente a barbárie) para se reproduzir (o que pode ser visto na reprimarização da economia brasileira, no recrudescimento da violência social e nos desastres ambientais) torna-se imprescindível a contribuição oferecida por Oliveira.  Como o sociólogo já dizia, o Brasil está cada vez mais marcado por dois signos opostos: do apartheid ou da revolução social.