Redação
Em meio a tantos escândalos de corrupção, vale a pena recordar que estes mesmos grupos envolvidos no superfaturamento de obras e serviços vêm ganhando muito dinheiro desde a época da ditadura, particularmente no setor petrolífero e petroquímico
A criação da Petroquisa, empresa subsidiária da Petrobras, no final de 1967, fez parte do projeto do governo militar de desenvolver o setor petroquímico, encorajando os empresários brasileiros a entrarem no negócio tendo o governo como sócio e parceiro. Assim, foram atraídos empresários de vários setores: Grupo Suzano Papel e Celulose; Grupo Econômico; Grupo Mariani; os bancos Econômico e Itaú; as empreiteiras Camargo Correia, Engrel e Odebrecht; e o Grupo Ultra, que já trabalhava com produtos petroquímicos.
O Estado brasileiro assumiu a empreitada da construção do Polo Petroquímico de Camaçari alegando que não havia no país empresas privadas com experiência nesse ramo de negócio nem para conceber, nem para planejar e executar um empreendimento complexo e sofisticado como este. O Estado ainda detinha o monopólio do petróleo com a Petrobras, com um contingente de recursos humanos habituados a operar refinarias de grande porte e capacitado a promover treinamento em larga escala da mão de obra que seria requerida.
No entanto, a verdade, é que o governo militar pretendia beneficiar o capital privado. O Estado entraria com o trabalho pesado, e o capital privado receberia os lucros. Para isso, selecionou os sócios nacionais e estrangeiros que melhor compactuavam com a ditadura e providenciou recursos financeiros via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Como fachada, foi estabelecido um modelo empresarial denominado tripartite, em que o capital votante das empresas era dividido em três partes iguais: uma privada nacional, uma das multinacionais estrangeiras e uma estatal. As empresas privadas tinham maioria garantida. Enfim, o governo entrava com o dinheiro e o trabalho e, depois, entregava o lucro para o capital privado, que era maioria.
Anos depois, executou-se o programa de privatizações e a entrega total das empresas para o capital privado, e a Petroquisa retirou-se do comando. Porém, como veremos, os donos das empresas nacionais beneficiadas sempre foram gratos aos tecnocratas da ditadura que lhes deram estes benefícios.
O BNDES foi o principal agente financeiro da indústria petroquímica instalada em Camaçari. Quatro linhas de financiamento de longo prazo e de aporte de capital foram abertas com o objetivo de suprir as empresas petroquímicas com os recursos financeiros necessários. Incluíam o financiamento direto às empresas; aos acionistas nacionais para capitalização até o limite de 80% das necessidades; e aporte de capital de risco sem direito a voto e com direito de recompra nos holding dos grupos privados nacionais. Além disso, o governo fornecia aos investidores privados incentivos fiscais administrados pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e aplicados pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB).
Para garantir a repressão à população e aos trabalhadores, em 1972, Camaçari foi considerada área de segurança nacional em decorrência do Decreto Lei 1.225/1972. Com ele, os militares e empresários pretendiam desenvolver um empreendimento estratégico. Com isso, tornou-se alvo da atenção e controle dos órgãos de informação e repressão da ditadura até o final da década de 1980.
Neste mesmo ano é fundada a Companhia Petroquímica do Nordeste (Copene), que se instalou com o intuito de ser uma empresa piloto para detalhar os trabalhos técnicos e econômicos. A Copene foi se desenvolvendo e, em 1976, teve início a operação das primeiras unidades da central de utilidades, passando a abastecer vapor, energia elétrica e água para as primeiras fábricas que começaram a produzir no complexo. Nos anos de 1977 e 1978, cresceram, consideravelmente, as atividades de construção, montagem e operação. O número de trabalhadores no Polo chegou a 26 mil diretos e 75 mil terceirizados.
Em 29 de junho de 1978, o presidente da República, Ernesto Geisel, deu início, oficialmente, às atividades do Polo Petroquímico de Camaçari. A partir de então, o governo intensificou as perseguições contra os trabalhadores e o enfraquecimento dos sindicatos em benefício das empresas que atuariam na região.
Além disso, pela forma autoritária como foi implantado, a movimentação para o Polo aumentou em mais de 500% a população, em pouco menos de dez anos, sem qualquer planejamento, provocando crises de atendimentos e abastecimentos, injustiças sociais, criminalidade e violência O Polo de Camaçari foi o primeiro complexo petroquímico planejado do país. Atualmente, se destaca como o maior complexo industrial integrado do hemisfério sul, abrigando mais de 90 empresas químicas, petroquímicas e de outros ramos de atividade, como indústria automotiva, de celulose, metalurgia do cobre, têxtil, de bebidas, de produção de equipamentos para energia eólica e serviços.
Na área de infraestrutura, o polo registrou avanços expressivos, como a implantação do sistema de rodovias BA-093, permitindo o escoamento da produção e ampliando a competitividade das empresas instaladas no local.
Enfim, foi uma festa privada com dinheiro publico.
Geisel e o nacionalismo de fachada
Em 1980, o governo militar criou uma holding company [1] chamada Nordeste Química S.A. (Norquisa), para onde migrariam as ações ordinárias da Copene, que englobava 48 empresas do polo. A Norquisa passou a controlar a Copene com cerca de 52% do seu capital ordinário.
A criação da Norquisa, significou um golpe no regime estatal e coroou a nova estratégia do governo para a indústria petroquímica, diminuindo o controle do Estado sobre as empresas e consolidando, assim, a estrutura privada da Copene e aglutinando os recursos gerados por todas as empresas do Complexo. Isso permitiu a aplicação de planos de desenvolvimento para a indústria independentemente de planos do governo.
Por sua vez, mascarava o caráter supostamente nacionalista da indústria, com um Conselho de Administração e Diretoria que estava nas mãos da tecnoburocracia estatal e de grupos privados nacionais. O Ernesto Geisel, que foi presidente da Petrobras entre 1969 e 1973, deixou a presidência da empresa. Assumiu a chefia da Norquisa em 1980 e, consequentemente, o controle da Copene. Para isso, se beneficiou diretamente de acordos com empresários que, rapidamente, o conduziram à coordenação da holding, devolvendo as benesses recebidas e mantendo as ligações com o regime ditatorial.
De acordo com a reportagem de Aluízio Maranhão, publicada na revista Isto É em 26 de agosto de 1980: “Quinze meses depois, Geisel volta à ativa – ele assume a direção da Norquisa e o Conselho da Copene”, e afirma que sua nomeação foi uma proposta de vários empresários. Entre eles, estavam: Celso Rocha Miranda (Internacional de Seguros); Peri Igel e Paulo Cunha (Grupo Ultra); Norberto Odebrecht (Odebrecht); Ângelo Calmon de Sá (Banco Econômico); Clemente Mariani (Grupo Mariani) entre outros [2]. Todos eram conhecidos financiadores da ditadura.
Durante a crise do petróleo, o general Geisel obrigou a Petrobras a vender nafta para empresas petroquímicas a um preço mais baixo, causando prejuízos à empresa, aos cofres públicos e à economia brasileira. Fez isso revogando o Decreto Lei 61/66 em 30 de dezembro de 1977, que garantia a rentabilidade normal da Petrobras, e editando o Decreto Lei 1599/77, que deu ao governo poderes para ditar a política de preços dos derivados à vontade e de acordo com os interesses da indústria petroquímica.
Num mundo que economizava petróleo dramaticamente, a Petrobras foi obrigada a aumentar suas importações. A nafta foi vendida no mercado interno por 10% dos preços internacionais, e a Petrobras se endividou criando uma bola de neve.
Durante a CPI sobre o Polo Petroquímico de Camaçari, coberta extensivamente pelo jornal O Estado de São Paulo, o deputado João Cunha (MDB-SP) denunciou que o Geisel havia recebido 200 mil ações de uma das empresas petroquímicas beneficiadas pelo seu governo. João Cunha não foi cassado, porque quem o alimentou com essa munição política foi a turma de generais e coronéis ligada ao general Médici.
Repressão à greve de 1985
Os funcionários da Copene sofriam terríveis repressões como subsidiária da Petroquisa, controlada diretamente pelos generais. A partir de 1984, sentiram o endurecimento das pressões exercidas pelos empresários e pelo governo ditatorial, aplicadas diretamente pelas forças do “carlismo”. Antônio Carlos Magalhães aplicou, na Bahia, toda a truculência da ditadura.
Em agosto de 1985, os petroquímicos foram à greve: “O dia 27 entrou para a história da classe química e petroquímica baiana. Exatamente às dez horas da manhã, quando o flaire da Copene jogou para o ar a grande chama que esperávamos com muita expectativa, estava consumado o nosso poder de mobilização, a nossa capacidade de lutar pelas reivindicações que, durante um mês, tentamos negociar com os empresários.Os patrões quiseram nos testar e receberam a RESPOSTA que não esperavam. Paramos, e paramos organizados, mostrando que só queremos ser respeitados como classe trabalhadora que precisa de salários justos e melhores condições de trabalho”. [3]
Os patrões tentaram utilizar a polícia para impedir a entrada dos trabalhadores, suspenderam expedientes, proibiram os ônibus de buscarem os trabalhadores em casa e divulgaram que o Sindiquímica estava invadindo a Copene. Mas, apesar das tentativas, os trabalhadores foram ao Polo para se unir aos companheiros. Os trabalhadores pararam suas atividades aos poucos. O número de empresas paralisadas foi aumentando gradativamente, de maneira que, passado apenas um dia da deflagração da greve, mais de 80% das empresas do polo já estavam paradas.
Um documento confidencial do Serviço Nacional de Inteligência (SNI), que circulou entre o Departamento da Polícia Federal e o Centro de Informações da SSP/BA, divulgou que: “depois de cerca de 08 (oito) rodadas de negociações entre patrões e empregados e de uma greve de fome no dia 07 Ago 85, como advertência, cerca de 21.000 operários das 35 empresas químicas e petroquímicas que compõem o Complexo Petroquímico de CAMAÇARI/BA decidiram, em Assembleia Geral realizada no dia 26 de Ago, paralisar suas atividades a partir de zero hora do dia 27 de Ago (…) os operários (…) iniciaram, paulatinamente, a desativação das indústrias, sob a liderança do… SINDIQUÍMICA/BA… e do… PROQUÍMICOS”. [4]
“Por força dessa repressão os trabalhadores que tomaram a liderança formaram um ‘comando de greve’. (…) Nesse comando havia aqueles que participavam das reuniões decisórias, e outros que agiam nos bastidores. Da cúpula desse comando participaram os companheiros Edson Coelho, Ubaldo Teixeira, Harry, José Fernandes, Nivaldo Lima, Prado, Romário dentre outros. A última reunião do comando foi na ‘célula’ que se situava no apartamento do companheiro Edson Coelho, no edifício Crescenciano, na Ladeira do Funil. Foi nessa reunião que elaboraram a senha que decidiu o horário do início do movimento de parada operacional da COPENE dando início ao grande movimento grevista do primeiro Polo Petroquímico parado (em greve) do planeta”. [5]
A greve iniciou às 23h do dia 26 de agosto de 1985 na Central de Matérias Primas da Copene. Os operários do grupo de trabalho A chegaram para substituição dos operários do grupo de trabalho B que tinham trabalhado no turno da tarde e continuaram na fábrica. À meia noite, o pessoal do grupo A dividiu todo o lanche com o grupo B que permaneceu na empresa. Às 7h da manhã do dia 27, apareceram os operários do grupo C que deveriam substituir o grupo A, que permaneceu também na fábrica. Muitos operários do grupo de trabalho D, que estavam de folga, compareceram e permaneceram do lado de fora da fábrica.
Por segurança, conservaram funcionando a Central de Utilidades (UTIL) que fornecia vapor, água, ar de serviço e de instrumentos, energia, oxigênio, nitrogênio e hidrogênio para todo o Polo. A ação dos grevistas amedrontava e intimidava a ação da Polícia Militar da Bahia, que temia atitudes intempestivas dos grevistas.
Os empresários, junto com os agentes da ditadura, montaram um arsenal repressivo que incluía proibições das publicações de imprensa. O governo do Estado da Bahia se encarregou de esconder o movimento que parou todas as indústrias de Camaçari por 15 dias, proibindo a imprensa de publicar notícias sobre as atividades que estavam se desenrolando. A greve durou 23 dias.
No dia 11 de setembro, o julgamento da legalidade da greve e da cláusula que definia 80% de adicional de turno foi publicado, e os trabalhadores decidiram retornar ao trabalho no dia seguinte. Neste retorno, os trabalhadores se depararam com a Polícia Militar protegendo as fábricas e descobriram que muitos dirigentes sindicais foram afastados. Alguns trabalhadores foram transferidos, e outros demitidos.
Os ativistas foram mapeados, e 186 trabalhadores foram demitidos. Outros que estavam nas listas da polícia e da Divisão de Informações (Divin) da Petrobras e foram demitidos, gradativamente, até o mês de dezembro do mesmo ano. O ex-presidente Ernesto Geisel, o ex-governador Antônio Carlos Magalhães e os investidores privados, como o Grupo Ultra, Odebrecht e Mariani, estiveram diretamente ligados à repressão à greve da Copene, juntamente com os órgãos estatais da repressão.
Privatização
Em abril de 1990, o governo de Fernando Henrique Cardoso criou o Programa Nacional de Desestatização (PND), relacionando 68 empresas industriais com participação estatal e pertencentes a segmentos estratégicos como siderúrgico, químico e petroquímico, fertilizantes, elétrico, ferroviário, mineração e portuário. De 1991 a 1997, foi arrecadado pelo governo o equivalente a US$ 26,1 bilhões em privatizações, dos quais US$ 3,7 bilhões vieram de vendas de participações em empresas do setor químico e petroquímico.
Com a venda das participações acionárias incluídas no PND, a maior parte do capital social das empresas do setor químico e petroquímico foi transferida para o setor privado, que passou a deter 75,7% do capital social votante dessas empresas contra participação de 44,6% anterior ao início do programa. Em 1993, teve início o programa de captação de capital no mercado de balcão norte-americano com a negociação de American Depositary Receipts (ADRs) nível 1, representativos de ações preferenciais classe A de emissão da companhia.
Em abril de 1995, após diversas modificações na unidade e de acabar com restrições, a companhia aumentou sua capacidade de produção de eteno, alcançando o nível de 1.100 toneladas por ano. Em agosto de 1997, após a conclusão de seu programa de expansão, a capacidade produtiva de eteno saltou para 1.200 toneladas por ano. Em 1998, foi concluído o programa de expansão de capacidade produtiva de para-xileno, alcançando o nível de 230 mil toneladas por ano, tornando-se completamente operacional em 1999.
Em agosto de 1995, a Petroquisa reduziu sua participação no capital votante da Copene como parte do programa brasileiro de desestatização. As ações vendidas pela Petroquisa foram, em sua maioria, adquiridas pela Norquisa. O restante das ações foi adquirido por fundos de pensão, notadamente a Caixa de Previdência do Banco do Brasil (Previ) e a Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros).
Em 1998, a Copene decidiu executar e administrar diretamente a prestação dos serviços de manutenção do Polo Petroquímico de Camaçari, historicamente realizada pela Ceman, e assinou um contrato de venda dos ativos da Ceman em janeiro de 1999, concluindo formalmente a venda da subsidiária em abril do mesmo ano à Asea Brown Boveri (ABB). Ainda em 1998, teve início a negociação de ações da Companhia na Bolsa de Valores de Nova York na forma de ADRs nível 2, então sob a sigla PNE. Um ADR corresponde a 50 ações preferenciais classe A, sendo o banco depositário o Citibank N.A.
Em 10 de novembro de 1999, o Banco Econômico S.A., em liquidação extrajudicial, através da sua subsidiária Econômico S.A. Empreendimentos (ESAE), a Odebrecht Química S.A. (Odequi) e a Petroquímica da Bahia S.A. (PQBA) celebraram Protocolo de Entendimentos com o objetivo de regular a venda conjunta de seus ativos localizados ou relacionados ao Polo Petroquímico de Camaçari. Valendo-se do direito de preferência estabelecido nos acordos de acionistas, as ações alienadas foram adquiridas pelos sócios que detinham esses direitos. Esses sócios, na quase totalidade das empresas, foram os sócios originais do período de constituição das empresas.
As empresas tripartites foram adquirindo participação no capital votante em empresas estatais. Essa participação era compulsória e tinha financiamento aprovado previamente pelo BNDES dentro da linha conhecida como Financiamento a Acionistas (Finac). Quando as principais unidades industriais do Polo Petroquímico de Camaçari acharam-se implantadas, cada uma correspondendo a uma empresa distinta, a soma do capital votante nas estatais, como Copene, em poder das empresas privadas superava a marca de 50%, deixando, portanto, de ser considerada estatal. As privatizações criam o desenho dos grupos que iriam monopolizar o setor, na primeira década do século 21: Odebrecht, Ipiranga, Unipar e Suzano.
Em 2001, a Odebrecht, em parceria com o grupo Mariani, assume o controle da Copene. No ano seguinte, é criada a Braskem. Em março de 2007, Braskem, Petrobras e Grupo Ultra compram a Ipiranga. A Petrobras compra a Suzano Petroquímica em agosto do mesmo ano. Em junho do ano seguinte, a estatal junta os ativos da ex-Suzano com a Unipar, formando a Quattor, controlada pelo grupo privado (60%) Geyser. Em janeiro de 2010, é anunciada a incorporação da Quattor pela Braskem.
A privatização beneficiou uma série de empresas que apoiaram, sustentaram e mantiveram, a ditadura cívico-militar no Brasil. Entre elas, a Odebrecht, o Grupo Ultra e o Grupo Mariani.
Odebrecht-Braskem-Ultra-Petrobras: um grande negócio
Em 1968, a Petroquisa tinha assumido a Petroquímica União (PQU) com o Grupo Moreira Sales, comprado a parte da Phillips na Ultrafértil, associando-se ao Grupo Ultra. A Petroquímica União começou a operar em 1972. Suas ações, pertencentes à Petroquisa (67,8%), foram leiloadas em 1994 e distribuídas entre os grupos: União de Indústrias Petroquímicas (Unipar) com 30,01%; Sociedade Anônima dos Empregados da Petroquímica (SEP), 9,84%; e o Banco Itaú S.A.,7,58%. A Petroquisa ficou com 17,47%; e a Odebrecht Química S.A. abocanhou 7%.
Em 1995, o grupo duplicou o Polo de Triunfo em função do aumento de consumo, decorrente do Plano Real, instituído em julho de 1994, pelo governo de Itamar Franco, que estabilizou a moeda. Uma das centrais petroquímicas da Quattor, depois, foi incorporada à Braskem, que passou a controlar as quatro centrais de processamento de nafta e gás natural existentes no país, incluídas Camaçari (BA) e Triunfo (RS).
Após o processo de privatização, a Petroquisa permaneceu com participações minoritárias nas três centrais petroquímicas: Copene (atual Braskem), Copesul e Petroquímica União e em dez outras empresas do setor. A Odebrecht assumiu o controle da Companhia Petroquímica de Camaçari (CPC) em 1995. Desde então, as privatizações centralizam a produção do setor, vertente termoplástica, com o Grupo Odebrecht, Ipiranga e Unipar, do Grupo Ultra e Grupo Suzano.
Ao final do ano 2000, a participação do Banco Econômico na Conepar S.A., foi levado a leilão. O Banco Econômico foi quebrado por Ângelo Calmon de Sá, ex-ministro da Indústria e Comércio durante o governo Geisel. O segundo leilão, em 2001, não obteve êxito.
Em seguida, o governo armou uma operação de emergência para que o empresário Paulo Cunha, do grupo Ultra, pudesse comprar a Conepar e controlar a Copene. Isso depois de os gigantes Dow Química e Pérez Companc saírem do páreo. Cunha contava com o apoio do senador Antônio Carlos Magalhães, dos ministros Rodolpho Tourinho (Minas e Energia) e Alcides Tápias (Desenvolvimento) e do presidente do BNDES, Andrea Calabi. A parceria que o BNDES e o Ultra fizeram para comprar a Copene daria a Paulo Cunha o controle do Polo de Camaçari.
Para se defender do grupo Ultra, o Econômico se associou ao Grupo Odebrecht e ao Grupo Mariani para controlar a Copene. Contavam com o apoio do Banco Central de Armínio Fraga, que administrou a massa falida do Banco Econômico. O Grupo Ultra se retirou do leilão. Com isso, a Odebrecht, que tinha “direito de preferência” por ser dona de parte da Conepar, empresa que possui participação na Norquisa que, por sua vez, controla a Copene, ficou com o holding.
Tanto Odebrecht quanto Ultra detinham ações da própria Norquisa. Marcelo Odebrecht, filho de Emílio Odebrecht, presidente do grupo, esteve pessoalmente no leilão. Com a aquisição, o consórcio Odebrecht-Mariani, que já possuía 32% da Norquisa, passou a deter agora 55,8%. O consórcio negociou a compra das ações do Grupo Suzano na Copene, elevando a participação para 64%.
Para o Banco Central, o resultado do leilão foi decepcionante. Como o ganhador pagou o preço mínimo pelas ações, houve menos recursos para abater a dívida do Econômico sob intervenção do Banco Central. Apenas 10% das dívidas foram quitadas com os R$ 785 milhões obtidos com a venda. A liquidação financeira foi feita com dinheiro obtido por meio de financiamento do Citibank e do ABN Amro Bank. A Odebrecht não colocou um centavo. [6]
Com essa transação, também passaram para as mãos do Grupo Odebrecht-Mariani o controle da Polialden (que fabrica polietileno de alta densidade), com 66,7% do capital votante; e 35% do capital votante da Politeno (empresa controlada pelo Grupo Suzano, que fabrica polietilenos), dando origem à Braskem, através dessa integração. Com isso, em 16 de agosto de 2002, o Grupo Odebrecht e o Grupo Mariani, constituíram a Braskem S.A., onde seriam concentradas as atividades químicas e petroquímicas dos dois grupos a partir do controle acionário da Norquisa. O objetivo principal era conseguir redução de custos operacionais e administrativos e ganhos fiscais.
Além do controle acionário da Norquisa, a Braskem foi formada com a incorporação das empresas Copene, OPP e Triken (Grupo Odebrecht), Proppet e Nitrocarbono (Grupo Mariani), detendo participação acionária na Politeno e Copesul, controlada pela Odebrecht e Ipiranga (ligada ao Grupo Ultra). Em 2007 Braskem, Petrobras e Ultrapar, juntaram-se na maior fusão da história brasileira. Adquiriram o Grupo Ipiranga por US$ 4 bilhões. A Petrobras e a Ultrapar compartilharam as operações de distribuição de combustíveis, e a Braskem assumiu a Ipiranga Petroquímica.
Em junho de 2008, a estatal juntou os ativos da ex-Suzano com a Unipar, formando a Quattor, controlada pelo grupo privado (60%), mas com forte influência do poderoso sócio minoritário estatal. A Unipar pagou muito pouco (R$ 380 milhões) para entrar na sociedade e obteve controle sobre ela. Após pagar pouco para virar sócia da Petrobras, a Unipar ganhou muito para sair da sociedade. Um relatório do Conselho de Controle das Atividades Financeiras, o Coaf, obtido pela revista Época no inquérito da operação Lava Jato, revela que a Unipar depositou R$ 466 mil na conta de uma das empresas de fachada de Youssef, a mesma que recebia depósitos de propina das empreiteiras com contratos na Petrobras.
Em janeiro de 2010, a venda do controle da Quattor para a Odebrecht e a Petrobras foi feita por R$ 872 milhões, incluindo um prêmio de controle de quase 80%. Isso marcou a saída do clã dos Geyer da petroquímica. Dos cerca de R$ 500 milhões como valor de mercado do controle (excluídas as dívidas), a família Geyer detinha 56% do capital, o que representava R$ 280 milhões, o valor aproximado do controle.
A operação desatou um dos últimos nós para a constituição, por Odebrecht e Petrobras, da gigante brasileira, com escala para competir no mercado internacional com concorrentes como Dow Chemical, Exxon Mobil, a empresa saudita Sabic, Shell, LyondellBasele Basf. A compra da Quattor pela Braskem prepara a empresa para um novo ciclo de oferta de matéria-prima, que deve ser iniciado com a exploração do pré-sal.
A nova Braskem
Nesta nova Braskem, o Grupo baiano aportou, no máximo, R$ 1,5 bilhão, cabendo R$ 2,5 bilhões à Petrobras. Com isso, a estatal passou a deter até 49% da nova companhia. Em 1º de abril de 2010, a empresa comprou as operações petroquímicas da Sunoco americana, somando mais de 1,5 milhões de toneladas de resinas da capacidade de produção da Braskem. A aquisição do negócio de polipropileno da Sunoco por US$ 350 milhões iniciou as operações da companhia no mercado norte-americano. Em outubro de 2011, a Braskem adquiriu os ativos de polipropileno da Dow Chemical: duas fábricas nos Estados Unidos e duas na Alemanha.
Nos Estados Unidos, onde é a maior produtora de polipropileno do país, tem cinco unidades de produção localizadas no Texas, na Pensilvânia e na Virgínia Ocidental, e um Centro de Tecnologia e Inovação em Pittsburgh, com sede na Filadélfia. Braskem Europa tem sede em Frankfurt, na Alemanha, com duas plantas, uma em Schkopau e outra em Wesseling. Braskem Europa é uma subsidiária integral da Braskem S.A. É a maior empresa petroquímica da América Latina e uma dos maiores do mundo. É, ainda, a maior produtora de resinas termoplásticas das Américas.
A Braskem possui 13 unidades industriais localizadas em Camaçari. Responde por 79% da produção anual de eteno, o que permite maior poder de barganha junto a Petrobras, na obtenção de nafta, além de lhe assegurar melhor posição no mercado internacional. Com maior economia de escala (redução de impostos e despesas administrativas), maior integração vertical entre a primeira geração (Copene) com algumas indústrias de segunda geração (OPP Química; a antiga CPP, Triken; Polialden; Proppet; Nitrocarbono), o que propicia maior competitividade.
A maioria de suas empresas do Polo de Camaçari está interligada por dutos via à Unidade de Insumos Básicos da Braskem, que recebe derivados de petróleo da Petrobras, principalmente a nafta, e os transforma em petroquímicos básicos (eteno, propeno, benzeno, tolueno, butadieno, xilenos, solventes e outros). Um eteno-duto com mais de 400 quilômetros de extensão interliga a unidade de insumos básicos da Braskem em Camaçari às suas fábricas de Cloro-soda e PVC em Alagoas, fazendo a conexão entre os polos de Camaçari e o Cloroquímico daquele Estado.
A Braskem possui outras 13 fábricas, com localização em Alagoas, Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul, e é considerada uma das cinco maiores empresas de capital privado do país, gerando 2.800 empregos diretos. Controla os três maiores complexos petroquímicos do Brasil, localizados nas cidades de Camaçari (BA), Mauá (SP) e Triunfo (RS), e também um complexo em Duque de Caxias (RJ), que é a base de gás. Possui, ainda, um centro de pesquisa e desenvolvimento no Rio Grande do Sul. Produz outros produtos químicos, que são vendidos principalmente para outras empresas químicas com base nos complexos, como o Innova, Elekeiroz e Dow Chemical.
São acionistas da Braskem: a Petroquisa, o Fundo de Pensão da Petrobras (Petros), o Fundo de Pensão do Banco do Brasil (Previ) e o consórcio Odebrecht-Mariani.
Deste emaranhado de siglas e participações cruzadas, a indústria petroquímica brasileira está reduzida hoje a praticamente uma grande empresa: a Braskem, ao menos no segmento de resinas termoplásticas.
Texto produzido pela Comissão Alan Brandão do Sindipetro AL/SE, com notícias públicas em jornais e pesquisa feita nos arquivos da Petrobras na época da ditadura (primeira parte).
NOTAS:
1. A holding é uma empresa que é proprietária de outras empresas. Geralmente se refere a uma empresa que não produz bens ou serviços por si só. Seu objetivo é ser dono de ações de outras empresas para formar um grupo empresarial, Permitindo a redução do risco para os proprietários e o controle de um número de diferentes empresas.
2. http://www.arqanalagoa.ufscar.br/pdf/recortes/R01316.pdf
3. Boletim Especial GrEve 6/8/85
4. Darliton de Sena Paranhos, “Experiências de luta e conflitos de classe: a trajetória dos trabalhadores químicos e petroquímicos baianos e suas organizações (1963-1997)”, Feira de Santana, agosto de 2011. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de Feira de Santana como requisito para a obtenção do grau de Mestre em História Social, sob a orientação do Professor Doutor Eurelino Coelho.
5. Enviado por Jose Bahiana em 22/4/2011, “A grande greve do polo petroquímico de Camaçari – uma história do Brasil (4)”. http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/2924738
6. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2607200123.htm
ANEXOS:
Documento 1
Documento 2
Documento 3
Devem ser chamados a depor na Comissão Nacional da Verdade para esclarecer os negócios feitos por suas empresas em Camaçari na época da ditadura, assim como a repressão aos trabalhadores no Polo de Camaçari e Braskem: executivos do grupo Ultra (como o empresário Paulo Guilherme Aguiar Cunha, executivo brasileiro, presidente do Conselho de administração da Ultrapar Participações, holding, que comanda os negócios do Grupo Ultraex-funcionário da Petrobras e do BNDESPar; os executivos Marcelo Odebrecht, diretor-presidente e Emílio Alves Odebrecht, presidente do conselho de administração, engenheiro, presidente do Conselho de Administração da Organização Odebrecht; os presidentes do BNDES:, André Franco Montoro Filho (85-87), Ney Fontes de Melo Távora (89-90) e Eduardo Modiano (90-92).