Desde que Lênin escreveu “Que Fazer?”, em 1902, tornou-se comum afirmar que o jornal de uma organização revolucionária deve ser um “organizador coletivo”. Na verdade, o jornal é muito mais do que um organizador… e Lênin sabia disso. Para ele, “o jornal não é apenas um propagandista coletivo e um agitador coletivo. Ele é, também, um organizador coletivo”. Ou seja, ele não é só um agitador, não é só um propagandista, não é só um organizador. Ele é tudo isso ao mesmo tempo.

Para Lênin, era essencial a criação de um “órgão central” de propaganda, agitação e organização. Funcionando como um verdadeiro intelectual coletivo, o jornal do partido criaria as condições para uma prática política verdadeiramente revolucionária, superando as tendências economicistas.

A trajetória da imprensa bolchevique
A imprensa dos bolcheviques passou por diferentes fases e nem sempre sua motivação principal foi a organização partidária. Grosso modo, podemos distinguir cinco períodos da imprensa bolchevique, todos eles marcados pela situação concreta da luta de classes e da organização do partido: 1) o momento da organização, até 1904, quando é criado o Vperiod; 2) o momento da agitação até a derrotada revolução em 1907; 3) o momento da propaganda até 1912, quando é lançado o Pravda; 4) o momento da agitação política, que durará até a revolução de 1917; 5) o período posterior, no qual os esforços recaem sobre a construção do socialismo.

Até 1903, a função principal da imprensa bolchevique era reunir os revolucionários em torno de uma política e de uma organização. Foi o período de unificação dos círculos social-democratas (como os socialistas eram chamados na época). O público ao qual o jornal se dirigia era o dos militantes. Foi, também, o período do Iskra. Lênin, durante essa etapa, insistiu muito no papel do jornal como organizador político da social-democracia.

O ascenso revolucionário a partir de 1903 abriu uma nova fase para a imprensa bolchevique: a fase da agitação. O papel central da imprensa não era a organização e centralização dos bolcheviques e sim a agitação política, com o objetivo de tomar o poder. A derrota da revolução e o grande desânimo vivido pelo movimento operário russo marcam a terceira etapa da imprensa bolchevique. Foi a fase da propaganda, lembrada de forma marcante pela ida ao exílio da redação do Proletari, em 1907. Não foi um retorno, entretanto, aos anos anteriores a 1903. Os bolcheviques já tinham acumulado uma importante coluna de quadros e conquistado uma ampla audiência entre a classe operária. O público da imprensa bolchevique já não era mais interno.

A partir de 1910, o movimento operário russo retomou seu rumo de luta. Lênin, em 1904, por ocasião do lançamento do Vperiod, tinha se oposto a um jornal de massas, mas a nova situação do proletariado russo o convencera de que era chegada a hora. Os bolcheviques, juntamente com alguns mencheviques, acompanharam esse movimento da classe operária com a criação do Svesdá e, posteriormente, do Nievskaia Svesdá. Em janeiro de 1912, o Svesdá, que era semanal, passou a ser bissemanal e, em março, três vezes por semana. Depois de uma campanha que durou vários meses, os bolcheviques lançaram seu primeiro jornal diário no final de abril de 1912, o Pravda. Quarenta dias depois, a venda da publicação foi proibida. Sucederam-se diversos jornais, todos censurados pela regime czarista.

Organizando pouco antes da guerra uma rede de correspondentes operários, que funcionavam como elos no partido e antenas capazes de captar o estado de ânimo da classe, o Pravda e os jornais que vieram depois espalhavam as experiências da luta operária. Assim, criavam as bases para a formação de uma identidade coletiva.
A repressão política tornou-se mais intensa a partir do início da guerra em 1914. Com a crise política decorrente da participação da Rússia no conflito, os bolcheviques foram reconstruindo as bases de sua organização e retomando a agitação política realizada por meio de sua imprensa. Foi esse movimento que colocou os bolcheviques em uma posição privilegiada na revolução de Fevereiro de 1917. Lênin assumiu pessoalmente, em 5 de abril de 1917, a direção do novo Pravda. Foi nas páginas desse jornal que ele lutou pela reorientação política dos bolcheviques.

A imprensa bolchevique não perdeu sua função com a chegada ao poder. No novo período, aberto depois de Outubro de 1917, ela passou a fazer propaganda e defender as tarefas impostas pela construção do novo Estado operário, organizando a classe para tal.

Os correspondentes operários
Os bolcheviques nunca fizeram um jornal dedicado exclusivamente à agitação, à propaganda, ou à organização partidária. Do ponto de vista da concepção leninista de imprensa, é insuficiente dizer que o jornal é o “organizador coletivo”. Ele é tem essa função, mas é também “nosso melhor propagandista e agitador, o propagandista dirigente da revolução proletária”.

O caráter flexível da imprensa bolchevique tinha, entretanto, um elemento que não mudava, sua relação com o partido. A forma como a imprensa partidária consegue estabelecer esta estreita relação, estes laços indissolúveis, é através dos correspondentes. Quando das discussões para o lançamento do Vperiod, o jornal ilegal dos bolcheviques publicado entre dezembro de 1904 e maio de 1905, Lênin enfatizava: “Devemos ter o maior número possível de trabalhadores do partido correspondendo-se conosco, correspondendo-se no sentido habitual e não jornalístico do termo”.

Era com base na prática dos correspondentes e em suas informações que o jornal do partido tornava-se parte do próprio movimento de massas exercendo sua dupla função educativa. Internamente, educava os militantes do partido nas tarefas de agitação, propaganda e organização. Externamente, apresentava-se como elemento formador de uma nova concepção de mundo que tomava como ponto de partida a particularidade da vida operária para generalizá-la sob a forma de luta de classes.

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