As “irregularidades“ no processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, com a cobrança de propina feita pelo ex-diretor do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira, foram manchete em toda a grande imprensa na primeira quinzena de maio. Ricardo Sérgio teria cobrado R$ 15 milhões do empresário Benjamin Steinbruch para capitalizar o consórcio com dinheiro dos fundos de pensão do Banco do Brasil, da Petrobras e da Caixa Econômica Federal. O consórcio de Steinbruch foi o vencedor do leilão da Vale, em 1997.
Coletor de fundos para as campanhas de Fernando Henrique Cardoso à presidência (em 1994 e 98) e de José Serra (à Câmara dos Deputados em 1990 e ao Senado em 94), Ricardo Sérgio, o PC Farias de FHC e Serra, também está sendo investigado pela Polícia Federal por acusações de que teria pedido ao empresário Carlos Jereissati uma comissão de R$ 90 milhões para convencer fundos de pensão a integrarem o consórcio que acabou comprando a Tele Norte Leste (hoje Telemar) no leilão do Sistema Telebrás, vendido em partes em 1998. A Telemar foi uma das principais vencedoras da privatização das teles e controla atualmente a telefonia fixa em vários Estados, como o Rio de Janeiro.
Os inquéritos abertos pelo Ministério Público para apurar se houve ou não pagamento de propinas nas privatizações da Vale e da Telebrás devem ir até o fim e não podem ser simplesmente esquecidos depois de algumas semanas, como aconteceu com tantos outros escândalos descobertos e depois abafados pelo governo. FHC e Serra farão de tudo para silenciar mais estas denúncias.
É preciso entender que a corrupção não se restringe a saber se Ricardo Sérgio cobrou ou não a propina, se o dinheiro foi ou não pago, se houve favorecimento a um grupo por intermédio direto do então presidente do Banco do Brasil.
A corrupção não é um detalhe que pode ter acontecido na privatização de uma ou outra empresa estatal. Toda a política de sucateamento e privatizações implantada pelo governo neo-liberal está, desde o início, baseada na corrupção e no favorecimento de grupos particulares em detrimento dos interesses da maioria da população.
O Programa Nacional de Desestatização iniciou-se em 1990, apoiado na lógica do neoliberalismo, de privilegiar a integração do sistema produtivo nacional à economia mundial. Dentro dessa argumentação, a interferência estatal seria um obstáculo ao desenvolvimento tecnológico. Assim, o Estado deveria livrar-se dos “elefantes brancos“ que representavam as estatais, empresas ineficientes que só serviam para onerar a União, deixando ao setor privado a incumbência de gerar e distribuir riquezas no país.
Mesmo no caso de empresas lucrativas (como a Vale do Rio Doce), privatizar seria uma forma de tornar as ex-estatais mais modernas e competitivas no mercado e, com o crescimento causado pelo investimento privado nessas empresas, gerar empregos e aumentar a arrecadação de impostos. Com a venda das estatais, o governo ganharia o suficiente para “sair do buraco“ e sobraria mais dinheiro para investir em “áreas essenciais“, como saúde e educação.
O que se viu em mais de uma década de privatizações, que envolveram a indústria de transformação (petroquímica, siderurgia, mineração e fertilizantes), telecomunicações, energia, transportes, bancos, estradas, etc., foi bem diferente do que o governo propagandeava.
Os números das privatizações
– 166 empresas privatizadas entre 1990 e 1999
– 546 mil postos de trabalho extintos diretamente
– 17,1% dos 3,2 milhões de empregos formais perdidos na década
– O governo conseguiu com a venda das estatais até 1998, R$ 85,2 bilhões (incluindo a tranferencia de dividas)
– O governo gastou ou deixou de arrecadar até 1998, R$ 87,6 bilhões
Vendas a prazo: R$ 14,8 bilhões
Dívidas pagas pelo governo: R$ 16,1 bilhões
Juros de 15% sobre essas dívidas: R$ 8,7 bilhões
Investimentos antes das privatizações (Açominas, CSN e Telebrás), mais juros: R$ 37,4 bilhões
Moedas podres usadas: R$ 8,9 bilhões
Dinheiro deixado em caixa (Telesp e Vale): R$ 1,7 bilhões
Fontes:Pochmann, Márcio. A década dos mitos. São Paulo, Editora Contexto, 2001.
Biondi, Aloysio. O Brasil privatizado. São Paulo, Editora Perseu Abramo, 2001
Post author Luiza Castelli,
de São Paulo
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