A fala imbecil do já ex-Secretário de Cultura, Roberto Alvim, plagiando o ministro da propaganda nazista, recebeu em tempo o repúdio que merecia. E, lógico, diante da referência nazista a reação óbvia de todo mundo foi olhar para a comunidade judaica aguardado a manifestação. Inclusive teve gente que já saiu denunciando o Davi Alcolumbre – judeu e presidente do Senado – por apoiar o governo e não se manifestar sobre a barbaridade.

De fato, a declaração é uma ofensa sem precedentes. A comunidade judaica deve repudiar veementemente. É o que se espera de cada judeu honesto.

Parece uma contradição imensa. A gente até se pergunta: como pode o governo Bolsonaro, que tanto idolatra e puxa-saco de Israel, nomear um Secretário como Alvim?

Então.

Uma arte heróica, imperativa, romântica e ligada ao destino do nosso povo. Vou aproveitar para dizer que essa concepção de arte não é exclusividade do governo miliciano de Bolsonaro e da Alemanha nazista. A ideia de uma arte instrumentalizada como propaganda de projetos totalitários e nacionais foi compartilhada por muita gente no começo do século XX. Inclusive pelo sionismo – os ideólogos da fundação do Estado de Israel. E com tudo que tinha direito: romantismo, imperatividade, mitos nacionais etc.

Israel foi fundado em 1947 sob a ideologia da formação de um Estado-nação para um único povo, homogêneo etnicamente, em um lugar que remontasse tanto ao “passado glorioso” e ao futuro promissor da “terra prometida”. São inúmeras as referências na propaganda sionista aos macabeus (exército rebelde judeu que lutou pela independência da Judeia em 37 a.C.) ou à ideia de que Israel era a Nova Canaã bíblica, a terra prometida. Tudo isso, digamos, faz parte dos “mitos nacionais” sionistas.

A defesa que setores evangélicos conservadores no Brasil hoje fazem do Estado de Israel é basicamente apoiado nessa mitologia Bíblica. Não em uma compreensão geopolítica de fato sobre o papel de Israel no Oriente Médio.

A bizarrice do projeto sionista era tanta que em 1933 a Federação Sionista da Alemanha fechou um acordo com o governo nazista – o Acordo de Ha’avarah – que funcionou até 1938. Diante da perseguição, o acordo estabelecia critérios que favorecessem a emigração de judeus para a Palestina em troca de importações da Alemanha Nazista. Ou seja, aproveitaram a perseguição nazi para fortalecer o projeto de colonização racista da Palestina.

Esse tipo de “arte-propaganda” existia antes da Alemanha Nazista e, com sua queda, acabou ganhando força. O sionismo, que apertou as mãos nazistas em 1933, saiu ainda mais fortalecido com o fim da Segunda Guerra. Afinal, foram as grandes vítimas. Dois anos depois da Guerra é fundado o Estado de Israel e formalizada a ocupação racista da Palestina pela ONU. A política de assentamentos se fortalece e junto com ela a propaganda heróica, de refundação do povo, do auto sacrifício e do engajamento emocional em prol desse projeto de Estado-nação.

De lá pra cá o que a gente viu é a consolidação de um projeto de apartheid. Checkpoints para todos os lados, limpeza étnica, perseguição, prisões em massa, tortura, uma economia nacional baseada na indústria bélica, cultura como instrumento de propaganda. Esse é o Estado racista de Israel hoje.

Em 2018 o Estado de Israel financiou um bloco inteiro na Parada Gay de São Paulo. O bloco se chamava Tel Aviv Israel e seu embaixador foi ninguém menos que o estilista Alexandre Herchcovitch. Sabe porque um país financia um bloco em uma parada gay em outro continente? Porque instrumentaliza manifestações culturais como propaganda de Estado. Israel paga por um bloco na segunda maior parada gay do mundo porque faz de si um discurso como “única democracia” no Oriente Médio. O que é uma grande mentira e não passa de propaganda. Mitologia pura.

Também temos o caso de Gal Gadot, a atriz que interpreta a Mulher Maravilha, que participou de um ensaio para a revista Maxim com o tema “Mulheres do Exército Israelense”. Pura propaganda. Machista na forma e “romântica” no sentido estético, de “exaltação da raça e do povo”.

Particularmente, não acho correta a comparação entre Alemanha nazi e Israel. São coisas diferentes e quando comparamos apagamos as diferenças. Mas também não é incompreensível quem o faça.

Então, meus caros, fica respondida a pergunta. Pelo menos tratando-se de arte, Bolsonaro pode apoiar o proto-nazistinha do Roberto Alvim e ao mesmo tempo apoiar o Estado de Israel. A contradição é só aparente. Os projetos tem similaridades. Sionismo e nazismo apertaram as mãos em 1933 e compartilhavam da mesma concepção de “arte-propaganda”.

O stalinismo e seu realismo socialista também compartilhavam dessa mesma concepção. É tudo muito parecido e, particularmente, gosto de enquadrar tudo isso na ideia de realismo heróico. Mas sobre o stalinismo fica para depois.

E só para adiantar antes que me chamem de anti-semita: liberdade religiosa é uma coisa, projeto racista de limpeza étnica outra.