Fujian Um médico verifica a temperatura corporal de uma mulher em um hospital em Fuzhou, província de Fujian, no sudeste da China foto Gov Cn
Maria Victória R. Ruy e Wagner Miquéias F. Damasceno de Florianópolis

Maria Victória R. Ruy e Wagner Miquéias F. Damasceno

Nesta semana, os casos de coronavírus foram declarados, pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como uma emergência de saúde pública de interesse internacional.

O coronavírus é uma variação da família coronavírus, identificados na década de 1960. O primeiro caso desta variação do coronavírus surgiu na cidade de Wuhan, a 7ª maior cidade da China. Ainda não se sabe como ocorreu a transmissão deste vírus. Informações de noticiários indicam que mais de 304 pessoas já morreram na China.

No entanto, é difícil saber a real situação da contaminação na China. Afinal, o povo chinês vive sob uma ditadura controlada pelo Partido Comunista Chinês que, por sua vez, restringe as liberdades da população e o acesso à informação. Não por acaso, algumas pessoas na China vêm comparando a epidemia de coronavírus ao desastre em Chernobyl, cuja grande contaminação foi agravada pela incompetência e mentiras da ditadura estalinista.

O PC chinês, os partidos estalinistas mundo afora e os países imperialistas, alimentam, com diferentes objetivos, uma mesma mentira: de que a China é um país comunista. Porém, isso não corresponde, de forma alguma, com a realidade.

Há muito tempo a China tornou-se uma cruel combinação do “pior dos dois mundos”: uma sangrenta ditadura de matriz estalinista e uma “fábrica do mundo”, explorando brutalmente a classe trabalhadora chinesa. Ou seja, por mais que o governo chinês se enfeite com símbolos comunistas, a China é uma ditadura capitalista que controla com mãos de ferro o povo trabalhador chinês.

Até o momento, há casos de contaminação pelo coronavírus confirmados em 24 países, cobrindo 4 continentes. No Brasil há 12 casos suspeitos de contaminação e 7 deles se concentram no estado de São Paulo.

A ameaça de uma nova epidemia global, originada na China, faz emergir, por um lado, a fragilidade da saúde pública no capitalismo e, por outro, traz à tona o racismo contra as populações asiáticas, em especial os chineses.

Os chineses como pessoas “sujas e traiçoeiras” e o mito da “minoria modelo”

Os estereótipos acerca dos chineses oscilam entre a ideia de uma etnia inferior aos brancos (“inferioridade” que tomaria forma na suposta “falta de higiene” e “falha moral” atribuídas aos asiáticos) e no “mito da minoria modelo”, isto é, de uma “minoria boa”, um povo essencialmente disciplinado, trabalhador, inteligente e “que deu certo”.

Em um momento de tensão igual a este, vemos subir à superfície esse primeiro discurso: o dos chineses como pessoas sujas e burras, inimigos permanentes e eternos estrangeiros, que quando não estão tentando “sabotar” os brasileiros são, no mínimo, inconvenientes e desagradáveis. Não por acaso, com a ameaça de uma epidemia de coronavírus, assistimos um “surto” destas declarações racistas.

Como toda ideologia racista, há, também, uma suposta exaltação de características que seriam “positivas” nos asiáticos, que se combina com o discurso de ódio mencionado antes. No Brasil e em outros países, como os EUA, essa associação do asiático com a “inteligência” ou a “disciplina”, por sua vez, é muitas vezes utilizada para fortalecer o racismo contra negros e indígenas. Não foi por acaso que, para tentar desqualificar os negros quilombolas, em palestra no Clube Hebraica – quando disse que eles não serviam nem para procriar –, Jair Bolsonaro comparou os negros aos japoneses, dizendo que: “Nunca viu japonês pedindo esmola. É uma raça que tem vergonha na cara“.

À primeira vista, o estereótipo do “asiático inteligente” pode parecer um elogio inofensivo, mas ao atribuir características inatas a uma raça, acaba por reforçar o racismo como um todo. Consequentemente, esse pensamento está a serviço do racismo, e não traz benefícios nem mesmo aos asiáticos, isso porque a “exaltação” do mito da minoria modelo cria estereótipos, que resultam em expectativas limitadas e mesmo irrealistas sobre os asiáticos e vira ódio ao menor sinal de conflito ou tensão, como estamos vendo agora.

Ainda que pareçam opostos, um discurso acaba alimentando o outro.

Epidemia de Coronavírus faz emergir o racismo e a xenofobia contra chineses

O medo do vírus e sua ligação à China fizeram com que as hostilidades contra asiáticos aumentassem por todo o mundo, nos últimos dias. Na França, onde já há casos confirmados de contágio, franco-chineses lançaram campanhas contra a discriminação de asiáticos em espaços públicos, por conta da frequente associação de que qualquer pessoa com traços chineses esteja contaminada. Na Rússia, logo após a confirmação de dois casos, o vice-presidente da associação de médicos da Rússia disse que não havia com o que se preocupar, pois os dois casos eram de cidadãos chineses, que, segundo ele, “têm mais predisposição a esse tipo de doenças”.

A ideia de que a epidemia é resultado da “burrice”, do “primitivismo” ou da “sujeira” dos chineses alimenta o racismo e a xenofobia que já existia, mas que agora contam com um pretexto para se disseminar à luz do dia.

O pânico e a discriminação chegam a criar obstáculos para a aplicação das medidas apropriadas para a contenção do vírus. O número de migrantes internacionais não chega a um terço do número daqueles que viajam a negócios ou por lazer, e o de refugiados é ainda menor. Entretanto, em todos os casos de emergências sanitárias anteriores os migrantes foram vítimas de represálias inúteis, coisa que não aconteceu com turistas e executivos. O preconceito (étnico-racial e social) e a discriminação, além de serem práticas odiosas, atrapalham a própria prevenção da epidemia.

Devemos solidariedade irrestrita às vítimas da epidemia e devemos rechaçar qualquer forma de preconceito étnico-racial e xenofóbico. Há de se pensar: Qual seria a postura da maioria das pessoas diante de uma epidemia originária da Europa? Seriam os europeus os “culpados” pela doença, como os chineses estão sendo?

O racismo e a xenofobia ocultam as diferenças de classes sociais dentro de uma mesma população e, ainda por cima, retiram dos governos a responsabilidade com a saúde pública. Ou seja, se os “maus hábitos chineses” são apontados como a causa da epidemia e de sua disseminação, a precarização da saúde e do saneamento básico ficam em segundo plano, se é que é lembrada. O surgimento de novos vírus é algo praticamente inevitável, resultado da mutação de vírus já existentes. Já a epidemia não é nada inevitável – pode e deve ser tratado e contido com acesso universal à saúde e saneamento de qualidade.

Wuhan, província de Hubei  Peng Zhiyong , chefe do departamento de medicina intensiva do Hospital Zhongnan, verifica o registro do diagnóstico de um paciente com seu colega na UTI do Hospital Zhongnan da Universidade de Wuhan em Wuhan, província de Hubei, na China Central, foto Governo China

A saúde pública no capitalismo vai de mal a pior

Segundo dados da OMS e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca de 4,5 bilhões de pessoas no mundo não têm acesso a saneamento básico seguro. Há, também, 2,3 bilhões de pessoas que não têm acesso a nenhum serviço de saneamento.

E no que se refere à água, 2,1 bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso à água potável encanada e tratada. A população do Rio de Janeiro tem experimentado isso, com a distribuição de água contaminada para suas casas[1].

Essa é verdadeira face do capitalismo: um sistema onde os trabalhadores produzem uma imensa riqueza que é apropriada pela burguesia. Enquanto a burguesia desfruta de uma vida de luxo e abundância, a classe trabalhadora mundial é condenada a uma existência miserável, sem acesso a condições básicas para sua sobrevivência.

É a partir deste cenário devastador que se deve discutir a proliferação de doenças como o coronavírus, um vírus que se dissemina rapidamente, não por causa da suposta “imundície” de um povo, mas pela degradação das condições de vida que o sistema capitalismo provoca.

Por outro lado, a irracionalidade do capitalismo, faz com que, em pleno século XXI ainda tenhamos que sofrer com doenças que já deveriam ter sido erradicadas, mas que não são eliminadas porque as indústrias farmacêuticas não produzem medicamentos para o bem estar das pessoas, mas sim para o seu próprio lucro, mantendo a propriedade privada dos medicamentos (patentes) e seus segredos comerciais.

Além disso, a anarquia do mercado e o fato de que cada país é controlado por sua respectiva burguesia, que competem umas com as outras em busca de lucro, tornam impossíveis ações coordenadas em nível internacional para responder a uma epidemia mundial, como aponta a professora da faculdade de Saúde Pública da USP, Deisy Ventura:

[…] se cada Estado adotar medidas por conta própria, em uma escala que pode ir da negligência ao exagero, sem levar em conta informações e recursos compartilhados por centros de pesquisa, agências internacionais e outros Estados, as possibilidades de controle da doença serão radicalmente diminuídas, enquanto as de causar danos desnecessários serão muito aumentadas.

Embora não haja nenhum caso confirmado de coronavírus no Brasil, é possível que surja contaminação no país. E, no momento que o mundo volta a atenção para essa epidemia, o Governo Bolsonaro não apresenta nenhum plano concreto de prevenção e enfrentamento ao coronavírus. Na verdade, o que Bolsonaro faz é tirar dinheiro da Saúde e da Educação.

Segundo dados divulgados pelo Tesouro Federal, no ano passado, o Governo Bolsonaro cortou 16% do orçamento para a Educação e 4,3% na Saúde. Enquanto corta dinheiro na Educação e na Saúde, Bolsonaro compra a peso de ouro o voto de parlamentares para aprovarem projetos contra os trabalhadores no Congresso, dá bilhões para os banqueiros e perdoa dívidas de grandes empresários e latifundiários, como Luciano Hang, dono das lojas Havan.

No Brasil, a maior parte das pesquisas científicas é produzida nas universidades e Institutos Federais de Ensino Superior. Porém são justamente essas instituições que o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, vem atacando. Corta dinheiro das universidades públicas, e ataca diariamente os trabalhadores da Educação e os estudantes, inviabilizando o ensino, a pesquisa e a extensão nessas instituições.

E, como se isso tudo não bastasse, Bolsonaro nomeou na semana passada um burocrata de extrema-direita para a presidência da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e que não acredita nas mutações evoluções de vírus e bactérias porque é um criacionista. Isto é, alguém que recusa a Teoria da Evolução e não acredita na ciência, pois crê que toda forma de vida e o próprio universo foram criados por um deus.

Por isso, não podemos ficar de braços cruzados esperando mais ataques desse governo. É hora de organizar a nossa classe em defesa da Saúde e da Educação! É hora de organizar uma ampla unidade de ação para derrubar Bolsonaro-Mourão, e esse Congresso de corruptos!

  • Contra toda forma de racismo e xenofobia!
  • Contra os cortes na Saúde e Educação!
  • Fora Weintraub do Ministério da Educação!
  • Fora Benedito Aguiar da Capes! Por um Estado laico e pelo investimento estatal na Ciência e na tecnologia!
  • Saúde e Educação não são mercadorias! Devem ser públicas, gratuitas e de qualidade!
  • Basta de Bolsonaro e Mourão!
  • Suspensão do pagamento da dívida aos banqueiros e auditoria já!
  • Estatização sem indenização do sistema financeiro sob o controle dos trabalhadores!
  • O Brasil precisa de uma revolução socialista! O Chile mostra o caminho!
  • Por um governo socialista dos trabalhadores apoiados em conselhos populares!

[1]Ver: https://www.pstu.org.br/crise-hidrica-no-rio-de-janeiro-agua-contaminada-crise-ambiental-e-privatizacao-da-agua/.