Firminia Rodrigues, de Minas Gerais

Firminia Rodrigues, da Secretaria Nacional de Mulheres

Mais um crime bizarro foi noticiado pela mídia essa semana. No domingo (30/7) em Belo Horizonte (MG), uma jovem de 22 anos foi sequestrada, transportada por 3 km e estuprada por um desconhecido, depois de ter sido abandonada inconsciente por um motorista de aplicativo, na calçada na porta de sua casa, de madrugada, quando este tocou o interfone e tentou contato mas não foi atendido.  A moça foi encontrada num campo de futebol, com sinais de violência sexual, comprovada após exame médico. Nos solidarizamos com a vítima e exigimos que o (s) responsável (eis) seja(m) punidos.

Os detalhes repugnantes do caso levantam uma série de questões. Em primeiro lugar, evidenciam de forma contundente a naturalização da violência contra a mulher e a existência de uma cultura do estupro, arraigada pela ideologia machista em nossa sociedade, conivente com a objetificação e violação do corpo das mulheres. Não por acaso um estupro é registrado a cada dois minutos no Brasil e em Minas Gerais a cada duas horas. A maioria das vítimas são meninas até 13 anos e os agressores familiares ou conhecidos que se acham no direito de “usufruir” do corpo da mulher, ou seja, literalmente o perigo mora em casa. Nesse caso, em que pese a forma distinta da maioria dos abusos (estupro cometido fora de casa por um desconhecido), a lógica é a mesma, nossos corpos não nos pertencem, mas são considerados meros objetos de prazer masculino, de forma que, um homem vê uma mulher em situação de vulnerabilidade na rua e ao invés de ajudá-la, simplesmente se acha no direito de abusá-la.

Em segundo lugar, a sucessão de negligências cometidas no processo que acabou resultando no crime. A começar pelo (s) amigos (s) da moça, que vendo seu estado de vulnerabilidade, tomaram a decisão de colocá-la num carro de aplicativo e a mandaram sozinha pra casa; seguido (s) pelo irmão, que, avisado, foi conivente com tal atitude; mas sobretudo o motorista de aplicativo que, percebendo a gravidade da situação (uma passageira embriagada e inconsciente, no banco traseiro de seu carro) ao invés de buscar algum tipo ajuda para a moça: levá-la a uma unidade de saúde ou contatar a polícia, abandonou-a na rua; não, evidentemente, sem o apoio de um terceiro, que o ajudou a retirá-la do carro e deixá-la ali. É impressionante que a nenhuma desses homens, tenha lhes ocorrido que algo de muito ruim poderia passar com essa jovem. Lamentavelmente na nossa sociedade, não basta não ser o agente da violência, é preciso também ter um mínimo de empatia e solidariedade dos homens para com as mulheres, para que seus corpos estejam seguros.

É importante reafirmar que a culpa não é da vítima. Sabemos que a cultura do estupro tende a responsabilizar as mulheres pela violência sofrida, seja pela desculpa de estarem embriagadas, vestindo determinadas roupas, em local errado ou “fora de hora”, não indo a fundo na causa da violência. O capitalismo se utiliza da opressão às mulheres e outros setores socialmente vulneráveis, para aumentar a exploração e seus lucros e garantir a reprodução da força de trabalho através do controle dos corpos das mulheres, bem como manter a classe trabalhadora dividida e assegurar a dominação burguesa, se tudo isso se dá mediante a violência e a violação aos corpos das mulheres (violência sexual) é um mero detalhe, o que importa é que a manutenção do sistema, por isso em que pese todas as palavras proferidas pela burguesia e seus representantes, contra a desigualdade de gênero e as promessas de medidas para pôr fim ao machismo e à violência, o que vemos é uma sociedade onde as mulheres são cada vez mais oprimidas e violentadas.

É necessário mais que discurso e medidas paliativas, é preciso uma política real e concreta de combate ao machismo e à violência que passe tanto pela punição rigorosa aos agressores e assistência às vítimas, como por campanhas educativas massivas através das mídias, além de assegurar condições para que as mulheres exerçam sua autonomia, incluindo a autonomia de seus próprios corpos.

Não devemos, contudo, esperar um empenho real dos governos burgueses para que a violência às mulheres seja combatida. Inclusive, esse programa mínimo, nos marcos do capitalismo, só pode se concretizar se a classe trabalhadora de conjunto (homens e mulheres) e suas organizações (sindicatos, movimentos, etc), tendo as mulheres trabalhadoras à frente, assumirem essa bandeira com prioridade e organizarem a luta contra a cultura do estupro e pelo fim da violência.

Junto com isso é necessário colocar essa luta à serviço da luta pelo socialismo. Isso não significa renunciarmos a batalhar para melhorar nossa condição de vida aqui e agora, mas compreender que o fim da violência e do machismo e uma verdadeira emancipação da mulher e só é possível numa sociedade baseada em outros tipos de relações, relações de igualdade e solidariedade reais, onde não haja nem exploração nem opressão, uma sociedade socialista!