O Brasil não renovou o acordo com o FMI, que já durava quase sete anos. Logo após o anúncio, feito no dia último dia 28, Lula foi à imprensa dizer que “Ninguém precisa dizer para nós que precisamos ser responsáveis com os gastos públicos”.

Dever de casa
Nos últimos anos, tornou-se uma diretriz do FMI exigir que os governos adotassem como sua política o tradicional receituário do Fundo, prova disso foram as declarações de membros do governo de que o superávit primário, a reforma da Previdência e outras medidas, a despeito de constarem em Cartas de Intenção do governo brasileiro ao FMI, eram atos soberanos, realizados simplesmente por serem “bons para o país”. O governo fez mais: aumentou as metas do FMI, como o superávit primário, de 3,75% para 4,25% e, posteriormente, para 4,5% em 2004.

Realizou também as reformas impostas pelo Fundo, como a reforma Tributária (preservando-se a DRU e o CPMF, para manter o pagamento da dívida), a da Previdência, a nova Lei de Falências (privilegiando-se os bancos), as Parcerias Público-Privadas (PPPs) e agora planeja aprovar a independência do Banco Central.

A frase de Lula ora citada é sintomática de um governo que continuará a aplicar o receituário do Fundo. Responsáveis para quem? No último “contingenciamento” de fevereiro, o governo cortou, por exemplo, quase a metade dos recursos do Ministério dos Transportes, colocando ainda mais em risco a população brasileira, cansada de enfrentar intermináveis buracos nas estradas. Isso é ser responsável? Sim, mas com os banqueiros.

Tudo como antes
Nada na política econômica mudará com o anúncio do fim do acordo. Todas as ações do governo revelam sua submissão ao mercado, que possui, além do FMI, outras armas: a chantagem do risco-país, por exemplo. Qualquer iniciativa governista que represente uma mínima ameaça ao receituário neoliberal, faz com que os credores ameaçem não mais nos emprestar, elevando o risco-país (que representa os juros adicionais que temos de pagar, pelo fato de sermos desobedientes ao “mercado”).

Essa é a chantagem feita diariamente, talvez até mais poderosa que a do FMI. A ela, porém, submetem-se apenas os governantes fracos, que necessitam do apoio do mercado; não possuem coragem de mudar as coisas, sob o risco de perder o financiamento internacional. Mas para quê querem mais financiamento internacional? Para pagar as dívidas anteriores.

Quando “rompeu” com o FMI, Lula afirmou também que “o governo conquistou, com o sacrifício do povo brasileiro, o direito de andar com as próprias pernas”. A declaração lembra o grito do Ipiranga, quando Dom Pedro I disse que estávamos independentes. Sem nenhuma manifestação popular, sem conflito algum com o imperialismo. Lula até quis permanecer sob a tutela do Fundo, com uma linha especial de crédito, para prevenir crises, mas o FMI não aceitou.

Depois disso tudo, cabe-nos perguntar: o Brasil que dispensou o FMI, ou o FMI que dispensou o Brasil, por já saber que iríamos cumprir todas as tarefas?

Post author Rodrigo Vieira de Ávila, economista da Campanha Auditoria Cidadã da Dívida
Publication Date