O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) está sendo vítima de uma sórdida campanha de perseguição por parte do latifúndio. A bancada ruralista do Congresso Nacional prepara uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o movimento. Trata-se de um ataque do latifúndio contra o movimento, mas que atinge todos os movimentos que lutam pela reforma agrária, os povos indígenas, quilombolas e camponeses. Lutar é direito, não é crime. O MST luta por reforma agrária e pela agricultura camponesa. Quem deveria ser investigado são os  representantes do agronegócio. São eles que cometem crimes, espalham violência com seus jagunços e roubam terras de pequenos posseiros por meio da fraude e grilagem. Muitos estão no Congresso aprovando leis em prol do roubo de terras, contra populações indígenas, quilombolas e o  meio ambiente.

Ataques também vem de ministros

E, mais uma vez, os ruralistas continuam ocupando os ministérios de um governo do PT, e de lá atacam o movimento, tal como fez o ministro da Agricultura, o sojicultor Carlos Fávaro (PSD). Fávaro fez uma comparação esdrúxula das ações do MST durante o abril vermelho com os atos golpistas de bolsonaristas em 8 de janeiro. Também não deixou dúvidas de que apoia a CPI.

“O Congresso Nacional tem a prerrogativa de, quando acha que tem alguma coisa em desconformidade na sociedade”, declarou no dia 27 de abril.

As declarações do Ministro sojicultor devem ser veementemente repudiadas. O ministro é responsável por autorizar a liberação de 166 produtos agrotóxicos até o último dia 30. É um aliado da bancada ruralista e apoia as demandas do agronegócio.

Ministros do PT também atacaram os sem terra, como Alexandre Padilha, das Relações Institucionais e Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário, que ameaçou o movimento, dizendo que a “desocupação de terras invadidas nos últimos dias é um condicionante para o governo prosseguir com o programa de reforma agrária”.

Defender o MST

É preciso defender o MST e todos os movimentos do campo  dos ataques dos ruralistas e das ocupações de terras como instrumento legítimo de pressão pela reforma agrária. Aliás, os assentamentos existentes hoje foram conquistados sob esse método de luta.  É preciso investigar e punir os crimes do agronegócio, estes sim verdadeiros invasores de terras. O agro deve ser estatizado e colocado sob o controle dos trabalhadores.

Direção do MST precisa romper com o governo

Em 2002, Lula disse que faria a reforma agrária “numa canetada”. Mas o PT governou 14 anos com o agro e fez muito pouco pelos sem terras que continuaram sendo alvo da violência dos latifundiários. Não se pode tratar esse governo com um aliado, nem dizer que Carlos Fávaro é um “homem sério”, como falou João Pedro Stédile, dirigente do MST.

Alertamos os ativistas do MST: esse governo não “é nosso”. A direção do MST precisa romper com o atrelamento ao governo para que os sem terra possam lutar, derrotar o agro e conquistar a reforma agrária e o necessário apoio financeiro aos milhares de camponeses assentados.

Neocolonial

O agronegócio brasileiro é expressão da decadência econômica do país

O agronegócio é expressão da decadência brasileira, da reprimarização econômica do país que provoca a desindustrialização e torna o Brasil mero exportador de matérias-primas, minerais e agrícolas.

Desde 1980, a redução da participação do setor industrial na formação do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é brutal. Em 1985, a indústria respondia por 47,9% do PIB; em 2013, por 24,8%; e em 2019, por 22%. Já o agronegócio representou 47,6% do total exportado pelo Brasil em 2022.

Em 2020, aproximadamente 60% da soja brasileira foi adquirida pela China, que, em contrapartida, nos forneceu produtos industrializados, como máscaras e respiradores, que não conseguimos fabricar nacionalmente durante a pandemia.

Lula nunca escondeu que apoia o agronegócio. Em 2010, em um discurso realizado em uma solenidade de formatura de novos diplomatas, ele afirmou que “as commodities estão ficando mais valiosas do que os tais produtos manufaturados”. Agora, em seu terceiro mandato, Lula continua a defender o setor. Na 27ª edição da Conferência sobre Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas, a COP-27, Lula chegou a dizer que “o agronegócio será aliado estratégico na busca de uma agricultura regenerativa e sustentável”. O problema, entretanto, é que defender um agronegócio sustentável é insustentável, pela própria natureza desse modelo agrícola.

O agro é roubo de terras e violência

A maioria dos grandes “produtores” do agronegócio se apropriou de terras públicas, especialmente no bioma amazônico e no Cerrado. No Brasil, existem várias modalidades de terras públicas. As terras devolutas são uma modalidade de terra pública que não está identificada, não se sabe onde está e, por essa razão, sequer está integrada ao patrimônio público. As terras devolutas somam cerca de 141,5 milhões de hectares. Essas são as preferidas pelos ladrões do agro, que as registram de maneira fraudulenta em algum cartório corrupto. Esse processo é conhecido como grilagem.

Outra modalidade são as terras federais e estaduais, cerca de 263 milhões de hectares (aproximadamente 30% do território nacional), que se dividem entre Terras e Reservas Indígenas, quilombolas, Unidades de Conservação. Essas modalidades também são alvos dos ruralistas, que invadem Terras Indígenas, parques nacionais, causam incêndios, desmatamento e contratam pistoleiros para expulsar indígenas e camponeses.

Após “limparem a terra”, eles aguardam por um governo que lhes permita legalizar o roubo de terras, como ocorreu com a aprovação da Lei 11.952 durante o governo Lula em 2009. Essa lei permitiu a emissão de títulos de áreas públicas na Amazônia, ocupadas e desmatadas ilegalmente até dezembro de 2004, em áreas de até 1.500 hectares. O mesmo ocorreu com a MP  759, no governo de Michel Temer, que aumentou a área passível de regularização para até 2.500 hectares e legalizou a apropriação de terras públicas invadidas até dezembro de 2011.

O agro é fogo e desmatamento

Um levantamento da área queimada pelo fogo no Brasil mostra que, entre 1985 e 2022, foram queimados 185,7 milhões de hectares, o que equivale a 21,8% do território nacional. Essa extensão é comparável à soma da Colômbia com o Chile, segundo dados do MapBiomas.

Cerrado e a Amazônia concentraram cerca de 86% da área queimada do Brasil. É importante lembrar que, mesmo sob Lula, o desmatamento na Amazônia triplicou em março de 2023, com quase mil campos de futebol destruídos por dia.

O Cerrado, em média, teve uma área queimada maior do que a Escócia a cada ano. No caso da Amazônia, foi quase uma Irlanda por ano (6,8 milhões hectares). Mas a liderança é do Pantanal, que teve 51% de seu território consumido pelo fogo nesse período. Esse bioma sofre a invasão do agro e registrou o maior incêndio já registrado no Brasil.

O agro também é seca. Mais de 70% da água consumida do Brasil é utilizada na agricultura. Em 30 anos, o país perdeu 1,5 milhão de hectares de superfície de água, segundo dados do MapBiomas. Só no Pantanal, a perda de superfície de água foi de 81,7%.

O agro é fome

Mas como produzir alimentos sem o agro que carrega o país nas costas? Essa é a mentira colossal, repetida diariamente pela mídia, pelo agro e por Lula. Um verdadeiro mantra do agronegócio.

A verdade é que o agronegócio não produz alimento algum. Ao contrário, representa uma ameaça à segurança alimentar do país. Só para ficar no feijão com arroz, vejamos os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De 2006 para cá, a área de plantio de arroz no país caiu praticamente pela metade (-44%); enquanto a do feijão encolheu 32%. No mesmo período, a de soja quase dobrou (+86%), ao passo que o milho avançou 66%, duas das importantes commodities vendidas no mercado internacional.

É a agricultura camponesa que garante boa parte do arroz e do feijão para abastecer o mercado brasileiro. É responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos em todo o país. Segundo o Censo Agropecuário de 2006, o setor produz 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz e 21% do trigo do Brasil. Na pecuária, é responsável por 60% da produção de leite, além de 59% do rebanho suíno, 50% das aves e 30% dos bovinos do país. Esses são os dados, essa é a realidade.

O agro é trabalho escravo

O agro é o exemplo do desenvolvimento desigual e combinado do processo da expansão do capitalismo no Brasil. O agronegócio combina a mais fina tecnologia da chamada agricultura de precisão com a velha concentração fundiária, violência, empregando pouca gente e ainda se fazendo valer do trabalho escravo moderno.

O crescimento do agro impulsionou o trabalho escravo no país. Segundo o Ministério do Trabalho, entre 2003 e 2014, o agronegócio foi campeão absoluto na utilização do trabalho escravo, com praticamente 80% dos trabalhadores libertados.

Não temos apenas os “escravizados do vinho”, como o caso das vinícolas do Rio Grande do Sul, mas também da madeira, da carne, da soja, do algodão, do café, do suco de laranja, da erva-mate, do sisal, do açúcar…

O agro é bancado com dinheiro público

De acordo com o relatório publicado pela Oxfam, 4.013 proprietários de terra devem quase  R$1 trilhão. Um grupo seleto de 729 proprietários  somam uma dívida de R$ 200 bilhões. A dívida dessa turma é sempre empurrada pela barriga pelos governos de plantão. O governo Temer, por exemplo, editou a MP 733 para que ruralistas liquidem a dívida com bônus entre 60% e 95%.

O agro é veneno na sua mesa

Durante a gestão de  Bolsonaro, o Brasil aprovou o uso de 2.170 novos agrotóxicos. Desde janeiro deste ano, foram liberados mais 166. Dos produtos aprovados anteriormente, 1.056, o equivalente a 49% do total, são proibidos na União Europeia. Ou seja, estamos virando um depósito de lixo químico das grandes empresas que fabricam esses produtos.

O aumento dos agrotóxicos acompanha diretamente a expansão das lavouras de commodities. De acordo com a professora de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) Larissa Mies Bombardi, enquanto a área de cultivo de soja aumentou 53,95% entre 2010 e 2019, o uso de pesticidas cresceu 71,46% no mesmo período. A pesquisadora destaca que a área de cultivo de soja no Brasil equivale a todo o território da Alemanha.

Nossas tarefas

A luta pela terra e o agronegócio

A luta pela terra no Brasil exige três tarefas fundamentais. A primeira delas é apoiar a luta por uma reforma agrária radical, sob o controle dos trabalhadores. Do mesmo modo, é preciso avançar na demarcação de todas as Terras Indígenas e na titulação dos territórios quilombolas. A segunda tarefa é a nacionalização do agronegócio, sem indenização dos latifundiários, e revolucionar totalmente o modelo agrícola do país. Além disso, é necessário uma transformação completa na política de concessão de crédito e, consequentemente, na estrutura financeira da nação. Sem isso, torna-se inviável proporcionar ao pequeno produtor as condições necessárias para a produção. Sem nacionalizar o agronegócio, desde a grande produção até as grandes cadeias comerciais, será impossível levar o produto do pequeno produtor às cidades.

Esse programa é o que os camponeses, quilombolas e os povos originários necessitam e também os trabalhadores e a maioria do povo das cidades. Mas isso está muito longe dos objetivos do governo Lula, que segue governando para o agronegócio.