Debora Leite

Debora Leite

Dia 28 de Junho de 2019: completam-se cinco décadas desde a Revolta de Stonewall. Enquanto é verdade que esse evento não inaugurou o movimento LGBT internacional, que já dava passos antes de 1969, o exemplo de resistência daquelas travestis, drag queens, bissexuais, gays e lésbicas, em maioria negras ou imigrantes, contra a repressão policial e as humilhações que sofriam diariamente, foi um marco de luta essencial.

Para nós, Stonewall não é apenas uma data histórica, uma celebração do passado, mas uma necessidade para o presente. Diante de um governo de ultradireita como Bolsonaro no Brasil, ou Trump nos Estados Unidos, de uma crise do capitalismo que eleva as ameaças constantes à nossas condições de vida, e à nossas próprias vidas, unir os explorados e oprimidos e reviver a combatividade nas ruas é a única opção.

O que sofrem as de baixo
As diversas formas de opressão são uma presença constante no sistema capitalista – o que não quer dizer que elas não podem piorar de tempos em tempos. O que vivemos, desde a abertura da crise internacional do capitalismo de 2008, que atinge o Brasil de forma mais agravada em 2014, é uma deterioração generalizada das condições de vida e de trabalho, o que torna aspectos da LGBTfobia ainda mais brutais.

Já há tempos que o Brasil carrega o posto de líder de assassinatos de pessoas LGBTs. Entristece-nos não somente repetir esse fato ano após ano, mas perceber que a violência se intensifica: ano passado foi uma morte, por homicídio ou suicídio, a cada 20 horas – números que os órgãos do governo em geral nem se importam em contabilizar.

A violência, contudo, não aparece somente na sua forma física mais escancarada. A realidade do desemprego é gritante em todo o país, e aquelas que já são marginalizadas dentro do mercado de trabalho por sua orientação sexual ou identidade de gênero sofrem ainda mais com isso. O desespero nos empurra a aceitar cargos cada vez mais precários, dentro dos marcos da barbárie da reforma trabalhista e da generalização da terceirização dos postos.

Isso é o que sofrem as LGBTs da classe trabalhadora – as que não tem acesso aos espaços seguros de convivência e exercício da sexualidade e auto expressão, as que estão sujeitas à brutalidade da polícia nas periferias, as que não tem nada além de sua força de trabalho para vender.  As que sofrem com uma combinação cruel da exploração com a opressão – que vira lucro nos bolsos da burguesia.

Como o sofrimento vira lucro
Cada um desses ataques que sofremos embaixo, para a burguesia é simplesmente um bom negócio. A ideia de que uma pessoa é inferior por sua orientação sexual ou identidade de gênero, possibilita colocá-la em uma posição de trabalho pior, pagá-la menos e, assim, encher ainda mais o próprio bolso. A existência de milhões de desempregados garante condições de trabalho ainda mais brutais para os que estão empregados: afinal, se o trabalhador reclamar, sempre há quem o substituir.

A principal medida que querem implementar desde os últimos governos para piorar a nossa vida em nome de engordar os cofres dos empresários e banqueiros é a reforma da Previdência. Sob uma grande falácia que é o “rombo na Previdência” e a necessidade de “acabar com privilégios” de trabalhadores que não tem privilégio nenhum, querem arrancar mais um direito da mão dos trabalhadores que lutaram tanto para conquistá-lo. A aposentadoria pública passaria a ser inacessível, a previdência privada ganha espaço, e nós vamos ter que trabalhar até morrer. É uma política do imperialismo para explorar cada vez mais países como o nosso.

Se é verdade que as LGBTs da classe trabalhadora já têm muita dificuldade de conseguir emprego, ainda mais emprego formal, e ganham extremamente pouco, qual será a chance de um dia alcançarem a aposentadoria pelas novas regras que Bolsonaro quer implementar? Que dirá então sobre as travestis e transsexuais, que tem uma expectativa de vida de meros 35 anos, e jamais puderam sequer sonhar com a velhice?

A opressão serve então para aumentar a exploração em setores da classe e assim garantir o lucro dos de cima. Contudo, ela também serve para enfraquecer a classe na sua luta pelo fim da exploração. O machismo, o racismo, a xenofobia e a LGBTfobia colocam um trabalhador contra o outro, as ideologias nefastas do capitalismo são ensinadas a todos e reproduzidas diariamente, e a união que nos é tão necessária para lutar contra esse sistema se vê, então, abalada.

Quando levamos em conta esses fatores, é fácil perceber por que aqueles que governam para a burguesia sempre foram coniventes com a LGBTfobia – isso sempre fez parte de seu projeto de classe. Hoje, Bolsonaro faz de tudo para fortalecer as ideologias opressoras, com sucessivas declarações de discurso de ódio, um combate à possibilidade de se debater gênero e sexualidade nos ambientes educativos, se opondo a medidas mínimas como a criminalização da LGBTfobia (que, como sabemos, apesar de ter sido importante, pode nem mesmo sair do papel).

Reerguer as barricadas de Stonewall
O que essa realidade nos cobra: um movimento de LGBTs da classe trabalhadora, como foram a maioria das que participaram da Revolta de 1969. Mais do que isso, um movimento que não deve lutar sozinho, mas fazer parte das lutas de todos aqueles que o capitalismo explora. O fortalecimento de uma luta organizada e independente, que siga apostando na luta direta nas ruas. As palavras “retomar o espírito de Stonewall” não podem ser vazias, devem ser traduzidas em ação.

Por fim, afirmamos categoricamente: se frustrarão aqueles que confiarem que nossa libertação virá pacificamente por dentro desse sistema, das mãos das empresas “LGBT friendly” ou de governos que se escondem atrás de máscaras amigáveis e prometem aquilo que nunca darão. Apenas os trabalhadores no poder, construindo uma nova sociedade, poderão dar as bases para o fim de toda forma de opressão – se a opressão é capitalista, nossa libertação há de ser socialista.

Convidamos todas as LGBTs trabalhadoras a virem se organizar junto com a gente, para construir uma luta que vá acabar com toda opressão e exploração que sofremos cotidianamente!