O Papa Francisco estará no Brasil entre 23 e 28 deste mês. O pontífice vai participar da 26° Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que será realizado no Rio de Janeiro, esperando reunir um milhão de pessoas.

Em meios às grandes manifestações que sacudiram o país, o secretário geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, chegou a cogitar a possibilidade dos protestos comprometerem a visita do Papa. O Vaticano e o governo brasileiro, porém, descartaram a hipótese do cancelamento da visita.

Respeitamos a opção religiosa de todas as pessoas. Mas temos a obrigação de dizer que a visita do papa serve ao objetivo do governo de tentar “acalmar” os protestos e reestabilizar o país.

O papa “dos pobres”
A eleição do cardeal argentino, Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco, como líder da Igreja Católica, surpreendeu boa parte do mundo. Contudo, logo após ser eleito, a grande imprensa e o Vaticano não mediram esforços para lançar uma imensa campanha promovendo a imagem de um “papa humilde”, que descarta o luxo dos seus antecessores. A escolha de Bergoglio foi uma tentativa da Igreja Católica em construir uma imagem positiva e “renovadora”, diante do enorme desgaste a qual foi submetida devido aos escândalos de corrupção e pedofilia. Escândalos que envolveram importantes hierarcas da igreja.

No entanto, não tardaram as notícias que mostrariam a relação entre Bergoglio com a sanguinária ditadura militar argentina. O novo papa foi acusado de ter se calado perante o desaparecimento de três pessoas durante o período, sendo dois missionários jesuítas subordinados seus. Também foi acusado pelas Avós da Praça de Maio por ter se negado a denunciar o sequestro de bebês durante a ditadura. Todas essas denúncias acabaram sendo afogadas pela imagem do “papa dos pobres” construída entorno de Francisco.

Apesar das novas expectativas alentadas sobre o novo Papa, sua escolha representou a manutenção do mesmo conservadorismo do pontificado anterior de Bento XVI. Foi um novo rosto para seguir no curso da ortodoxia conservadora.

Os protestos no Brasil
Diante da delicada situação do país, em razão dos protestos, o papa Francisco disse em entrevista a uma revista que as reivindicações por maior justiça “não contradizem o Evangelho”. Para a igreja católica, “não há como ignorar que muitos dos jovens manifestantes brasileiros estarão na Jornada”. É a mesma postura do governo Dilma de “reivindicar” os protestos, por não poder fazer nada para evitá-los, mas tentar freá-los.

De fato, muitos que estiveram nas manifestações realizadas no Brasil são de católicos, praticantes ou não. Contudo, há um imenso abismo entre muitas das reivindicações levadas para as ruas com a doutrina defendida pela cúpula da Santa Sé. Um exemplo claro é a posição da igreja diante do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Em 2010, o então cardeal Bergoglio liderou uma frente conservadora contra a aprovação da união civil entre homossexuais, tido por ele como um “projeto do Diabo”. Chegou a emitir uma nota qualificando como uma “guerra de Deus” o projeto que previa que os homossexuais pudessem se casar e adotar crianças. Também não hesitou em chamar uma marcha, organizada com outras religiões evangélicas, que tinha por objetivo pressionar o Congresso argentino contra a aprovação da lei. Recentemente, reafirmou sua posição sobre o conceito de matrimônio da igreja. “Penso, antes de mais nada, na união estável do homem e da mulher”.

Nesse sentido, sua posição não difere em nada da apresentada por outra liderança religiosa brasileira, o deputado federal e pastor evangélico Marcos Feliciano. Ambos são inimigos ferrenhos do movimento LGBT que luta pelos seus direitos civis no Brasil e no Mundo. Na véspera da visita do papa, foi aprovado o chamado Estatuto do Nascituro na Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados. O projeto tem apoio de líderes religiosos evangélicos, membros da Igreja Católica, entidades espíritas e parlamentares. O projeto proíbe o aborto em caso de estupro e ainda prevê uma “bolsa estupro” para aquelas que sofreram violência sexual. O Estatuto do Nascituro significa a banalização da violênia e a criminalização das mulheres estupradas. O que o papa Francisco tem a dizer sobre isso?

Na conta do papa
A visita do papa Francisco ao Brasil vai custar, segundo a grande imprensa, mais de R$ 118 milhões. Só o governo federal gastará R$ 111,5 milhões com os chamados investimentos indiretos. O restante será custeado pelos governos estaduais e prefeituras.

Além disso, a visita do papa vai ter o inusitado patrocínio de empresas privadas. Segundo a Igreja Católica, até o momento, já foram injetados R$ 20 milhões no evento, em que estão incluídos a contribuição de patrocinadores e eventos de arrecadação em prol da Jornada. Bradesco, Itaú, Santander, Ferrero, Estácio, Nestlé, Mc Donald’s e as agências TAM Viagens e Havas estão entre as patrocinadoras da visita do pontífice.

Os gastos públicos com a visita, a influência da igreja sobre as questões políticas são demonstrações dos limites do “Estado Laico” instituído no país. Está claro que as instituições “republicanas” e os partidos da burguesia estão carregados por doutrinas e preconceitos religiosos.

A visita do papa também será uma boa oportunidade para desviar a atenção da população sobre os graves problemas que o país enfrenta. Muitos políticos, governos e empresários corruptos realizarão verdadeiras peregrinações para tomar “a benção” do novo papa. Todos aproveitarão a oportunidade para melhorar sua imagem.

Para além das fotos e os gestos piedosos para “os pobres e oprimidos”, a Igreja, como faz há mais de dois mil anos, estará fazendo o que sempre soube fazer: defender o sistema que está a serviço dos ricos e poderosos.

O “papa dos pobres” vem ao Brasil em sua primeira grande missão política. Vem tentar ajudar o desgastado governo brasileiro a acabar com a onda de protestos que sacode o país.

Publicado no Opinião Socialista 463