Fabiana Wolf, de São Paulo (SP)

Neste 1º de junho, o icônico álbum dos Beatles completa 50 anos

O Sgt. Peppers é o álbum que mais influenciou a história da música no mundo. A psicodelia com uma sonoridade mais madura do que nos álbuns anteriores dos Beatles foi o instante decisivo para a carreira do Fab Four, permanecendo por 27 semanas no ranking da lista de sucessos do Reino Unido e abrindo um período lisérgico com o Verão do Amor, a Swing London, a beat generation, a pop art, o movimento Hippie norte-americano e as movimentações pacifistas contrárias à guerra do Vietnã. O álbum dialoga com todas essas tendências.

A primeira impressão adquirida é com a emblemática capa que, além das 61 figuras de diversas áreas, tem um cenário também chamativo, muitas cores e um jardim que remete ao norte da Inglaterra, ambiente que se repete constantemente nas letras.
A arte, assinada pelo artista plástico Peter Blake, sofreu uma metamorfose em relação à ideia anterior, que era dos Beatles reverenciarem seus ídolos; na versão final eles que foram o centro, os homenageados.

A proposta de Paul McCartney, que fora idealizador da capa e do título, era de que a banda se transformasse em outro grupo, a Banda do Sargento Pimenta e o clube dos corações solitários, com seus trajes de militares carnavalescos e novos instrumentos às mãos dos integrantes, estando à linha de frente de personalidades como Karl Marx, Edgar Allan Poe, Lewis Carroll, Aldous Huxley e Bob Dylan.

O enterro do Conde de Orgaz, El Greco 1587

A inspiração da capa mais copiada do mundo veio da tela O enterro do conde de Orgaz de 1587, obra fundamental de El Greco que é por muitos críticos considerada “a obra fundamental de toda a pintura” por conter, assim como a imagem do disco, divisões de hierarquia em seu espaço. Possui parte terreal, personagens de primeira fila, fila de cavaleiros e parte celestial. Mostra as duas dimensões da existência humana: a morte embaixo e a vida em cima. O que representa toda a mudança do conteúdo de letras e melodias que o quarteto veio a aprofundar desde então; a morte da banda que nasce para servir a indústria abre espaço às músicas melancólicas, provocadoras, filosóficas. E os quatro garotos jovens e ingênuos dão espaço a homens maduros, que viriam a criticar o sistema que estavam inseridos.

As faixas abrem um novo conceito na música e são gravadas na sequência perfeita. O álbum tem uma singularidade nesse quesito: tudo se compõe, nada pode ser excluído ou ouvido fora da ordem que os músicos propõem. Em vez das menos de 24h usadas como tempo de gravação do primeiro álbum Please Please me, o Sgt. Peppers levou cerca de 700h para sua finalização de captação sonora, essa diferença mostra na prática a evolução do cuidado na arte final que os Beatles adquiram 6 anos após sua formação, que os levou de reis do ié-ié-ié a grandes músicos reconhecidos mundialmente não mais como uma boy band, mas como artistas consagrados.

A ruptura de barreiras com os instrumentos mais comumente usados no Rock n’ Roll é de uma ousadia tremenda, dessa vez os Beatles se aproximam da música erudita e também da eletrônica, experimentalismo proveniente de experiências com drogas lisérgicas que posteriormente os levariam à viagem à Índia pós a finalização do álbum. O sgt. Peppers não mudou o mundo, mas mostrou como o mundo estava mudando.

A músicas vão da infância à vida adulta, de Liverpool ao mundo, da inocência à tristeza e apatia. Lucy in the Sky with Diamonds, para além da referência ao LSD, foi inspirada em um desenho de Julian, filho de John. O álbum oscila entre o peso e a leveza, a exemplo da passagem de She’s leaving home, música melancólica de despedida, para Being for the Benefit of Mr. Kite que é circense em letra e melodia; dando início depois à sombria e mística Within you without you de George Harrison, com grande influência do existencialismo e de sua viagem à Índia, que ocorrera já nessa época, antes dos outros integrantes da banda.

Após a faixa vem When I’m sixty-four, composição alegre de Paul McCartney para o aniversário de 64 anos de seu pai. Depois de algumas outras faixas, passando também pela reprise remixada de Sgt Peppers, o álbum finaliza com a obra prima dos Beatles A day in the life, da dupla Lennon-McCartney, que conta com uma enorme orquestra e picos de tensão na melodia. É inspirada nos fatos cotidianos recortados no jornal e na sensação contraditória em torno deles; a ideia inicial partiu de Lennon, a partir da manchete do Daily Mail que viria a ser a primeira frase da letra “I head the News today, oh boy, 4000 holes in Blackburn, Lancashire”

A música tensa, a orquestra, os picos, a sensação de infinito e a volta ao mundo real cantada por Paul no meio tornam A day in the life a música ideal para fechar com maestria o álbum que mais influenciaria a arte, a vida e o comportamento das gerações que seguiriam.

 

We’re Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, we hope you enjoy the show.