Encontro elege coordenação e tira plano de mobilização. Luta por creche será iniciadaO sábado amanheceu chuvoso. Era um dos famosos dias de faxina para grande parte das mulheres, que encaram a tripla jornada e nos finais de semana não costumam ter descanso. Ainda assim, no último dia 28, o salão do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos ficou lotado de mulheres que participaram do 1º Encontro de Trabalhadoras do Vale do Paraíba.
Metalúrgicas, professoras, trabalhadoras dos Correios, do comércio, da alimentação, aposentadas, servidoras públicas e da ocupação Pinheirinho. Cerca de 70 trabalhadoras de diversas categorias passaram um dia todo debatendo a situação de opressão e exploração à qual as mulheres são submetidas no capitalismo e, o mais importante, discutindo formas de se organizar e lutar por suas reivindicações.
Nas falas, os exemplos e a constatação de que a opressão e a exploração capitalista penalizam a trabalhadora no seu dia-a-dia, seja nos salários mais baixos, nos trabalhos mais precarizados, no assédio moral e sexual, na violência doméstica ou no machismo que impera na sociedade. Mais do que isso, a constatação da necessidade de organização.
Acorda, Raimundo!
A mesa de abertura do evento contou com representantes da Conlutas do Vale do Paraíba, do GT de Mulheres da Conlutas, do PSTU e PSOL e deu início ao encontro com debates sobre conjuntura e a opressão no capitalismo.
Ainda pela manhã, as companheiras assistiram ao filme Acorda, Raimundo. O filme provocou risos nas companheiras diante da situação de um homem, que num sonho, faz o papel de uma mulher e vive oprimido. Mas todas também puderam perceber o machismo que oprime as mulheres na sociedade atual.
Gostei muito do filme porque mostra a realidade da mulher, disse Maria, uma das trabalhadoras metalúrgicas presentes. Abre a cabeça da gente. Na maioria das vezes, a mulher se culpa de tudo, não reivindica seus direitos. Mas isso é porque colocam na cabeça da gente, desde cedo, que mulher não pode fazer isso ou deve fazer aquilo, opinou.
Até mesmo o caso da aluna da Uniban, Geyse Arruda, que foi hostilizada apenas por ter ido à faculdade com um vestido curto foi tema de discussão. Na época cheguei a achar exagero o que tinham feito com a menina, mas também achei que ela estava errada. Agora, percebo que a sociedade é que impõe regras à mulher e discrimina. A Geyse não fez nada demais, falou Maria.
Uma questão de classe
Outra discussão feita no encontro foi o fato de que ser mulher não coloca todas as mulheres na mesma luta. Afinal, a classe social a qual pertencem é determinante.
A mulher burguesa, rica, apesar de estar sujeita ao machismo tem muito mais condições de se livrar dessa opressão. Mais do que isso. A mulher que faz parte da burguesia não tem a mínima intenção de acabar com a sociedade capitalista, que se aproveita da opressão para manter a exploração. Ao contrário, está do lado dos patrões para explorar e também oprimir a mulher trabalhadora, explicou Ana Rosa Minutti, da secretaria de mulheres do PSTU.
Nesse contexto, inclusive, foi discutida a eleição presidencial em 2010, que conta com duas pré-candidaturas da burguesia, cujo apelo é o fato de serem mulheres. No caso, Dilma Rossef e Marina Silva.
Dilma e Marina, entretanto, não estão do lado da classe trabalhadora. Ao contrário, estão a serviço de um projeto aplicado pelo governo Lula que beneficia apenas os patrões e grandes latifundiários, um projeto que mantém esta sociedade capitalista, que oprime e explora as trabalhadoras, afirmou Ana Pagamunici, da Conlutas.
À tarde, em grupos, as participantes puderam falar sobre o dia-a-dia, a realidade no trabalho, em casa, na escola, suas dificuldades e necessidades.
Selma (*), uma ex-trabalhadora da Embraer, contou os muitos desafios que teve de enfrentar durante seis anos na fabricante de aviões. A mulher tem que lutar muito para conseguir entrar numa fábrica, mas mais difícil é permanecer, disse. A mulher é vista com um nada. Entramos com o preconceito de que mulher não sabe fazer avião e, mesmo fazendo o mesmo que os homens, temos de provar constantemente nossa capacidade profissional e intelectual, relatou.
A violência contra a mulher também foi temas dos grupos e a experiência das mulheres do Pinheirinho foi vista como um grande exemplo. No acampamento, que já teve vários casos de violência, as mulheres se uniram e criaram uma regra. Homem que bate em mulher é expulso da ocupação. Mulher não é capacho de homem. Não admitimos violência e resolvemos tudo de forma coletiva, explicou uma das companheiras.
Lugar de mulher é na luta!
A representante do Grupo de Trabalho de Mulheres da Conlutas, Janaína Rodrigues, ressaltou a necessidade de as mulheres resistirem e combaterem a opressão e a exploração. Lugar de mulher é na luta e não no tanque ou no fogão como prega o machismo. Nós somos as protagonistas na luta pela nossa libertação, disse ela.
Somente com a luta das mulheres junto à classe trabalhadora e, portanto, juntamente com os homens trabalhadores, é possível combater o machismo e derrotar a exploração capitalista, afirmou.
E foi para levar à frente a luta em defesa das reivindicações imediatas e históricas das mulheres trabalhadoras que as participantes lançaram oficialmente no Vale do Paraíba o Movimento Mulheres em Luta e aprovaram um plano de mobilização para o próximo período, numa grande vitória para as trabalhadoras da região.
O encontro votou a criação de uma coordenação e elegeu uma Executiva do Movimento para organizar e encaminhar as lutas das trabalhadoras, em questões como creche, licença-maternidade de seis meses obrigatória, contra a violência doméstica, por salário igual para trabalho igual e o combate aos assédios moral e sexual no trabalho.
A organização de uma ampla campanha de luta por creches na região, para exigir que patrões e governos garantam todas as creches e vagas necessárias e atendam a totalidade da demanda existente foi uma das principais resoluções. O objetivo é começar o movimento, com realização de assembléias e mobilização nas fábricas metalúrgicas da Zona Sul, região onde os patrões da Assecre (Associação dos Empresários das Chácaras Reunidas) querem reduzir o auxílio- creche de 18 para 16 meses.
O movimento Mulheres em Luta nasceu como uma alternativa de organização para as trabalhadoras, diante do abandono pela maioria das atuais organizações feministas que limitaram sua luta dentro dos limites capitalistas e passaram a defender o governo Lula, resume a diretora do Sindicato dos Metalúrgicos de São José, Rosangela Calzavara.
Vamos avançar na construção de um movimento feminista, classista e de luta pelas reivindicações das trabalhadoras e contra o machismo e a exploração capitalista, afirmou.
Resoluções