Jagunços deixam rastro de destruição no acampamento do MSTUm dia depois da Justiça do Pará condenar o coronel Mário Pantoja e o major José Maria Oliveira pelas mortes de 19 sem-terra e ferimento em outros 69, em Eldorado dos Carajás, em abril de 1996, cinco sem-terra foram fuzilados e 20 foram feridos por pistoleiros, no último dia 20, na cidade de Felisburgo (MG), Vale do Jequitinhonha, uma das regiões mais pobres do país.

Os jagunços ainda deixaram um rastro de destruição no acampamento “Terra Prometida”, queimando dezenas de barracas, inclusive a que abrigava a escola, das 140 famílias que ocupam a área desde 2002.

A proximidade das datas não é a única coisa que relaciona os dois episódios. Assassinatos absurdos como o de Felisburgo, são possíveis devido à própria história de Carajás, Corumbiara e tantos outros episódios marcados pela impunidade ou pela cumplicidade de uma Justiça a serviço dos poderosos.

Ao invés de simplesmente festejarmos a prisão dos dois militares, é preciso lembrar que os 124 sargentos, cabos e soldados que promoveram o massacre foram novamente absolvidos. E mais: Pantoja e Oliveira estavam há quase dez anos em liberdade, aproveitando-se de uma decisão da Justiça, que não só anulou uma sentença anterior, como decretou que os dois poderiam aguardar um novo julgamento em liberdade.

O governo tem culpa
Se em 1996 era consenso que tanto o governo estadual quanto o governo federal tinham sua responsabilidade pela chacina em Carajás, hoje há quem tenha “dúvidas” sobre isso. Algo que não temos. Lula e seu governo, assim como o governador mineiro Aécio Neves (PSDB), também são culpados pelas mortes de Felisburgo.
A começar por não realizarem, nem de longe, a reforma agrária que prometeram ao povo. São culpados também porque são coniventes com a impunidade que cerca o latifúndio, estimulando a ação assassina de fazendeiros como Adriano Chafic e seu primo, o ex-policial civil, os mandantes do massacre de Felisburgo, foragidos desde sábado.

Agora que a tragédia aconteceu, os ministros Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) e Nilmário Miranda (Direitos Humanos), não cansaram de qualificar o episódio de “crime hediondo”, “brutalidade” etc. Mas eles não podem omitir dois fatos que evidenciam que tanto o governo federal quanto o estadual contribuíram para que o crime ocorresse.

Em primeiro lugar, a fazenda em que os sem-terra estavam é uma área de terra devoluta, ou seja, de terras públicas invadidas ilegalmente pelo fazendeiro e que já deveriam ter sido retomadas pelo Estado, para efeito da reforma agrária. Diante desta situação e da cobrança feita pelo Movimento Sem-Terra (MST), sobre a lentidão do processo, Rossetto não poderia ter dado uma resposta mais cínica para fugir de sua responsabilidade: “Não estamos tratando aqui de questões fundiárias. Me parece um caso de segurança pública”.

Uma declaração não só vergonhosa, como falsa. Porque se tomarmos a segurança pública como critério para analisar o massacre, a evidência de cumplicidade do Estado e da “Justiça” é ainda maior, já que pelo menos dois dos sem-terra assassinados haviam requisitado proteção policial há mais de dois anos devido às constantes ameaças de morte feitas pelo latifundiário grileiro e absolutamente nada foi feito.

Foi essa cumplicidade e a certeza da impunidade que fez Chafic contratar 20 pistoleiros para atirar contra as 200 pessoas que estavam no acampamento.

MST deve romper com este governo

Em nota divulgada à imprensa, as coordenações estaduais do MST e da Pastoral da Terra relacionam o massacre à “opção dos governos federal e estadual pelo agronegócio para conseguir a ‘governabilidade’ com o apoio da bancada ruralista, no Congresso Federal”.
Nada mais correto. Contudo, para ser conseqüente com sua própria avaliação, o MST e as demais entidades que lutam pela terra, deveriam reavaliar sua postura diante do governo, pois apesar das críticas pontuais, o MST, em particular, dá apoio quase que incondicional a Lula.

É no mínimo uma incoerência, por exemplo, que a entidade tenha assinado recentemente um protocolo em defesa da reforma Universitária e que, neste exato momento (e até o dia 25), o MST esteja participando da Conferência Nacional de Terra e Água, com a finalidade de discutir “os modelos de desenvolvimento para o campo defendido pelo governo Lula”.

O modelo adotado pelo governo tem nome: chama-se latifúndio e suas conseqüências são massacres como os de Felisburgo.

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