Renato Moura/A Voz das Comunidades
Jerônimo Castro, do Rio de Janeiro (RJ)

Pouco mais de um ano depois da chacina do Jacarezinho, mais um massacre em uma comunidade do Rio de Janeiro. Em um tiroteio que durou das 4 da manhã até às 16 horas, pelo menos 25 pessoas morreram, e um número ainda não determinado ficou ferida em uma das mais violentas operações policiais da história de um estado cheio de ações policiais violentas. Além dos mortos e feridos, 50 escolas ficaram sem funcionamento, bem como postos de saúde e o comércio local ficaram fechado.

Uma ação criminosa e que matou inocentes

Segundo a polícia, a operação era preparada há meses contra uma facção criminosa que controla 58% do estado e que estaria operando na região. A Polícia Rodoviária Federal se envolveu na ação porque, segundo eles, a referida facção também estaria envolvida nos muitos roubos de cargas que acontecem no estado.

A operação foi tão catastrófica que a própria declaração da PM diz que “não é possível considerar exitosa uma operação com resultado morte (sic) (…)”.

A questão, no entanto, é mais profunda, porque não se trata de não poder ser considerada “exitosa”, mas sim de um completo descalabro. A própria polícia reconhece que foi surpreendida pelo suposto poder de fogo e resistência que encontrou no local. Além disso, que teria tido dificuldade para se locomover, pois haveria barricadas de cimento nas ruas. A operação contou com carros e helicópteros blindados em uma região onde vivem mais de 200 mil pessoas.

Claudio Castro e Bolsonaro comemoram e justificam o massacre

Claudio Castro justificou a ação da polícia amparado na lógica da guerra e do território a ser conquistado. O governador do Rio de Janeiro colocou a responsabilidade na violência perpetrada nos mortos e na existência de criminosos na região.

Bolsonaro foi ainda mais longe e parabenizou os “guerreiros” pela operação. Ou seja, tripudiou sobre o cadáver de 25 pessoas mortas sem demonstrar, uma vez mais, o menor signo de reflexão diante de um desastre dessa magnitude.

A polícia declarou que todos os mortos seriam criminosos. (com exceção de Gabriela, morta dentro de casa). Acontece que, dos 18 nomes apresentados pela polícia, 12 não tem qualquer passagem policial. Ou seja, sequer eram procurados ou acusados pela polícia. Muito menos tinham sido condenados. Sem contar que não existe pena de morte no Brasil.

Pelo fim das operações policiais nas comunidades

A operação policial feita na Vila Cruzeiro não combate o tráfico de drogas ou a criminalidade. São décadas de operações deste tipo que não reduzem um só índice de criminalidade, só aumenta o número de mortos.

O que mostra também que não é um acidente de percurso. É uma política consciente. Claudio Castro e Bolsonaro a fizeram porque sabem que fideliza um setor de sua base cada vez que fazem jorrar sangue.

Mas eles não são os únicos responsáveis por chacinas como essa. Essa tradição vem de longe. O sentimento de impunidade que reina, em especial entre os altos oficiais das polícias e Forças Armadas, vem do fato de que eles nunca foram punidos por seus crimes.

O Brasil é dominado por torturadores e assassinos desde sempre. Não ter acertado contas com nosso passado, seja da ditadura militar ou do papel nefasto dos capitães do mato na época da escravidão, projeta no nosso futuro horrores como esse, naturalizados e utilizados por essa elite, que finge repugnância quando são obrigados a ver os resultados de sua dominação.

Pelo fim da guerra às drogas

Ao mesmo tempo, essa máquina assassina se alimenta cotidianamente pela hipocrisia da guerra as drogas, cujo único resultado é alimentar uma cultura de militarização das comunidades.

É hipócrita porque, sequer se dá ao trabalho óbvio de buscar os verdadeiros chefes do tráfico. Um controle minimamente sério das grandes operações bancárias permitiria prender muito mais narcotraficantes em um dia que todas as operações policiais já feitas e por fazer no nosso país. Além, claro, de evidenciar quem são os que verdadeiramente lucram com o tráfico de drogas, e com os grandes negócios ilegais desse país.

Pior, as experiências feitas mundo afora mostram que a descriminalização das drogas é mais barata e eficaz para resolver o suposto problema. Nos países onde houve descriminalização das drogas não houve aumento do consumo, nem de crimes relacionados ao consumo de drogas.

A chamada guerra às drogas tem sido, na verdade, uma desculpa bastante esfarrapada para manter um aparato policial permanente, em ação contra os setores mais empobrecidos de nossa população, onde nem mesmo o parco “Estado de Direito” vale.