Bombeiros trabalham na remoção de três corpos de dentro de um táxi soterrado na Avenida Carlos Peixoto, em Botafogo Fernando Frazão/Agência Brasil Brasília-DF
Dyrlei Santos, do Rio de Janeiro (RJ)

Dirley Santos

Até o momento, foram registradas dez vítimas fatais após o temporal que atingiu a cidade do Rio de Janeiro na noite desta segunda-feira, 8 de abril. São elas:

Leme, na Zona Sul
Júlia Neves Aché, de apenas 6 anos (morreu ao lado da vó e do motorista do táxi, soterrados)

Lucia Xavier Sannento Neves (avó de Júlia, que a levara em uma festa de aniversário)

Marcelo Tavares Marcelino (taxista que transportava Lúca Xavier e sua neta Júlia)

Morra da Babilônia, comunidade da Zona Sul
As irmãs Doralice e Gerlaine do Nascimento, de 55 e 53 anos respectivamente (soterradas na própira casa)

Gilson Cesar Serqueiro dos Santos (vizinho, morreu tentado ajudar as irmãs)

Favela de Antares (bairro de Santa Cruz), na Zona Oeste
Reginaldo da Silva morreu afogado (tentando salvar móveis da sua casa)

Gávea, na Zona Sul
Guilherme Nascimento de Pontes, 30 anos (depois de cair de uma moto, foi arrastado pelas águas e encontrado debaixo de um carro)

Santa Cruz (comunidade do Cesarão), na Zona Oeste
Leandro Ramos Pereira, de 40 anos (eletrocutado em casa)

Jardim Maravilha (bairro de Campo Grande), na Zona Oeste
Um homem recolhido de uma enchente, ainda não identificado.

Dez vidas perdidas. Dez mortes absurdas.

Mortes que poderiam ter sido evitadas. Não fossem a irresponsabilidade e o descaso com que as autoridades públicas tratam a população trabalhadora da cidade e do estado. Em especial a prefeitura do Rio na pessoa do prefeito Marcelo Crivella (PRB), mas não só ele.

Irresponsabilidade e descaso que atingem principalmente trabalhadores e o povo mais pobre das periferias e comunidades.

O Rio registrou, nas últimas 24 horas, a pior chuva dos últimos 22 anos, segundo dados do Sistema Alerta Rio, da prefeitura. Uma chuva mais forte do que ocorreu nos dias 6 e 7 de fevereiro, quando sete pessoas morreram, fez com que o município entrasse em “estágio de crise” – o mais alto em uma escala de três, segundo o Alerta Rio. O Rio entrou em estágio de crise às 20h55 de segunda-feira.

Na Zona Sul da cidade, ficam alguns dos bairros mais afetados pelo forte temporal. Até barco os bombeiros tiveram que usar para resgatar crianças no Jardim Botânico. Mas também na Zona Oeste muitas localidades foram atingidas.

A recomendação foi para que as pessoas não saíssem de onde estavam (casa, local de trabalho, escolas etc.) evitando deslocamentos pela cidade que estava com o trânsito caótico.

Ainda no início da manhã, a prefeitura e o governo do estado determinaram a suspensão das aulas nas escolas das redes públicas. Escolas privadas e universidades públicas e particulares, também suspenderam o dia letivo. Mas nas escolas da rede municipal a prefeitura determinou inicialmente a permanência de professores e funcionários dentro das unidades mesmo sem alunos.

O Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil divulgaram ter recebido mais de 2 mil chamados de ocorrências. Quase o dobro da média diária normal.

De acordo com a Light, somente na noite dessa segunda-feira, cerca 80 mil usuários foram afetados em seu fornecimento de energia elétrica. Durante a terça-feira (9), Dez mil residências e estabelecimentos ainda permaneciam sem luz.

Segundo a concessionária do serviço público, o corte no fornecimento é ocasionado principalmente devido à queda de árvores sobre a rede e deslizamentos de terra. Novamente, assim como em fevereiro, quedas de barreira interditaram o Alto da Boa Vista e a Avenida Niemeyer (onde mais um trecho da ciclovia Tim Maia desabou).

Novamente problemas com as sirenes
As sirenes, tidas como principal instrumento da frágil política de prevenção da prefeitura, novamente não funcionaram como deveriam.

Moradores do Morro da Babilônia, e de outras comunidades também, denunciaram que as sirenes da Defesa Civil não tocaram para avisar da entrada no estágio de crise e do risco iminente de deslizamentos.

Realmente poderia ter sido evitado, como disse Ingrid Araújo, filha e sobrinha das vítimas do deslizamento no Morro da Babilônia, no Leme, na Zona Sul do Rio. Agora Ingrid pede justiça para sua e para outras famílias que moram em área de risco e que, segundo ela, são tratadas com descaso.

Segundo Crivella, as sirenes não foram acionadas no Morro da Babilônia porque choveu exatos 39 milímetros em uma hora – um pouco abaixo do índice de 45 milímetros! O próprio prefeito teve de admitir que houve falha de planejamento e que os órgãos da prefeitura não foram prudentes com relação aos protocolos para diminuir impacto das chuvas nas áreas mais atingidas.

Parece que somente depois de mais esta tragédia é que Crivella entendeu a necessidade de ter reboques, pessoal da conservação, da Rio Águas e da Comlurb de plantão nas áreas mais críticas.

Contudo, apresentou como solução imediata apenas medidas pontuais, como a revisão do índice mínimo de chuva para o acionamento das sirenes, e que pretende negociar com o Jockey Club um espaço para a construção de galerias pluviométricas na região do Jardim Botânico.

Enquanto isso, órgãos essenciais nestas situações, como a Secretaria de Conservação, não possuem pessoal suficiente para prevenir ou atender as ocorrências. Pois a prefeitura não tem funcionários próprios, já que os serviços são terceirizados para seis empresas privadas. Pasmem, os trabalhadores terceirizados somente são mobilizados no momento das ocorrências. O que provoca atrasos ou mesmo impossibilidade de atendimento.

A difícil volta para casa
Chuva forte. Ruas alagadas. Vias interditadas. Trânsito totalmente parado.

O temporal provocou desde bloqueios parciais de vias importantes da cidade, por causa de alagamentos, até deslizamentos de terra, e que resultaram em vítimas fatais.

O retorno para casa na noite de segunda-feira (8) foi complicado para os trabalhadores cariocas. Teve gente que mesmo saindo do trabalho entre 17 e 18 horas, somente conseguiu chegar em sua residência por volta de meia-noite. Após seis longas e angustiantes horas de uma verdadeira epopéia.

Para não enfrentar a água pela cintura ou perigosas enxurradas, as pessoas buscaram se refugiar em locais seguros, como lojas, bares e estações de Metrô e BRT. Sem saber quanto tempo teriam de esperar ou o que fazer para chegar em casa, somente contando com a ajuda e solidariedade de desconhecidos que como eles sofriam a mesma situação.

Motoqueiros e pedestres auxiliando pessoas que estavam ilhadas dentro de ônibus ou em cima de carros; lojistas, donos e atendentes de bares abrindo seu comércio para que gente se refugiasse ali, trabalhadores comuns emprestando seu celular para que outros fizessem ligações para familiares etc.

Se não podem contar com os agentes públicos, os trabalhadores do Rio de Janeiro já sabem que só podem contar com a solidariedade comum entre eles. Pois, se depender de seus governantes, suas vidas, as de seus familiares, vizinhos e colegas de trabalho estarão em risco.

A previsão é de que a chuva perca força. Mas não há nenhuma garantia de que não volte a chover forte ao longo da semana. Felizmente nesta terça-feira (9) Metrô, trens e BRT funcionavam dentro da normalidade e o trânsito fluía apesar dos transtornos, e a maioria conseguiu chegar em seu lar sem maiores problemas.

Impeachment ou renúncia
Além de não ter vontade política para resolver esta situação, Crivella tenta “dividir” a responsabilidade com outros. Por exemplo, reclama da falta de recursos e apoio através do pacto federativo para viabilizar projetos que possam amenizar os problemas causados pelas fortes chuvas.

Também culpou a Companhia de Estado de Água e Esgoto (Cedae) de jogar dejetos e assim provocar alagamentos no sistema pluvial da cidade (com certeza defende a privatização da empresa).

A Cedae respondeu que o prefeito mente ao afirmar tal coisa já que, de acordo com a companhia, as redes de abastecimento de água e de coleta de esgoto da Cedae não têm nenhuma relação com o sistema de drenagem de águas das chuvas, que são de competência exclusiva do município.

Já o governador Wilson Witzel (PSL), como fez na ocasião da tragédia de fevereiro, prefere se omitir a assumir as responsabilidades do governo estadual.

Por isso o PSTU propõe um programa emergencial:

– Executar já um plano de obras públicas para prevenir novos deslizamentos, limpeza e canalização de rios e córregos e obras de escoamentos das chuvas.

– Construir moradias populares com investimento maciço em saneamento básico em quantidade suficiente para combater o déficit habitacional e a especulação imobiliária, garantindo moradias dignas, seguras e gratuitas para os trabalhadores.

– Abrir os hotéis das regiões em que haja desabrigados para acolhê-los enquanto não tiverem uma moradia segura.

– Repudiar a criminalização da pobreza. Os moradores das áreas de risco não são os responsáveis pelos deslizamentos e nem moram em despenhadeiros porque gostam. Com um salário mínimo de fome, é impossível morar em local digno e seguro.

– Que os políticos responsáveis pela aplicação das verbas na prevenção de acidentes naturais, coletas de lixo e saneamento básico que não o fizeram devem ser responsabilizados pela tragédia e presos.