Redação

 

Para mobilizar em seu favor, o governo Dilma e seus defensores têm convocado mobilizações em “defesa do Estado Democrático de Direito”. Incluem-se aí CUT, UNE e também parlamentares do PSOL. Mesmo organizações de esquerda e ativistas que reivindicam a luta por uma sociedade socialista têm levantado esse argumento. Com esse apelo democrático, o governo tenta sensibilizar mesmo aqueles que têm inúmeras críticas ao PT e a seus governos, mas que acabam caindo na armadilha do “fica Dilma”.

A verdade, porém, é que não existe nenhum golpe em curso no país que possa ameaçar o tal “Estado de Direito”. Também não se deve confundir a defesa das poucas liberdades democráticas que os trabalhadores têm (liberdade de sindicalização, de expressão, direito  a greve etc.) com a defesa do Estado. Por isso, causa muito espanto ver organizações de esquerda defendendo o “Estado de Direito”, uma vez que, historicamente, os socialistas revolucionários nunca tiveram essa posição. Ao contrário, sempre denunciaram o Estado como um instrumento da classe dominante para explorar os trabalhadores e o povo pobre.

O que é o Estado?
De acordo com Karl Marx e Friedrich Engels, o surgimento do Estado na história foi o reconhecimento de que existem contradições e conflitos entre classes sociais insolúveis no interior da sociedade. Para eles, o Estado surgiu para que essas contradições não destruam as classes sociais com interesses conflitantes. Por isso, foi preciso construir um poder aparentemente situado acima da sociedade para moderar o conflito e mantê-lo nos limites da ordem. Esse poder, aparentemente independente, é o Estado.

O Estado seria, então, um instrumento de dominação de uma classe social sobre outras subalternas. Na Roma antiga, por exemplo, foi um instrumento de dominação dos patrícios contra plebeus e escravos. No feudalismo, assegurou o domínio dos senhores de terras sobre os camponeses. No mundo atual, o Estado é o instrumento para os capitalistas, donos das fábricas e dos bancos, explorarem os trabalhadores. O Estado garante à burguesia a propriedade privada dos meios de produção e as leis que permitem aos patrões explorarem os trabalhadores.

No passado, essa compreensão era bastante comum na esquerda brasileira. Foi por isso que o PT chegou a votar contra o texto da Constituinte, em 1988. Lula, então deputado federal constituinte, explicou a posição: “O Partido dos Trabalhadores vem aqui dizer que vai votar contra esse texto, exatamente porque entende que, mesmo havendo avanços na Constituinte, a essência do poder, a essência da propriedade privada, a essência do poder dos militares continua intacta nesta Constituinte”.


Rafael Braga preso em 2013 por estar com  uma garrafa de Pinho Sol próximo a uma manifestação

Liberdade e igualdade para poucos
Para manter seu domínio, o Estado burguês se utiliza de dois instrumentos. Um deles é o poder de coação pelas Forças Armadas e pela polícia. Se algo ameaçar os interesses da burguesia, como uma greve ou uma insurreição popular, o Estado mobiliza seu aparato de repressão. Do mesmo modo, a existência desse aparato garante a aplicação das leis e da justiça.

Outro instrumento de dominação é a ideia ilusória de que o Estado seria o representante do bem comum. Assim, os interesses da burguesia são disfarçados por uma ideologia de interesse geral. Ideias como justiça, direitos iguais e liberdade são apresentadas como se tivessem um caráter independente de qualquer classe social. Mesmo a ideia de que existe o “Estado Democrático de Direito” é uma ficção, assim como a noção de que todos são iguais perante a lei, uma vez que o capitalismo só pode existir com base na exploração e na desigualdade social.

Quando o juiz Sérgio Moro decretou a condução coercitiva de Lula, uma medida claramente arbitrária, a CUT e a UNE chamaram milhares às ruas em defesa do “Estado Democrático de Direito”. No entanto, não se vê a mesma comoção quando a polícia entra nas favelas e mata jovens negros e crianças inocentes. Hoje, 45% da população carcerária do país (a maioria negros) é formada por prisões preventivas. Ou seja, o Estado viola sistematicamente os direitos do povo pobre e trabalhador com torturas e assassinatos. Porém isso não é motivo para que os defensores do “Estado Democrático de Direito” convoquem protestos de ruas.