Primeira convenção da Convergência Socialista (São Paulo, agosto de 1978)
Bernardo Cerdeira, de São Paulo (SP)

Empurrado para a abertura política, a ditadura decide por aniquilar as organizações do movimento operário que poderiam florescer durante a chamada ?distenção? democrática. Dentre elas, a Liga Operária, futura Convergência Socialista, uma organização socialista que nasceu em 1973, ligada à IV Internacional.Nas vésperas do primeiro de maio de 1977, ativistas sindicais e militantes são presos distribuindo panfletos. Todos foram barbaramente torturados e depois processados pela Justiça Militar, enquadrados na famigerada Lei de Segurança Nacional (LSN). Incomunicáveis, corriam risco de morte nas mãos da polícia que até então não reconhecia as prisões.

A Liga Operária (LO) buscou apoio no movimento de massas, especialmente no movimento estudantil. A resposta dos estudantes foi imediata. Emerge então uma campanha de calúnias contra a LO. O odioso delegado Sergio Paranhos Fleury acusa a organização de “atuar na luta armada” e de praticar “justiçamento”. O secretário de Segurança de São Paulo, coronel Erasmo Dias, assegurava que as prisões eram o início da “devassa no mundo da subversão.

Convergência Socialista
Em janeiro de 1978, na PUC-SP, a LO lançou o Movimento Convergência Socialista (MCS) que tinha como objetivo fundar um Partido Socialista legal. O movimento era apoiado pelo jornal Versus que publicava um folheto, Versus Especial – A Palavra da Convergência Socialista.

Em agosto, com o objetivo de discutir o programa e lançar o Partido, realiza-se a primeira convenção nacional do MCS que reune mais de 300 delegados, de oito estados e 1.200 presentes.

Dois dias depois, os órgãos de repressão abortam este processo. O operativo vinha sendo preparado há um ano pelos órgãos repressivos e tinha o nome de Operação Lótus que resultou na prisão de militantes, membros do Comitê Central e dirigentes internacionais. Entre eles Nahuel Moreno que corria um grave perigo. A Argentina vivia sob uma ditadura genocida, que chegaria a massacrar mais de 30 mil militantes políticos. Moreno, conhecido dirigente socialista, estava exilado na Colômbia. Se fosse deportado para a Argentina seria certamente assassinado.

Os presos iniciaram uma greve de fome para exigir que ele fosse enviado de novo à Colômbia e a libertação de todos. A greve foi seguida por militantes da CS instalados no DCE da PUC-SP e na Arquidiocese de Nova Iguaçu. A greve durou 14 dias e se deu junto com uma enorme campanha internacional. Contou com pronunciamentos dos parlamentos nacionais da Espanha e de Portugal, e com mensagens pela libertação como do escritor Gabriel García Márquez.

Um mês depois da prisão, Moreno foi expulso para a Colômbia. Os dez presos da CS passaram do DOPS, pelo presídio Tiradentes e do Barro Branco, onde já estavam diversos outros presos políticos. Foram libertados em dezembro de 1978.

A LO foi atacada pela repressão não porque “atuava na luta armada”, de acordo com a versão da repressão. Mas sim por buscar se implantar no movimento de massas, em especial entre os operários que, pouco depois, iriam protagonizar a luta que marca a derrocada da ditadura.

Repressão a Imprensa Socialista
No marco do ataque à imprensa alternativa, em jornais como o Pasquim, Opinião, Movimento, entre outros, um dos eixos da Operação Lótus era o ataque aos veículos de comunicação da CS.

Em setembro de 1978, o delegado Edsel Magnotti, diretor do DOPS-SP e antigo discípulo do torturador delegado Fleury, envia um ofício ao delegado Regional do Trabalho solicitando fiscalização junto à sede do jornal Versus. Em outubro, o mesmo delegado, em seu informe ao Juiz-Auditor, afirma que: “infiltraram-se (…) através do jornal VERSUS, (…) com intuito de obtenção de fundos e aliciamentos de novos elementos para a ampliação dos quadros do PST”.Em seguida, o jornal foi atingido por uma bomba e coberto por pichações.

Em março de 1979, os diretores e redatores do jornal Convergência Socialista são vítimas de um Inquérito Policial Militar (IPM) para “investigar” a atividade das organizações de esquerda no movimento grevista dos metalúrgicos do ABC. Em 1980, a CS sofre um atentado a bomba na sede do Rio de Janeiro e, em 3 de agosto, uma bomba é lançada na sede de Santo André.

Episódio que mostra bem a relação entre os grupos de ultra-direita e os órgãos oficiais de repressão. A sede da CS no ABC foi atingida por um artefato incendiário, mas a policia realizou uma busca depois do incêndio onde recolheu documentos considerados subversivos e prendeu militantes.

Depois de três anos de perseguições e estrangulamento financeiro e contábil e de várias campanhas para tentar manter a publicação, o Versus não resiste e fecha por problemas financeiros. É constituída, então, a Editora ACS Ltda. que continua a publicar o jornal Convergência Socialista.

No dia 1º de outubro de 1981, Dia Nacional de Luta, a sucursal do Convergência Socialista em Recife foi invadida pela Polícia Federal e vários militantes detidos.

O relatório do SNI se contrapunha ao relatório da PF de Pernambuco, que opinava sobre o arquivamento de inquérito contra a CS. O relatorio afirmava: “Na hipótese de ser arquivado o processo, terse-á perdido excelente oportunidade de, senão extinguir, pelo menos diminuir sensivelmente a atuação da CS, dentro dos ditames legais (…) A não cassação dos estatutos da CS em São Paulo mantém em aberto perigoso precedente, qual seja o de se permitir a existência legal de uma organização subversiva”.

Durante toda a ditadura o Estado violou sistematicamente o direito de organização e expressão contra a Convergência Socialista por parte dos órgãos repressivos, torturando, infiltrando agentes do Estado e espionando as atividades da organização.

O resultado de toda perseguição política foram dezenas de presos, torturados, demitidos, militantes obrigados a uma vida clandestina ou semi-clandestina, tendo que mudar de cidades várias vezes, sem possibilidades de exercer suas profissões ou mesmo estudar.

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