Redação

O segundo turno das eleições encerrado neste domingo, 29, reafirmou as tendências indicadas na primeira rodada de votação. Mais uma vez, foi alta a abstenção em todo o país, de 29,43%, contra 23,14% no primeiro turno.

Na capital paulista, 30,8% dos eleitores deixaram de votar, maior número desde 1996. Somadas, abstenções, votos nulos e brancos (3,6 milhões), superam a votação do ganhador Bruno Covas (3,1 milhões). Já no Rio de Janeiro, onde Eduardo Paes (DEM) enfrentou o atual prefeito, Marcelo Crivella (Republicanos), a abstenção foi de 35,5%, situação inédita na cidade. Se é verdade que a pandemia, cujo agravamento foi criminosamente escondido pelos governos, pesou para esse resultado, também é fato que as abstenções seguem tendência de aumento nos últimos anos. Em 2012, foi de 19,12% no país, e em 2016, de 21,55%.

O segundo turno cravou novamente uma derrota de Bolsonaro, que não conseguiu eleger a grande maioria de seus aliados. Dos 16 candidatos que o presidente apoiou de forma pública, 13 não se elegeram, e neste segundo turno só 3 ganharam, em Rio Branco (AC), Anápolis (GO) e São Gonçalo (RJ). Nas capitais, as maiores expressões do rechaço a Bolsonaro ocorreram em São Paulo, onde Russomano teve um resultado humilhante, terminando em 4º lugar no pior desempenho que teve na disputa da prefeitura; e no Rio, onde Crivella até conseguiu passar para o 2º turno, mas só para ver uma grande onda de rejeição engolir suas pretensões de reeleição.

Este segundo turno também confirma a derrota eleitoral do PT, que pela primeira vez desde a redemocratização não estará à frente de nenhuma capital. Das 15 cidades onde disputou o segundo turno, o Partido dos Trabalhadores venceu em apenas quatro: nas cidades mineiras de Contagem e Juiz de Fora, e Diadema e Mauá, no Grande ABCD. Em relação às eleições de 2016, o PT reduz o número de prefeituras de 256 para 183, confirmando a perda de hegemonia do partido entre a esquerda parlamentar, embora continue sendo a principal sigla desse campo.

Partidos da direita tradicional -democratas burgueses -sejam mais liberais ou mais conservadores – que a imprensa insiste em chamar de “moderada” ou “centro”, como o MDB, DEM, PSD e Podemos saem das eleições com importante crescimento. O PSDB caminhava para uma derrota eleitoral, mas o resultado de São Paulo deu uma equilibrada nesse resultado, embora, do ponto de vista da população governada, os tucanos tenham diminuído de 30 para 20 milhões de pessoas.

O que dizem os resultados?

Além da pandemia, as abstenções mostram o avanço do desgaste dessa democracia burguesa. Mas um desgaste numa conjuntura defensiva, marcada pelo desemprego recorde, o aumento da pobreza e da miséria, e uma profunda incerteza em relação ao futuro, principalmente por conta da COVID-19. A eleição na maioria das cidades não refletiu um viés de mudança, mas de previsibilidade, de preferir os gestores conhecidos, vistos como experientes e defensores do combate à pandemia, ao invés da barulhenta extrema-direita e do negacionismo genocida de Bolsonaro. Por isso a alta taxa de reeleição. Ainda que, em geral, tenham levado a cabo a mesma política econômica do Governo Federal, e, embora com outro discurso, estejam na prática deixando correr o genocídio.

A vitória de Bruno Covas (PSDB) em São Paulo expressa bem essa tendência. Tentando se desvencilhar do bolsonarismo, conta com aprovação de 35%, índice puxado pelo gerenciamento da pandemia, ainda que, fechadas as urnas, tenha ficado evidente que, tanto a prefeitura quanto o governo Doria mentiram e esconderam os dados da real situação da doença na cidade. O discurso pela “moderação” e contra os extremos ajuda a encobrir a real polarização social e o aumento do descontentamento que ocorrem com o acirramento da crise sanitária, social e econômica, porém numa conjuntura de refluxo, defensiva.

Já o tal “centrão”, que muitos analisam como o grande vitorioso das eleições e que fortaleceria, via o parlamento, o governo Bolsonaro, teve um desempenho contraditório. Se o PP, por exemplo, teve um evidente avanço, o PL, PTB e Republicanos retrocederam. Na verdade, é até forçado analisar esse amontoado amorfo de partidos fisiológicos como um grupo só, quando, na realidade, representam interesses regionais, clientelistas, corruptos e atrasados das burguesias, muitas vezes locais, e que não raro se contrapõem eleitoralmente.

O que sim é evidente é uma enorme fragmentação eleitoral que tomou o lugar da antiga polarização entre PT e Bolsonaro em 2018. A extrema-direita e o bolsonarismo perderam espaço para siglas da direita tradicional e, no campo da esquerda institucional, o retrocesso do PT deu lugar para o protagonismo de outros partidos como o PSOL. O maior exemplo foi o desempenho de Guilherme Boulos em São Paulo. Ocupando o espaço deixado pelo PT e capitaneando um sentimento de oposição a Covas e ao bolsonarismo, principalmente entre setores de juventude, Boulos sai da eleição como uma das principais figuras desse campo, ainda que não tenha levado a prefeitura.

O PSOL também conquistou a prefeitura de Belém, dando a Edmilson Rodrigues seu terceiro mandato como prefeito, e um significativo avanço nas bancadas das câmaras municipais em várias regiões. Esse avanço eleitoral do PSOL ocorre na mesma proporção em que o partido vai adaptando seu discurso e a sua política pela via da conciliação de classes, defendendo terceirização de serviços públicos e aliança com empresários, o setor financeiro e o agronegócio como em São Paulo.

Manuela D’Ávila em Porto Alegre também sai desse processo maior do que entrou, fortalecendo sua figura de oposição, ainda que nacionalmente o PCdoB tenha sofrido uma derrota eleitoral. Já no Nordeste, o PDT, ao ganhar ainda que raspando a prefeitura de Fortaleza (e também Aracaju), e o PSB levando Recife e Maceió, também se fortalecem.

Preparar o terceiro turno na luta

Predominou no último período uma trégua calculada por conta das eleições. No entanto, vários ataques já estão programados, só esperando o fechamento das urnas. O primeiro é o fim, ou pelo menos o corte para a maioria, do auxílio-emergencial a partir de janeiro que deixará milhões na miséria. Ao mesmo tempo, o governo estuda reeditar a Medida Provisória da carteira verde-amarela, abrindo uma nova rodada de extermínio de direitos trabalhistas, num quadro de desemprego recorde.

Brasilia DF 05 08 2019 Presidente do Senado, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), recebe na Residência Oficial da Presidência do Senado, o ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente da Camara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) Foto: Marcos Brandão/ agencia Senado

No Congresso Nacional, Bolsonaro, Guedes e Maia esperam aprovar uma reforma administrativa que representará um duro ataque aos serviços públicos e aos servidores. As privatizações dos Correios, da Eletrobrás, e de outras estatais, se não forem impedidas, significarão uma nova rodada de entrega do país. À frente deste plano, além do governo e do Congresso Nacional, estarão os governadores e praticamente todos, ou quase todos, recém-empossados prefeitos.

Esse conjunto de ataques em meio ao recrudescimento da pandemia e do desemprego, da pobreza e da miséria, coloca como tarefa para a classe trabalhadora se preparar para um terceiro turno, que se dará nas lutas. Bolsonaro vem se enfraquecendo, mas está longe de estar morto. É urgente organizar uma luta unificada contra esses ataques, em defesa da vida, do emprego, do salário, da renda e da soberania. E é justamente na luta direta que poderemos resistir e derrotar Bolsonaro, Guedes, o Congresso Nacional, governadores e prefeitos. Priorizar o jogo eleitoral, esperando até 2022 para enfrentar o governo, é o caminho certo para a derrota, assim como a aposta num programa de conciliação com a burguesia (e com seu programa de ajuste no atacado, com penduricalhos sociais no varejo).

Neste sentido, ao invés de uma “frente ampla” com partidos da  burguesia, como o PSB ou o PDT (que em Salvador apoiou o DEM), além de empresários e banqueiros supostamente  “progressistas”, para as eleições de 2022, as direções do movimento e de partidos como o PSOL, PT e PCdoB deveriam estar empenhados em organizar a classe, o povo pobre e os setores oprimidos para enfrentar e derrotar, já, Bolsonaro e seus planos; e uma saída de independência de classe, não a defesa de frente ampla de colaboração de classes, como apontou Boulos no encerramento das eleições.

Uma alternativa de classe e socialista

Derrotar o governo genocida de Bolsonaro e a sua política vai se tornando cada vez mais uma questão de vida ou morte. Devemos exigir a unificação das lutas para barrar esses ataques de Bolsonaro-Guedes, que serão ataques também da direita democrático burguesa-liberal, que estará à cabeça do “ajuste” contra a classe trabalhadora, como exigem banqueiros e grandes empresários, da mesma forma que deixam a pandemia explodir e correr o genocídio para garantir os lucros dos capitalistas.

Não é possível enfrentar até o fim e barrar esse ajuste em aliança com os capitalistas, é preciso luta e independência de classe, porque alianças com a burguesia amarra as mãos da classe trabalhadora, bloqueia a sua força e não permite que ela atue no seu terreno.

É necessário apontar um horizonte estratégico para os trabalhadores e o povo pobre, que signifique uma real mudança em nossas condições de vida. É preciso apontar a superação do capitalismo e uma sociedade de outro tipo, socialista, sem exploração ou opressão.

Para isso, é preciso também seguir defendendo e construindo uma alternativa de classe, revolucionária e socialista, que defenda um governo socialista dos trabalhadores, através de conselhos populares organizados nos locais de trabalho, nas periferias, nas escolas, etc., para que seja colocado nas mãos dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido, que é a ampla maioria da população, seu próprio destino.

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