Colégio Pedro II, campus Humaitá II, Rio de Janeiro. Foto: reprodução/Google Street View

Uma professora, ao final de uma aula para estudantes de uma turma da sexta série, recebe três tapas em sua cabeça e descobre que, a sua revelia, tinha feito parte de um desafio divulgado pela internet cujo lema é, em tradução para nossa língua, “estapeie seu professor”. Sim, não é uma cena de uma série de streaming, é um fato real e ocorreu no campus Humaitá II, do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro.

Esse fato evidencia vários elementos de nossa realidade mundial, nacional e local. Nos mostra o papel “educador” das massas que as diversas mídias e aplicativos exercem cada vez mais nas mentes e corações de nossas crianças e jovens, cada vez de forma mais precoce, transformados em usuários do que quer que seja veiculado nesse mundo virtual. Virtual e rendoso, virtual e capitalista. Evidencia também um processo de alienação de nós, seres humanos, inseridos em uma realidade histórica e social, pelo qual os outros seres humanos a nossa volta perdem ainda um pouco mais a identificação com nós mesmos.

Podemos ser peças de um jogo, obstáculos a serem removidos diante de um anseio pessoal e superior, objetos a serem utilizados de acordo com a vontade e a necessidade pessoal. Talvez, apenas o aprofundamento do distanciamento gerado por uma sociedade em que somos vistos apenas como mercadoria a ser utilizada de acordo com as necessidades do sistema capitalista, na qual as mercadorias recebem o valor de divindades que elevam os seres que as podem obter e exibir. Expõe o processo pelo qual os educadores são cada vez mais traduzidos como serviçais que têm como única tarefa exibirem de forma acrítica conteúdos que, a apostar pelos ideólogos burgueses de plantão, serão com maior intensidade previamente elaborados e determinados por empresas e dirigentes políticos, como é a proposta do Novo Ensino Médio que o governo Lula pretende implementar. Educadores que podem e devem ser ofendidos como “doutrinadores”, “desencaminhadores” da juventude ou coisas piores. Numa instituição escolar que cada vez mais deve se parecer com uma espécie de boutique e não com um espaço de formação integral das novas gerações de nossa sociedade. Onde faltam verbas, concurso público e avança o processo de terceirização e precarização a caminho da privatização do ensino público.

O que fazer? Expulsar os alunos que cometeram semelhante agressão? Deslocá-los para outro campus do Colégio? Retornar a prática do jubilamento, há tão pouco tempo descartada? Achamos sinceramente que não. Vejamos, sim, a ação foi grave: dentro do recinto escolar, uma professora sofreu uma agressão física que deveria ser exposta a uma comunidade de internautas. Não se pode passar batido dessa situação. Sanções devem ser aplicadas e seu intuito deve ser formativo, pedagógico, e o Colégio não pode “jogar para debaixo do tapete” o que aconteceu. O Colégio tem que construir estratégias para congregar e debater essa realidade e como construir salvaguardas para dentro do âmbito escolar. Reavaliar o seu Projeto Político-Pedagógico.

A sociedade carioca e brasileira vive um momento de profunda crise social, econômica, política, ideológica e moral. A maioria da população de nossa cidade e de nosso estado está desempregada ou subempregada, endividada até a raiz do cabelo com instituições financeiras, amedrontada pelas forças repressivas estatais e privadas (milícia e tráfico) ou, cada vez mais, sofre com uma combinação dessas forças. Apavorada com os riscos de assaltos, furtos, abusos e violências físicas, que podem ocorrer a qualquer momento e em qualquer lugar. Nosso estado é o centro do bolsonarismo e tem um governo que, no mínimo, flerta com essa extrema direita. Expulsar os estudantes não vai resolver o problema, pode apaziguá-lo por um tempo, talvez, apenas. Muito menos resolve o clima de terror, estresse, revolta e ódio cada vez mais presentes em nosso cotidiano.

O caminho para a resolução passa pela conscientização da necessidade de construirmos nossa sociedade em outros patamares sociais. Em combater a miséria, o desemprego, o subemprego, a falta dos direitos sociais mais básicos. Em expropriar os bilionários de nossa cidade, de nosso estado e nosso país e investir essa riqueza para o bem comum, para a maioria da população, para os trabalhadores, o povo pobre e das periferias e das comunidades. Passa por desarmar quem está armado até os dentes contra nós e nos armarmos para defendermos nossas vidas. Passa por construir uma revolução socialista em nossa cidade, estado e país.