Com o fim do prazo para a desincompatibilização e o lançamento oficial da candidatura Serra ao Planalto, no dia 10 de abril, o debate eleitoral finalmente monopolizou os noticiários. A oficialização das candidaturas Serra e Dilma, porém, revelam cada vez mais a semelhança entre essas duas opções, em que pese o aumento da temperatura nos discursos de ambas as partes.

Começa o circo eleitoral
O candidato tucano se apresentou aos eleitores numa pomposa festa em Brasília, que contou com seis mil “militantes” do partido. Segundo a jornalista da Folha de S. Paulo, Eliane Cantanhede, o PSDB até parecia um partido popular, de massas, mas salientou: “das massas cheirosas”. Já Dilma, para se contrapor a Serra e impedir que o tucano desfilasse sozinho nas páginas dos jornais de domingo, compareceu a um evento especialmente montado para ela no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Sem uma nova opção política a apresentar, tanto o PT quanto o PSDB se esmeram em apresentar suas candidaturas como o melhor para fazer o que já está sendo feito. Isso significa, em bom português, manter a atual política econômica. Em entrevista à Folha, Dilma foi clara: “Por que eu iria abandonar (a política econômica)? O que eu ganharia com isso? Vou manter as bases da nossa estabilidade”.

Em São Paulo, o dirigente do PSDB Walter Feldman, num arroubo de sinceridade, afirmou que Lula se limitou a continuar a política de FHC. Diante disso, as próximas eleições deverão, segundo ele, escolher “quem encarna melhor essa continuidade dos últimos 16 anos de política econômica”. O resto, segundo o próprio tucano, é detalhe. Daí o slogan de Serra escolhido para essa campanha: “O Brasil pode mais”.

Já Serra, em sua primeira entrevista como pré-candidato, lançou uma questão interessante aos petistas. Referindo-se ao tema das privatizações, que o PT martela para tentar se diferenciar, Serra desafiou: “quem era contra a privatização teve oito anos para desfazer isso, se fosse uma decisão errada, e ninguém fez”.

A falácia do Estado forte
Um artigo no jornal Valor Econômico do dia 12 de abril apontava que “Cepal ganhará peso, com Serra ou Dilma”. Isso porque a Cepal (Comissão Econômica para América Latina), o órgão da ONU que um dia foi o símbolo do desenvolvimentismo e industrialização no continente, veria os dois candidatos como defensores dessa política.

Essa percepção deriva dos atuais discursos dos presidenciáveis. Dilma afirma defender um Estado forte, proteger as estatais e mantê-las como o propulsor do crescimento econômico no país. O ex-governador José Serra, por outro lado, mesmo dentro do PSDB, sempre foi considerado a ala desenvolvimentista do tucanato, em oposição à ala dos neoliberais radicais, os monetaristas, capitaneada nos tempos FHC pelo ex-ministro da Fazenda Pedro Malan. Serra chega a criticar abertamente as taxas de juros e o modelo de desenvolvimento primário-exportador levado a cabo pelo governo Lula.

A escolha por esse tipo de discurso, que tenta reavivar e mitificar Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek decorre de dois motivos. Primeiro, o desgaste do neoliberalismo, responsável nos anos 1990 pelo desmonte do Estado, as privatizações, o desemprego e a flexibilização das relações de trabalho. Depois, a crise econômica internacional na qual essa política desembocou em 2008.

Tal desgaste faz com que o governo Lula, mesmo aplicando uma política neoliberal em todos os aspectos, se considere desenvolvimentista. Da mesma forma, é o que força o PSDB a esconder o ex-presidente FHC nos eventos em que Serra aparece. Afinal, hoje, são todos desenvolvimentistas e keynesianos. Pelo menos no discurso.

Utopia
O que essas candidaturas não dizem, porém, é que, no atual desenvolvimento capitalista, não é possível uma reedição de governos como de Getúlio, que pôde se beneficiar de uma independência relativa enquanto as grandes potências se engalfinhavam na Segunda Guerra. Tampouco governos como o de JK, que pôde captar uma grande massa de capitais estrangeiros para o investimento no país.

Da mesma forma, não é possível hoje a reconstrução de um Estado de bem-estar social da mesma forma que vigorou na Europa do pós-guerra. Ainda mais nos países semicoloniais. A crise do capitalismo e a ofensiva imperialista pressionam no sentido contrário. O pagamento da dívida pública, por exemplo, tanto interna quanto externa, retira recursos do Estado, inclusive das estatais, para os especuladores internacionais.

Já a queda da margem de lucros dos grandes capitalistas e o aumento da concorrência na crise, forçam as multinacionais a explorarem ainda mais, reduzindo direitos e salários, como é o caso das montadoras aqui instaladas. E, ainda que se possa ter por um momento o aumento de investimentos para a instalação de máquinas e fábricas, a fim de se aumentar a produção, os lucros que serão posteriormente remetidos aos países imperialistas serão cinco vezes maiores.

A proposta de um modelo nacional-desenvolvimentista, nos tempos de hoje, não passa de uma utopia reacionária. Na verdade, o desenvolvimento do capitalismo nos últimos anos impôs ao Brasil uma divisão internacional imposta pelo imperialismo de grande fornecedor de matérias-primas. Daí a política de privilégios ao setor minerador e agroexportador do governo FHC e de Lula.

Qual é então a diferença?
Ao contrário do que possa parecer, porém, o embate entre as duas principais candidaturas não deve ser nada leve. Pode até descambar para a baixaria, como o discurso de Dilma Rousseff afirmando que não foge à luta, referindo-se claramente ao exílio de Serra na ditadura.

A diferenciação, ao que tudo indica, vai se dar na aparência da campanha, na embalagem dos candidatos, como mostrou o último dia 10. Dilma contou com a ajuda do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, da CUT e demais centrais a fim de passar uma imagem de popular à sua candidatura. Já Serra mobilizou a “massa cheirosa” do PSDB em um evento luxuoso em Brasília. Como se vê, a diferença é mera perfumaria.