O mês de junho nunca será esquecido. Marca uma mudança na situação da luta de classes do país. Apenas em momentos especiais da história, os trabalhadores e o povo pobre passam para a ofensiva como começou a ocorrer. 
Normalmente, os atores da vida política são os parlamentares e os governantes. A grande massa não participa da cena política. Os trabalhadores são explorados e oprimidos em seu dia a dia e, de vez em quando, promovem lutas defensivas. 
Em junho tudo mudou. A juventude ocupou as ruas em passeatas gigantescas. Na semana de 17 a 23, mais de dois milhões de pessoas ocuparam ruas, levantaram cartazes e faixas feitas a mão, e se enfrentaram com a polícia. 
A ofensiva das ruas desgastou e assustou os governos. Em muitas capitais, recuaram do aumento das tarifas. O Congresso Nacional votou contra a PEC 37, definiu aplicar 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde. Foi retirado o projeto de “cura gay”. Renan Calheiros, presidente do Senado, garantiu que colocaria em votação o passe livre para os secundaristas. O Congresso ainda definiu a corrupção como “crime hediondo”. 
Assustados com a ofensiva e os insultos vindos das ruas, os parlamentares deixaram o Congresso irreconhecível.
Quais são os próximos passos? Como seguir adiante? O dia 11 de julho, no qual está marcado um Dia Nacional de Greves e Paralisações, pode se transformar em um dia de greve geral. O que representaria um passo adiante para colocar em cena a classe operária. 
 
A relação de forças mudou 
Em primeiro lugar, houve uma brusca mudança na relação de forças no país. Na maioria das vezes, são as classes dominantes que estão na ofensiva. Neste momento, a ofensiva das massas marca uma transição para uma situação pré-revolucionária. A estabilidade anterior, típica de uma situação não revolucionária, ficou para trás. Agora existe um novo ator no cenário político que não vai querer sair de cena tão cedo: o povo nas ruas. 
Houve duas alterações de peso na consciência das massas. A primeira, é que é necessário e possível lutar. Foram à luta pessoas que nunca pensaram fazer isso na vida. Mais ainda, gostaram do que fizeram. As pesquisas indicam apoio de mais de 80%  da população a favor das mobilizações. 
Em segundo lugar, as vitórias parciais trouxeram outro avanço na consciência. Não só de que é necessário lutar, mas também de que é possível vencer. 
A consciência das massas é parte importante da relação de forças. Na maior parte da vida, os trabalhadores e o povo pobre não sabem a força que têm e por isso se deixam explorar. 
Hoje, existem menos pessoas nas pass eatas do que na semana dos dias 17 a 23 de junho. Mas isso não significa que houve um recuo. Na verdade, o processo está se aprofundando. Os setores sociais vão se colocando em movimento, em defesa de suas reivindicações. As mobilizações vão incorporando as camadas mais profundas dos trabalhadores, incluindo os bairros mais afastados e as cidades do interior.
 Caso o Dia Nacional de Greves e Mobilizações do dia 11 de julho se transforme em uma greve geral, o país será sacudido por uma situação na qual mobilizações podem trazer para o centro das lutas a classe operária e os trabalhadores assalariados. 
 
Os trabalhadores entram em cena
A primeira vaga de mobilizações teve uma base essencial na juventude. Isso teve uma grande importância pela combatividade e iniciativa dos jovens. Mas também mostrava a ausência da classe operária e dos trabalhadores como um todo, ainda que uma parte da juventude trabalhadora estivesse também nas ruas. 
Mas isso está se modificando. O dia 27 de junho foi uma primeira iniciativa da CSP-Conlutas para colocar os trabalhadores em cena. Em várias capitais, houve greves operárias, como em Belém, Sergipe e Fortaleza. Em muitas outras, ocorreram paralisações do funcionalismo público. 
Mas, no dia 11 de julho, convocado por todas as Centrais Sindicais, estão marcadas greves operárias e de trabalhadores acompanhadas por grandes passeatas. Trabalhadores do transporte (metrô e ônibus) vão se somar à paralisação.  Caso isso se confirme, poderá significar a incorporação do movimento sindical dos trabalhadores ao movimento como um todo. 
O Brasil não tem tradição de greves gerais como outros países. Em geral, as que ocorreram no passado não chegaram a parar todo o país. O destaque, no passado, foram as greves gerais de 1917, de 1986 (contra o Plano Cruzado) e a de 1989 (contra o plano Verão do governo Sarney).  A paralisação do dia 11 de julho pode ser uma das maiores greves gerais de nossa história. 
Pode ainda provocar inúmeras campanhas salariais a partir dessa data, com um conteúdo político mais amplo e uma nova radicalidade. E estará colocada a necessidade de um plano de lutas, com greves gerais com mais de um dia, em direção a uma greve geral por tempo indeterminado para derrotar a política econômica do governo e impor um plano econômico dos trabalhadores. 
A CUT, no entanto, está participando desse dia para tentar transformá-lo em um dia de apoio à proposta de plebiscito do governo, e não contra o governo. É muito importante que os sindicatos dos trabalhadores entrem em cena, mas como parte da luta contra o governo. E não como um Cavalo de Tróia do governo dentro do movimento. 
 

O governo do PT em crise

Essa primeira vaga de mobilizações levou a um profundo desgaste do conjunto das instituições do regime democrático burguês. Houve uma grande queda de popularidade dos governos municipais, estaduais e também do governo federal. 

Dilma teve uma queda espetacular de sua popularidade, de 57% para 30% depois das mobilizações. Em março, no auge de sua popularidade, Dilma tinha 65% de ótimo e bom nas pesquisas. Caiu a menos da metade. Também os governadores e prefeitos  do Rio de Janeiro e São Paulo tiveram acentuadas quedas de popularidade.
Além de baralhar completamente o quadro eleitoral de 2014, isso agrega elementos importantes de instabilidade no país, ao questionar diretamente o governo federal. Mais ainda pelo fato de ser um governo dirigido pelo PT. Esse é um tipo de governo, que chamamos de frente popular, por ser baseado no engano: os trabalhadores acreditam que é um governo seu, mas o PT governa para as grandes empresas. 
Agora, Dilma tem que se enfrentar com mobilizações gigantescas. Isso significa que o engano está se desfazendo. Vai continuar caindo? Isso vai ser revertido? Só o tempo dirá. Mas nada indica que as mobilizações vão parar e nem que Dilma vai conseguir responder aos anseios das ruas. É provável que o desgaste possa se aprofundar. 
Dilma tentou uma manobra para desviar o movimento com uma proposta de constituinte para fazer uma reforma política. A proposta naufragou por não ter apoio nos partidos da base governista. O governo tentou então um plebiscito para fazer a mesma reforma política. Seria uma manobra para desviar a atenção das ruas. Uma reforma do regime cai bem para a população revoltada, assim como o poder de decidir pelo voto. No entanto, as perguntas do plebiscito seriam decididas pelo próprio governo e pelo Congresso, tendo como objetivo só reforçar os mesmos partidos repudiados pelo povo.  
Com a popularidade em declínio, Dilma foi derrotada pelos próprios partidos governistas que estão adiando o plebiscito para 2014, com validade apenas para as eleições de 2016. Isso retira, na prática, de cena a única iniciativa política do governo e aprofunda sua crise.
 
Novos organismos, nova direção
As passeatas tinham um caráter espontâneo, sem organização definida e muitas vezes sem direção, além de que era convocada pelas redes sociais. Isso também teve um caráter extremamente progressivo por furar o bloqueio dos aparatos políticos e sindicais. Mais ainda tendo em conta que o governo é apoiado pela CUT, UNE e MST. O facebook, em particular, canalizou as vontades e articulou as passeatas, possibilitando que o movimento passasse por cima dos aparatos. 
Mas o que era progressivo no início logo mostrou suas limitações. Pelo facebook, pode-se convocar atos e passeatas, assim como divulgar posições. Mas não se pode organizar democraticamente uma discussão e votação sobre o que fazer. Isso começou a se mostrar nas semanas seguintes, com vários atos e reivindicações distintas com horários diversos sendo marcados. 
Além disso, alguns sites de orientação duvidosa (muitos atribuíam à direita) tentaram convocar uma greve geral para 1° de julho e tiveram uma derrota gigantesca, pois, afinal, não parou ninguém. Aqui se mostrou duramente os limites da internet. Agora, com a participação dos sindicatos e centrais será possível dar um passo adiante nesse sentido no dia  11 de julho.
Para que o movimento avance é necessário que vá se formando uma nova direção. A negação dos aparatos do PT, PCdoB, CUT, UNE não basta. É necessário começar a formar uma nova direção, com novos organismos. A CSP-Conlutas vai se fortalecendo perante à crise da CUT. A ANEL aponta uma iniciativa contra a falência da UNE governista. 
E as mobilizações também começaram a gerar novos organismos, como a Assembleia Popular Horizontal, em Belo Horizonte, e o Fórum de Lutas Contra o Aumento da Passagem, no Rio de Janeiro. 
São assembleias da vanguarda que dirige e organiza essas lutas. Reúnem mil a duas mil pessoas com funcionamento democrático (leia p. 10). 
É muito comum que surjam novos organismos em processos revolucionários. No momento atual, em que existe um questionamento aberto aos partidos e também aos sindicatos, a importância desses novos organismos se reforça. 
Como parte da construção dessa nova direção, é importante que a ANEL e a CSP-Conlutas sigam se fortalecendo. 
Esses novos organismos e novas direções devem ser construídos e desenvolvidos. Isso significa propor reuniões abertas de toda a vanguarda, convocadas pela internet e pelos meios tradicionais. Buscar pacientemente que se desenvolvam como organismos democráticos que discutam e votam os temas. Discutir nossa visão da situação, nossas propostas para as mobilizações.  
Agora, com o dia 11, pode ocorrer um duplo movimento: por um lado a incorporação da classe operária nas mobilizações e, por outro, das burocracias sindicais da CUT, Força Sindical na direção do movimento. A CSP-Conlutas e a ANEL estarão a favor da continuidade das mobilizações e de sua integração com os novos organismos que estão sendo criados. Mas a CUT e outras centrais vão priorizar a negociação com o governo.
A participação dos sindicatos e entidades estudantis e populares, que estão à frente do dia 11 de julho,  coloca um novo desafio para o fortalecimento desses novos organismos que dirigiram as passeatas de ruas. 
 

Os trabalhadores entram em cena

A primeira onda de mobilizações tinha uma reivindicação central: a revogação do aumento das tarifas. Ao ser essa reivindicação atendida na maioria das capitais, deixou as mobilizações sem um móvel central. A luta contra os gastos e a corrupção na Copa do Mundo centralizou uma parte das lutas, mas isso também se enfraqueceu com o fim da Copa das Confederações. 
Agora é hora de definir um novo programa:
 
• Abaixo à política econômica de Dilma, do PT e PSDB! Por um plano econômico a serviço dos trabalhadores e da juventude! 
 
• Greve geral para derrotar esse plano econômico!
 
• Não pagar a dívida aos bancos para investir em saúde, educação e transporte.  10% PIB para educação publica já! 6% do PIB para a saúde pública! 2% do PIB para o transporte público! Passe livre para todos os estudantes e desempregados! Tarifa zero e estatização das empresas de transporte!
 
• Aumentos salariais já, com reajuste automático de acordo com a inflação! Redução e congelamento dos preços dos alimentos e tarifas. Revisão das dívidas pessoais dos trabalhadores com os bancos sem juros!
 
• Contra as privatizações do PSDB e do PT. Pela reestatização da Vale, Embraer, CSN, rodovias , assim como do Maracanã. Fim dos leilões do petróleo! Petrobras 100% estatal!
 
• Prisão e expropriação dos bens de corruptos e corruptores. Fim do Senado, revogabilidade dos mandatos, salário dos deputados igual a salário de um professor, contra voto obrigatório!
 
• Abaixo à repressão policial! Pela desmilitarização das PMs, pela dissolução das polícias atuais e construção de novas polícias com funcionamento democrático.
 
• Em defesa da reforma agrária, com a desapropriação dos grande latifúndios!
 
• Contra a opressão às mulheres, negros e homossexuais. Fora Feliciano! Pela criminalização da homofobia! Contra a violência contra à mulher! Contra o genocídio dos negros pela polícia nos bairros populares!
 
• Nem direita, nem PT, trabalhadores no poder
 

Post author Eduardo Almeida, da redação
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