Sérgio Carvalho é diretor da Companhia do Latão, um dos grupos mais importantes do país na atualidade. Trabalha com o teatro numa perspectiva crítica anticapitalista, procurando romper com a mercantilização da cultura, que faz com que o espectadorA Companhia tem feito um trabalho inovador, procurando romper a divisão entre trabalho intelectual e material no teatro. Como se dá isso?

O primeiro desafio de um grupo teatral interessado numa reflexão anticapitalista é revolucionar a própria prática de trabalho. O discurso crítico é insuficiente se não se converter em novas formas de produzir, numa atitude coletivizante que precisa se tornar visível e partilhável pelo público. Nesses sete anos, a Companhia do Latão sempre encenou peças-processo. Algumas nós chamamos mesmo de “ensaios”: incompletas e reflexivas, porque feitas para desencadear uma atividade dos sentidos, uma percepção histórica. É como se ao público fosse negada a perspectiva convencional do produto artístico pronto, que gera prazeres previsíveis. É como se estivéssemos dizendo que os processos são mais importantes que os produtos, que o valor de uso está acima do de troca. Isso só se torna uma atitude, com força artística, quando na sala de ensaio todos participam do conjunto da obra.

Esse método se adapta apenas a grupos que já conhecem as técnicas teatrais ou serve também para aqueles que nunca fizeram teatro antes?

Qualquer grupo teatral pode trabalhar em bases igualitárias. Só que isso implica uma dura e difícil negação dos padrões estéticos e dos hábitos dominantes. É preciso ir contra as expectativas de acerto burguês, descobrir imposições muitas vezes internalizadas e inconscientes, desmontar o personalismo da atuação, os idealismos autoritários da direção, o mito de que o diálogo com o público depende do agrado fácil. A mudança às vezes exige radicalização em sentido contrário, para deflagrar a contradição: pôr as ações à frente das palavras do texto, o improviso e a invenção livre acima do plano fechado, até que se encontre um método pelo qual todos caminhem juntos e reconheçam o motivo de cada escolha.

O que são as Oficinas de Teatro Dialético?

Estamos preparando para o segundo semestre algumas oficinas destinadas a integrantes de movimentos sociais. A idéia é formar “brigadas teatrais”, compostas por pessoas que possam contribuir para a formação de grupos novos interessados em teatro crítico.

O que a Companhia do Latão está encenando agora?

Estamos estudando a obra de Machado de Assis, alguns de seus contos, para um novo espetáculo.

O tema ainda está em aberto, talvez uma sátira aos produtores reacionários de “cultura” em nosso país. Assim como fizemos em A Comédia do Trabalho, será uma montagem de curto-circuito entre a farsa e a tragédia, de modo que a história não esteja dada, mas fique à espera de construção. Ainda não consigo falar nada de mais concreto.

Post author Cecília Toledo, da redação
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