Multinacional alemão foi denunciada no Ministério Público Federal
Dez centrais sindicais, entre elas a CSP-Conlutas, as comissões da verdade nacional e do estado de São Paulo e São Bernardo, além de representantes das vítimas de tortura, apresentaram uma representação ao Ministério Público Federal em São Paulo contra a multinacional alemã Volkswagen por seu envolvimento em atos de repressão durante o regime militar no Brasil.A peça é baseada nas investigações feitas pelo Grupo de Trabalho “Ditadura e Repressão aos Trabalhadores, às Trabalhadoras e ao Movimento Sindical” da Comissão Nacional da Verdade.
A representação visa subsidiar a Procuradoria na elaboração de uma ação civil pública contra a multinacional. A colaboração da Volkswagen com o aparelho repressivo da ditadura se deu tanto com a apreensão e tortura de operários nas dependências da empresa como através de espionagem, elaboração de listas de trabalhadores suspeitos, dossiês internos e repasse de informações para o Departamento de Ordem Política e Social (Dops); assim como doações de carros e recursos financeiros para os grupos paramilitares e oficiais que atuavam na repressão.
O coordenador do Projeto Investigação Operária e do processo de elaboração da representação, Sebastião Neto, deixa claro que o objetivo do Fórum de Trabalhadores é cobrar uma admissão de culpa e a reparação coletiva às vítimas por parte da multinacional. “Queremos justiça e reparação, esse é o nosso principal objetivo. Mas não é apenas a Volkswagen que deve ser cobrada, é preciso que o setor empresarial que esteve intimamente ligado ao golpe e ao regime militar seja identificado e responsabilizado”, diz. “A Volkswagen é só a primeira neste processo de busca de verdade, justiça e reparação”, completa.
Multinacionais envolvidas com o nazismo foram punidas
No dia seguinte à entrega da representação contra a Volkswagen, a notícia repercutiu em todos os grandes meios de comunicação da Alemanha, Suíça, Áustria e Inglaterra.
Isso ocorre por que na Europa já há jurisprudência suficiente que garante a indenização das vítimas do Holocausto e a punição das empresas que de alguma forma participaram dele. Afinal, Hitler não teria alcançado seus objetivos se não tivesse contado com o financiamento de empresas nacionais e internacionais que, em contrapartida, ganharam muito com isso.O Deutsche Bank entregou créditos para erguer o campo de concentração de Auschwitz.
Calcula-se que 90% das empresas alemãs se beneficiaram do trabalho escravo ou semiescravo durante a Segunda Guerra. No final de 1944, calcula-se que tenha existido de 7 a 12 milhões de trabalhadores forçados em todo o país. Eram levados das regiões ocupadas para a Alemanha, em parte para compensar o déficit dos operários convocados para o front, trabalhando em fábricas em jornadas de 14 horas diárias. Recebiam somente roupa e pouca comida. Se tentassem fugir eram espancados ou mortos.
O historiador Dietrich Eichholz afirma que o patrimônio da indústria alemã que se beneficiou com o trabalho forçado no final da guerra era 17 vezes maior do que em 1939. Hitler perdeu a guerra, mas a burguesia alemã ganhou muito com ela.
Depois de muita campanha política, empresas como Degussa, Deutsche Bank e Dresdner Bank passaram a compensar os trabalhos prestados à força durante o nazismo. No ramo bancário, a UBS e Credit Suisse indenizaram vítimas em um valor recorde de 26,45 milhões de francos suíços. Por terem confiscado bens judeus durante a 2ª Guerra Mundial.
A Volkswagen e a Siemens decidiram instituir um fundo para prestar apoio individual aos sobreviventes. E a República Federal da Alemanha pagou a título de indenização a sobreviventes do Holocausto algo como 50 bilhões de euros desde 1945.
Em 2000, criou-se a fundação “Lembrança, Responsabilidade e Futuro”, dotada com 5 bilhões de euros, aderiram a esta fundação mais de 6500 empresas alemãs. Cerca de 1,5 milhão de ex-trabalhadores forçados de 80 países foram indenizados, com idades entre 60 e 100 anos, a maioria da Polônia, Ucrânia e Rússia.
O governo alemão também fez um acordo com a Claims Conference, organização sediada em Nova York que trabalha desde 1951 pela compensação às vítimas do Nazismo. Pelas regras que entraram em vigor no dia 1º de janeiro de 2012, qualquer pessoa que tenha sido obrigada a passar 12 meses em guetos, escondida ou usando identidade falsa, tem direito a um benefício de 300 euros por mês. Para os moradores dos países da antiga União Soviética, o valor mensal chega a 260 euros. Dos novos beneficiários das pensões do governo alemão, 5.000 vivem nos Estados Unidos.
“Não é uma questão de dinheiro. É o reconhecimento da Alemanha do sofrimento causado a essas pessoas“, declarou Greg Schneider, vice-presidente executivo da Claims Conference.
Trabalho forçado, lucros e Holocausto
Entre as empresas que utilizaram trabalho escravo está a Kodak, depois de demitir os empregados judeus em troca de benefícios do Estado. Em virtude disso, a empresa doou 500 mil dólares para o fundo alemão para as vítimas de trabalho forçado.
Hugo Boss era conhecido como o “alfaiate de Hitler”. Sua empresa fez os uniformes nazistas da Juventude Hitlerista e da SS, produzidos por trabalhadores escravos da Polônia e da França na cidade de Metzingen, sul da Alemanha. Seu pedido de desculpas foi divulgado em 22 de setembro 2011, foi multado em 80 mil marcos e condenado a indenizar as famílias dos trabalhadores forçados e privado de seus direitos civis.
A IG Farben fez doações para a campanha de Hitler que chegaram a 15 milhões de marcos em valores atuais. Depois, subsidiada pelo governo, investiu em tecnologias estratégicas para Hitler (combustível sintético derivado do carvão), que garantiu as Forças armadas até o final da guerra. Fabricava ainda o gás Zyklon B usado nas câmaras de gás nazistas e financiaram as “experiências” de Josef Mengele em prisioneiros em campo de concentração. Foi a empresa que teve os maiores lucros com os nazistas, depois da guerra a empresa mudou nome para Bayer (Friedrich Bayer, o mesmo fundador da IG Farben).
A Siemens chegou a empregar 50 mil pessoas em regime de trabalho escravo, sendo que a maioria trabalhou no setor de produção de armas. Levou escravos a construir as câmaras de gás que iriam matá-los. Na década passada, a Siemens começou a pagar indenizações às famílias de seus operários escravizados.
A BMW admitiu que utilizou até 30 mil trabalhadores forçados durante a guerra, que produziram os motores para a Luftwaffe, além de veículos terrestres. A Mercedes-Benz fez caminhões e motores de avião em 1941, e toda a produção era para abastecer a guerra, fins militares.
A Volkswagen, com o protótipo de Ferdinand Porsche, criou o “carro do povo” (Volkswagen), a pedido de Hitler. Chegou a ter quatro de cada cinco trabalhadores como escravos, solicitados diretamente de Auschwitz, em um total que chegou a 25 mil. Em 2001, indenizou algumas vítimas com US$ 6 mil a cada uma, além de doar dinheiro para o fundo de reparação.
A IBM InternacionalBusinessMachines) construiu máquinas para os nazistas com quais eles controlavam tudo, do fornecimento de petróleo, os horários dos trens em campos de concentração e até contas bancárias de judeus vítimas do Holocausto. Esta empresa de tecnologia organizou todo o Plano de Extermínio, automatizando e acelerando as fases do Holocausto. Havia uma central de atendimento ao consumidor IBM em cada campo de concentração.Os cartões perfurados também faziam a correspondência entre as necessidades de trabalho do Reich e as habilidades dos prisioneiros judeus. Isso rendeu aos seus cofres 200 milhões de dólares.
Vítimas do apartheid
Na África do Sul, vítimas do apartheid buscam reparações das corporações e bancos estrangeiros pelo “sangue e miséria” que eles causaram por fazer negócios com o ex-governo branco do país.
Entre eles, os dois maiores bancos suíços que já tiveram que indenizar as vítimas do nazismo, como o UBS e Credit Suisse, mas também o norte-americano Citicorp Inc, que detém Citibank. Bancos que forneceram fundos para sustentar o governo do apartheid entre 1985 e 1993, numa altura em que o regime estava ficando sem dinheiro por causa de sanções das Nações Unidas.
Neste país, a Comissão Verdade e Reconciliação (TRC), afirma que até 26 mil pessoas merecem indenizações em dinheiro, totalizando mais de três bilhões de rands (282 milhões dólares americanos).
Todos estes são exemplos a serem seguidos pelo Brasil. Punição para os agentes do Estado que torturaram e para as empresas que financiaram a tortura! Reparação para os que lutaram para derrubar a ditadura!