Ocorreu nesta quinta, 26, no auditório da sede da OAB-BA a audiência pública “Ações da RONDESP no Cabula: Limites para uso da força da polícia militar” motivada pelo recente caso da chacina na comunidade de Vila Moisés no bairro do Cabula. A audiência atraiu um imenso público, retrato da enorme repercussão que as mortes causadas pela ação da RONDESP (Rondas Especiais) provocaram e o clamor da sociedade por um debate que aponte caminhos para superar o atual quadro das políticas de segurança pública.

O auditório da OAB ficou pequeno para as cerca de 600 pessoas que estiveram presentes. Na mesa de debate representantes da OAB, da Defensoria Pública, do Ministério Público, do governo do Estado, associações de policiais civis, parlamentares e Hamilton Borges, coordenador da Campanha Reaja. No auditório lotado se fizeram presentes também muitos ativistas de diversos movimentos sociais, em especial do movimento negro.

Também havia um grande número de policiais presentes, o que contribui para gerar um clima de tensão durante toda audiência. Lamentavelmente, não houve da parte dos policiais que se encontravam no plenário o reconhecimento “mínimo” de que uma ação que resulta na morte de 13 jovens não pode ser defendida, muito menos naturalizada. Ao contrário, em diversos momentos atuaram como verdadeiros provocadores interrompendo falas, ameaçando ativistas, sendo que alguns sentiam-se a vontade pra gritar: “Vocês são contra a polícia porque são todos maconheiros vagabundos”!

Uma política de segurança falida
A ampla maioria das falas durante toda a audiência convergiu num sentido: A atual política de segurança pública está esgotada, não apenas porque é incapaz de conter a violência, mas, na verdade, através de sua lógica de guerra e modelo militarizado de polícia, promove a violência. A isso se soma a ideologia racista que está no DNA dos órgãos de controle social no Brasil desde os tempos da escravidão, fazendo do povo negro o grande alvo, um “inimigo” a ser eliminado numa guerra montada pelo próprio estado brasileiro contra aqueles que representam a maioria da população.

Nessa guerra, ou melhor, nesse extermínio diário que o Estado brasileiro promove, as baixas de ambos os lados possuem a mesma cor. Em especial na cidade de Salvador, onde mais de 80% da população é negra, o policial que vai até a periferia e tira a vida de jovens negros, na ampla maioria dos casos também é negro e morador de periferia. Nesse ponto concordamos com o coordenador da Campanha Reaja, Hamilton Borges, quando diz que “policiais não podem sair de suas casas em locais pobres para combater pessoas que parecem com eles”.

João Jorge Rodrigues, presidente do Olodum, também usou da fala para denunciar o que chamou de “modelo nazista de Polícia Militar” baseado no tripé “isolar, identificar e eliminar”. Ele também relembrou o histórico de membros da entidade que foram perseguidos e assassinados pela polícia. Já a professora Vilma Reis, dirigindo-se, aos policiais militares, que no fundo do plenário faziam provocações a todo momento, disse que “as armas não brotam nas comunidades, as balanças de precisão não brotam nas comunidades, e os helicópteros repletos de cocaína também não brotam nas comunidades”. Em seguida denunciou, assim como inúmeras outras falas fizeram, as declarações do governador Rui Costa (PT) e do secretário de segurança pública Maurício Barbosa.

Desmilitarizar é preciso
Na Bahia e no Brasil, a postura histórica do Estado através dos seus diversos governos e regimes foi a do abandono das periferias e criminalização dos mais pobres. O Estado que se ausenta frente a responsabilidade de promover educação, saúde, moradia digna, cultura e emprego só se faz presente na periferia através do braço armado da polícia. Infelizmente, após 12 anos de governos petistas, o Brasil continuou sendo um dos países mais desiguais do mundo, e é justamente essa desigualdade que promove as injustiças sociais que devem ser combatidas se quisermos de fato buscar uma saída para violência.

O governador Rui Costa já demonstrou que pretende manter a lógica da repressão. Com uma mão o governador pretende cortar mais de R$ 200 milhões do orçamento da educação e com a outra sinalizou a pretensão de gastar mais de R$ 300 milhões com o projeto de criação da BOPE baiana. Não há outro caminho para o movimento negro baiano que não seja o do enfrentamento com a política de segurança pública posta em prática pelo governo petista. É preciso romper com essa lógica de guerra.

Uma vez mais reivindicamos a fala feita na audiência por Hamilton Borges quando disse que “Nós queremos o fim da Polícia Militar, porque nós queremos que os policiais tenham direito à greve, que os policiais não se submetam a uma casta de oficiais, que estão ‘muito bem, obrigado’, enquanto os policiais vão para guerra”. Para conter a escalada da violência e dar um basta ao genocídio da juventude negra a desmilitarização da polícia, o fim dos “Autos de resistência”, a criação de corregedorias externas e a extinção de batalhões especiais como a RONDESP e o BOPE são medidas necessárias.

O PSTU se soma às organizações e aos diversos ativistas que exigem do governo garantias de que haverá uma investigação ampla e rápida, se necessário for, federalizada, para que todos os envolvidos nessa chacina sejam devidamente julgados e punidos. Enquanto isso, não podemos recuar nenhum único centímetro. Os movimentos devem se manter em luta organizando atos, promovendo debates, fazendo de tudo para ampliar o alcance da luta contra o genocídio e em defesa da vida da nossa juventude negra.

LEIA MAIS
BA: Tribunal de Rua da PM sentencia à morte jovens negros da periferia