Grandes protestos e mobilizações varrem a Turquia. A revolta entra em sua segunda semana de ebulição. Tudo começou com uma manifestação pacífica contra a destruição da última área verde de Istambul, no dia 27 de maio, o Parque Taksim Gezi. Algumas centenas de pessoas protestavam quando uma violenta repressão policial deixou um homem morto. Foi o que bastou para que, no dia seguinte, as centenas se transformassem, espontaneamente, em milhares mesmo antes de o sol nascer.
O que era um protesto contra a destruição da praça virou uma convulsão social contra o governo do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan, do partido islamita Justiça e Desenvolvimento (AKP). O parque seria destruído para construir um shopping center. Não foi a primeira vez que áreas públicas foram devastadas para dar lugar a mesquitas e shoppings sob o governo de Erdogan.
Todas as insatisfações vieram à tona: a piora e o alto custo do nível de vida da população, mas, sobretudo, o autoritarismo do governo Erdogan. Os manifestantes exigem a sua saída do governo e o acusam de tentar aplicar leis “islamizantes”, que visam proibir o consumo de álcool, atos de afeto em público, entre outras coisas, ou seja, determinar o comportamento do povo.
Desde então, a rebelião se expandiu para todo o país, com focos principais em Istambul e na capital Ankara, mas com manifestações em outras cidades, como Izmir, Adana, Bursa e até mesmo em aldeias. A repressão também aumentou. Foram centenas de feridos e detidos. Há rumores de que os presos estão sendo torturados.
Bombas foram jogadas no metrô para impedir as pessoas de chegarem aos locais de maior concentração popular. Bloqueadores de sinal foram colocados no entorno da praça, o que impede o uso de celulares também. Bombas de gás, de fabricação brasileira, foram jogadas nas sacadas dos apartamentos de quem apoiava a manifestação.
O Movimento RED, grupo da Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT-QI), participa dos protestos desde o começo. Dois de seus militantes ficaram gravemente feridos, atingidos por granadas e bombas de gás lacrimogêneo.
Sindicatos turcos aderiram à rebelião e realizam greves. Em nota, o Movimento RED declarou que “os trabalhadores das bases da Turk-Is [maior central sindical] devem pressionar os seus sindicatos para que se juntem à resistência e entrem em greve”. A Turk-Is é uma entidade governista e de colaboração com o capital. “Suas lideranças devem ser desmascaradas, burocratas e colaboracionistas dos capitalistas devem ser derrubados”, diz a nota.

Inflexível
Apesar da condenação das ações do governo pela Anistia Internacional, o primeiro-ministro disse que não cederá. Em discurso à televisão, logo após o estouro das mobilizações, ele desafiou: “Se isso é um movimento social, onde se reúnem 20, vou levantar e reunir 200 mil pessoas. Onde se reúnem 100 mil, vou reunir um milhão do meu partido”.
Contudo, a polícia foi obrigada a se afastar da praça, o que não significou o fim da repressão. Os manifestantes permanecem acampados em vigília na Praça Taksim. Na madrugada de 9 de junho, novo ataque violento da polícia voltou a acontecer.

Ilusão democrática
O partido que hoje governa a Turquia é uma dissidência do Partido da Virtude, o tradicional partido islâmico da Turquia. A chegada ao poder, em 2002, se deu em base à ilusão de que seria um governo mais popular.
Erdogan assumiu o cargo de primeiro-ministro em 2003 e aplicou os planos neoliberais no país, acabando com uma inflação altíssima que já durava três décadas. Promoveu, de fato, um crescimento econômico alardeado pela mídia internacional.
No entanto, como em todo o mundo capitalista, o crescimento foi para uma minoria rica. Agora, a população cobra a conta nas ruas. O crescimento se deu à custa da piora de vida do povo. Em entrevista ao Portal do PSTU, a estudante turca Pinar Asilkan afirmou: “estamos ficando mais pobres a cada dia”.
Embora não exista uma ditadura na Turquia, o governo do AKP tem se demonstrado cada vez mais autoritário, se chocando com a resistência da população ao islamismo. O país conquistou o direito a ser um Estado laico com o fim do Império Otomano, que durou quase sete séculos, e a criação da República Turca, em 1923.
Desde então, os turcos resistem para manter a democracia tardiamente conquistada. Pinar disse: “não queremos nos transformar num Irã”. Esse é o sentimento atual dos turcos.

Unir as forças da rebelião turca
O maior impasse da rebelião turca, agora, é a falta de uma direção centralizada. “Temos de estar bem organizados, porque agora somos apenas a multidão. Mas eu nao sei como”, disse Pinar. De acordo com ela, a praça Taksim “está lotada, muitos temem a violêencia ao sair de lá”.
Para o Movimento RED, “As barricadas devem se unificar com uma greve geral”. A organização defende como plataforma a demissão de “todos os oficiais que ordenaram o ataque à população devem ser demitidos”. Defende o fim dos “instrumentos de tortura em massa, como a bomba de gás lacrimogêneo” e a libertação de todos os presos.
O Movimento RED defende a criação de uma organização de massas, resistir aos ataques do governo e seguir as exigências da rebelião. Para a organização, “as forças revolucionárias que ocuparam a Praça Taksim devem se organizar em uma frente e espalhar a organização em todo o país”.
“Podemos conquistar as condições que a Plataforma Taksim declarou ao governo com a unificação das barricadas com as greves”. “Temos que nos organizar! Trabalhadores! Juventude! Povo pobre! Juntem-se a seus companheiros revolucionários e internacionalistas que estão à frente da resistência! Vamos lutar ombro a ombro!”, conclui a nota.
 

Post author Luciana Candido e Reinaldo Chagas, de São Paulo (SP)
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