Justiça não reconhece mais trabalho voluntário, que foi marca das grandes campanhas eleitorais no País. Juízes não conseguem imaginar que alguém dedique seu tempo a uma candidatura ou partido de forma voluntária, sem ser um cabo eleitoral remunerado. MediNos anos 1980, quando se derrubou a ditadura e houve a redemocratização do Brasil, era comum nas campanhas eleitorais, atividades politicas espontâneas. Milhares de ativistas realizavam campanha nas ruas, pedindo o voto para seus candidatos, refletindo o clima que se vivia nas fábricas, nas greves, em cada luta.

A Constituição de 1988, refletindo esta realidade, garantiu a liberdade de expressão e a livre manifestação política em apoio aos partidos políticos.

Em 1997, a Lei 9.504, em seu artigo 81, foi criada como uma forma de impedir o “abuso de poder”. Surgiu após os escândalos de corrupção do governo Collor e de seu auxiliar PC Farias, envolvendo sobras de campanha. Na lei, a doação de empresas para as campanhas eleitorais foi regulamentada e cada empresa passou a poder doar até 2% de seu lucro.

A lei regulamentou o direito de doação dos ricos, mas o que de fato ninguém se atentou é que, por outro lado, restringiu as doações dos trabalhadores. Cada eleitor passou a poder doar para uma campanha até 10% do valor que tenha recebido no ano anterior. Ou seja, quem ganha mais pode doar mais, quem recebe menos pode doar menos. As empreiteiras e as empresas de prestação de serviço que ganham milhões em seus contratos com o Estado, legalmente podem doar 2% de seus milhões.

Já operários metalúrgicos e da construção civil, empregadas domésticas e auxiliadores de escritório podem doar, no máximo, 10% de seus parcos salários.

Agora, quando Fernando Collor de Mello e Renan Calheiros estão de volta ao Congresso Nacional, para fazer companhia a personalidades como José Sarney, Paulo Maluf e Jaqueline Roriz; a legislação caminha cada vez mais no sentido de privilegiar os donos dos grandes capitais e sufocar a livre manifestação política dos setores mais explorados da sociedade.

A Lei da Ficha Limpa, por exemplo, chegou a reunir mais de 2 milhões de assinaturas. Mas acabou entrando para o folclore político nacional, quando sua validade para as eleições 2010 foi derrubada no Supremo Tribunal Federal, por 6 votos a 5, em março. Salvando desta forma, o mandato dos senadores João Capiberibe e Jader Barbalho.

Atualmente a prática e a lógica imposta pelo TSE primam pela legalização de uma campanha eleitoral totalmente mercantil. Mantém as polpudas doações empresariais e pune o trabalho voluntário e militante.

Caso uma empresa use 2% de seu lucro para financiar uma campanha e este seja gasto na contratação de cabos eleitorais, está tudo certo, tudo regulamentado, com recibo eleitoral e tudo. E se, no dia da eleição, o candidato vier a contratar os chamados “fiscais e suplentes” (na prática um disfarce para a compra de voto) também está tudo certo. Também não há nada irregular em um marqueteiro receber, em uma campanha eleitoral, mais do que um senador em todo seu mandato. Pode, sem problemas.

Nesta “democracia”, empresas podem dar carona de jatinhos a políticos, podem financiar suas campanhas, e receber benefícios depois que seus financiados são eleitos. Como um retorno ao investimento. Como rendimento de uma aplicação. Ouro? Dólar? Não rendem tanto quanto um governador ou um prefeito.

A OAB está entrando, corretamente, com uma ação de inconstitucionalidade contra esta lei que permite a doação por parte de empresas. Nós apoiamos esta iniciativa. Mas é necessário ir mais além.

Militantes políticos de causas sociais e que mantém seus ideais políticos estão sendo impedidos de doar sua militância e de fazer doações acima de 10% de sua arrecadação financeira no ano anterior, mesmo que isso seja permitido por lei e por resoluções do TSE.

Os candidatos da classe trabalhadora não podem produzir seus programas de televisão em garagens de suas casas e editá-los em casa com a ajuda de amigos.

Não se leva em conta as transformações ocorridas neste setor, com avanço tecnólogico nos equipamentos de vídeo e o barateamento dos preços, facilitando o acesso. Mais um pouco, jovens poderão ser proibidos de produzir os famosos vídeos virais, que têm sido uma das marcas da internet. Fenômenos eleitorais como o “DilmaBoy” ou o “SerraBoy”, teriam de ser registrados, catalogados, autorizados, impedindo assim a espontaneidade e a criatividade que são marcas da rede.

Os candidatos dos grandes partidos percorrem o país em jatinhos, dormindo em hóteis de luxo. Já os candidatos dos trabalhadores, que não recebem dinheiro de empresas, estão acostumados a dormir em casas de companheiros de partido, em um sofá, um colchão. Mas a Justiça Eleitoral não entende como isso pode funcionar. Como assim, emprestar a casa para um candidato, para que ele possa dormir? Que estranho. “Isso vale alguma coisa”, conclui, exigindo que isso seja registrado, vire “doação”.

Nos anos logo após o fim da ditadura, era comum que os trabalhadores emprestassem seus carros, já velhos, para transportar outros trabalhadores e candidatos para atividades de campanha. Hoje em dia, uma carona para uma panfletagem, uma carreata, como em outros tempos, nem pensar. O trabalhador que emprestar terá de prestar contas, como se tivesse alugado seu veículo para a campanha.

O absurdo chega ao ponto de atingir atividades simples, como panfletagens. Imagine que você, convencido pelo programa de TV, resolve se integrar na campanha de um candidato, visita o comitê e participa de uma panfletagem. Algo simples, não? Milhares de brasileiros e brasileiras já fizeram isso. Mas, atualmente, a Justiça Eleitoral não considera natural você querer distribuir panfletos na entrada de uma fábrica ou em uma praça para o seu candidato. Na lógica da Justiça Eleitoral, este trabalho, voluntário simplesmente não se encaixa. Trata-se de um trabalho, que deve ser remunerado. Nessa lógica não cabe pessoas se apaixonando por idéias. Apenas cabos eleitorais, cuja atividade deve ser contabilizada, como um dia ou horas de trabalho.

Perseguição a militantes
Hoje em dia, em meio a tantas campanhas mercantis, onde impera a lei “do levar vantagem em tudo” causa estranhamento para a Justiça Eleitoral uma campanha voluntária. E, por isso, pretende-se criminalizar esse tipo de campanha. Mas, cabe ressaltar que, formalmente, este tipo de campanha voluntária, não é algo ilícito. Mas, na prática, está sendo condenada. E pior, os militantes, que atuam de maneira voluntária, podem ser criminalizados e multados.

Pela lei – o Art. 16 da Resolução 23.217/2010 do TSE – as doações por trabalho militante, não financeiras, não devem ser contabilizadas entre os 10% que os trabalhadores podem doar. Mas, mesmo que a lei diga que este tipo de atividade sejam somente controladas e contabilizadas pela referência “Doação Estimável em Dinheiro”, o Ministério Público e a Justiça Eleitoral resolveram desencadear um verdadeiro ataque contra a militância voluntária.

Quebraram o sigilo fiscal de doadores militantes das campanhas eleitorais e estão processando vários dirigentes e militantes em todo Brasil. São processados inclusive estudantes que, por não terem renda, são considerados impedidos de “doar” para a campanha. Ou seja, somente é possível “doar” aquele que tem renda, em um retorno ao século XIX e ao voto censitário.

Militantes históricos, que tenham feito qualquer atividade voluntária nas campanhas, estão sendo processados. E partidos, como o PSTU, acusados de “Abuso do poder econômico”.

Desde os que panfletaram, diagramaram panfletos, advogaram, emprestaram os seus carros, nenhuma militância voluntária fica impune diante da cega injustiça. Enfim, enquanto tudo é permitido aos candidatos ligados ao grandes empresários e empreiteiras, aos trabalhadores excedem-se os rigores e distorções da lei.

O PSTU não aceita financiamento de campanha por parte de empresas e de grande empresários. Todos os militantes fazem campanha voluntariamente, sem entrar nos esquemas de cabos eleitorais, marqueteiros, e da lógica mercantil da campanha.

Chega a ser ridículo acusar o PSTU de cometer “abuso de poder econômico”. Este partido pobre que somente recebe doações de trabalhadores. Sendo a sua uma das campanhas eleitorais que menos gastou nas últimas eleições.

Infelizmente, este ataque vai além do patético. Representa uma ameaça real a militância voluntaria. Caso as multas venham a ser aplicadas, significa que militantes que recebem salário mínimo podem ser condenados a pagar multas de mais de R$ 25 reais.

Isto significa criminalizar a militância voluntária e ataca a legalidade do PSTU. Torna ilegal toda a campanha baseada nas forças dos próprios trabalhadores. Mantendo na legalidade as campanhas que se baseiam no financiamento de empreiteiras e bancos, que compram votos com cabos eleitorais e vendem influências nos governos de turno.

A conquista da democracia foi um passo fundamental na história do Brasil. Mas está democracia que está aí não atende aos interesses dos trabalhadores. É uma democracia que somente beneficia os ricos. É a democracia dos ricos e de seus representantes.

LEIA TAMBÉM

  • Comunicado do PSTU-SP sobre decisão do TRE