Bernardo Cerdeira, de São Paulo (SP)

Segundo artigo da série “Crise e degeneração do PT”, lançada na edição Nº 495 do jornal Opinião Socialista. O objetivo é oferecer ao nosso leitor uma análise sobre a história e as origens da falência do projeto petista.

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3º ARTIGO: Por que o PT se envolveu na corrupção

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1º ARTIGO: A falência de um projeto: governar o Brasil como uma potência capitalista com pequenas reformas sociais

Diante do desgaste crescente do governo Dilma, dos escândalos de corrupção e da crise do PT, a principal defesa da direção desse partido é sustentar que, durante seus governos, a vida dos trabalhadores melhorou. No entanto, apesar de ter havido benefícios para alguns setores por um breve período, no final tudo não passou de uma miragem que está sendo desfeita pelo próprio governo.

Durante anos, o PT vendeu a ilusão de que seria possível para os trabalhadores melhorar de vida de forma permanente e constante dentro do sistema capitalista, desde que o mesmo fosse humanizado com políticas de distribuição de renda promovidas pelo Estado. Obviamente, sob a administração de governos petistas e seus aliados.

Assim, a classe trabalhadora não teria necessidade de travar uma luta duríssima para conquistar e defender seus direitos e melhorar seu nível de vida contra a crescente exploração da burguesia. Também não precisaria se organizar coletivamente para isso. Seria suficiente seu esforço individual para ascender, com o apoio do Estado e com a benesse dos capitalistas. No plano político, bastaria votar no PT.

No governo, as medidas de distribuição de renda foram dirigidas aos setores mais pobres da classe trabalhadora com as chamadas políticas sociais compensatórias (Bolsa Família, Luz para Todos, Mais Médicos, entre outras). A segunda vertente dessa política foi a de facilitar o crédito, incentivando o consumo das famílias trabalhadoras. Parte importante desse incentivo foi o crédito imobiliário pelo programa Minha Casa, Minha Vida.

Outra política foi a de incentivar o desejo natural dos trabalhadores de fugir de sua condição de assalariados para ter seu próprio negócio. Para isso, o governo estimulou o empreendedorismo, facilitando o crédito aos pequenos e microempresários. No mesmo sentido, procurou atender à aspiração de ascensão social através do acesso à educação universitária, facilitando o crédito estudantil pelo Fies e o ProUni.


Fim de uma ilusão…
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Por que dizemos que todas essas medidas eram parte de uma grande ilusão? Por um lado, boa parte delas, como o Bolsa Família, são paliativas, isto é, não resolvem o problema central da classe trabalhadora: não atacam a exploração capitalista e nem sequer garantem emprego, salário digno e direitos trabalhistas e sociais de forma duradoura. Além disso, podem ser revogadas pelo próximo governo.

Por outro lado, as medidas de crédito, além de comprometerem o orçamento das famílias trabalhadoras por anos, são permanentemente ameaçadas pelas crises econômicas que podem fazer com que os trabalhadores percam seus bens, seus esforços e até suas casas.

No entanto, durante um tempo, essas medidas pareciam funcionar. A situação econômica do país era estável devido, principalmente, ao alto preço internacional das matérias-primas, o que permitia ao governo sustentar estas políticas. Os ideólogos do PT criaram o mito de que estaria nascendo uma nova classe média. Nada mais falso: eram apenas trabalhadores que puderam consumir durante um breve período à custa de se endividarem. Com a crise econômica, essa ilusão, definitivamente, acabou.


Ajuste fiscal: o PT contra os trabalhadores
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Ao atingir o Brasil em cheio, a crise econômica mundial mostrou a verdadeira cara do PT. Seu discurso é de defesa dos trabalhadores, a favor de reformas para melhorar seu nível de vida. Sua política concreta, porém, é a favor dos capitalistas e contra os trabalhadores. Isso se vê, hoje, nas práticas do governo.

Os capitalistas exigiram do governo Dilma um duro ajuste fiscal, o que significa que os trabalhadores devem suportar o custo da crise com a perda de direitos sociais duramente conquistados, aumento da inflação e desemprego. Essa é a política mundial do imperialismo. Que o digam, por exemplo, os trabalhadores da Grécia, da Espanha, de Portugal e de toda a Europa.

O PT não só concordou totalmente com essa política de ajuste como se tornou o principal gerente-executivo da sua aplicação, ou seja, o agente da política do imperialismo. Dilma nomeou um banqueiro, Joaquim Levy, homem do Bradesco, como ministro da Fazenda, para aplicar o ajuste com total apoio da presidente.

A direção do PT, incluindo o próprio Lula, argumenta que o ajuste é um sacrifício necessário. Segundo eles, num momento de dificuldades econômicas, é preciso fazer como as famílias que passam por situações difíceis: cortar despesas para colocar as finanças em ordem e poder prosperar de novo quando o pior passar.

O problema é que essa comparação é uma farsa para dar a impressão de que todo o país está fazendo sacrifícios para superar a crise. Pura mentira. Não há ajuste para os ricos. Os bancos e o agronegócio mantêm lucros fabulosos. As montadoras e outras empresas se beneficiaram de isenções de impostos e mantiveram seus lucros. Os únicos que estão sofrendo com o ajuste do PT e dos capitalistas são os trabalhadores e o povo pobre.

 

Duros ataques…
As medidas provisórias 664 e 665 promovidas pelo governo afetam principalmente os jovens e as mulheres trabalhadoras. Os cortes e as dificuldades para conseguir o Fies prejudicam os estudantes que acreditaram e se endividaram para tentar conseguir um título universitário. O governo aumentou as tarifas de luz em mais de 40%. O aumento do preço da gasolina e dos derivados de petróleo incide sobre todos os produtos e penaliza a população. Os cortes em saúde, em educação e nas obras do PAC provocam milhares de demissões.

Como se não bastasse, são os trabalhadores que pagam pela corrupção. O escândalo da Petrobras, além de mostrar o roubo descarado de dinheiro público pelos partidos da base aliada e pelo cartel das empreiteiras, também levou à crise da estatal, à paralisação de obras e à demissão de milhares de trabalhadores, como no caso do Comperj no estado do Rio.

O Congresso Nacional, dirigido hoje pelo PMDB de Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e de Renan Calheiros, presidente do Senado, soma-se a este ataque. A Câmara aprovou o Projeto de Lei das terceirizações, que vai trazer a demissão de milhões de trabalhadores e a contratação de terceirizados por salários muito inferiores. Os deputados do PT votaram contra o PL, mas o governo Dilma, que tem o peso decisivo no assunto, não tomou uma única atitude contra o projeto, se limitando a garantir que o texto não implicasse perdas fiscais para o Estado.

 

Não existe capitalismo humano
Os trabalhadores precisam chegar a algumas conclusões urgentes sobre a situação atual. A primeira delas é que as medidas de distribuição de renda, defendidas pelo PT como um grande avanço, além de não resolverem o problema fundamental da classe trabalhadora, foram pequenas, frágeis e temporárias. Mesmo assim, só foram possíveis porque houve uma conjuntura econômica favorável.

A segunda conclusão é que, quando as condições do capitalismo mudam e sobrevêm crises econômicas, essas pequenas melhoras na distribuição de renda são destruídas pelos capitalistas e pelos políticos a seu serviço. Como bons defensores do capitalismo, são os governos do PT que estão atacando as mesmas medidas que eles juraram defender.

Mas a conclusão mais importante é que, ao contrário do que diz a direção do PT, a raiz do problema da classe trabalhadora não está na distribuição desigual da riqueza, embora ela seja cada vez mais brutal e injusta. A explicação para a situação da classe trabalhadora no capitalismo, incluindo a exploração e a desigualdade, reside no fato de que os meios de produção e distribuição da sociedade (fábricas, terras, infraestrutura, bancos) são propriedade privada dos grandes capitalistas.

A lógica de um sistema de produção de mercadorias baseado nesse tipo de propriedade é que haja uma tendência inevitável à acumulação e concentração de capitais, (ou seja, a eliminação dos mais fracos), e ao aumento da desigualdade. Pode haver uma melhora temporária, mas, quando vêm as crises, produz-se, inevitavelmente, uma redução da renda nacional. A burguesia aumenta a exploração para preservar seus lucros e destrói as políticas distributivistas anteriores.

Portanto, ao contrário do que o PT sempre pregou, a desigualdade não se resolverá com pequenas melhoras na distribuição de renda. A desigualdade só acabará com a expropriação dos meios de produção que hoje estão nas mãos dos grandes capitalistas, transformando-os em propriedade coletiva, gerida por um governo dos trabalhadores e do povo pobre.

Por último, é preciso dizer que as ilusões difundidas pelo PT tiveram um efeito nefasto para os trabalhadores. Fizeram retroceder tremendamente sua consciência de classe, isto é, a consciência da sua inevitável situação de escravo assalariado dentro do sistema capitalista e da necessidade de organizar uma luta política como classe para acabar com este sistema.


A luta independente dos trabalhadores é a solução
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As conclusões anteriores não significam que os trabalhadores não devam lutar contra a desigualdade. Ao contrário, essa luta é fundamental para garantir a sobrevivência da classe trabalhadora. A defesa de melhores salários e postos de trabalho é um exemplo disso. O mesmo vale para a defesa de todas as conquistas da classe por menores que sejam.

O problema é que estas melhoras e conquistas só podem ser defendidas com muita luta e não com medidas supostamente bondosas que os capitalistas concedem com uma mão e tiram com a outra. E, principalmente, essa luta deve ter um objetivo: que a classe operária chegue ao poder e implante um governo de trabalhadores que acabe não só com a desigualdade, mas, definitivamente, com este sistema de exploração.

Uma luta conduzida dessa forma exige uma forte organização dos trabalhadores em sindicatos combativos e num verdadeiro partido dos trabalhadores, socialista, revolucionário, democrático e independente dos patrões. Exatamente o contrário do que representa o PT.