Bombeiros tentam apagar o fogo
Agência Cromafoto

Após dois meses de uma reforma que custou R$ 19 milhões, o aeroporto de Congonhas, em São Paulo, está sendo palco de uma tragédia que acaba de bater um triste recorde: o maior desastre aéreo do país, superando as mais de 150 mortes do acidente com o vôo 1907 da Gol. O Airbus 320 da TAM, que fazia o vôo JJ 3054, partiu de Porto Alegre às 17h16 e não conseguiu aterrissar na pista recém-inaugurada do aeroporto paulista.

As primeiras informações indicam que o piloto teria tentado pousar, por volta das 18h50, quando o avião derrapou na pista molhada e atravessou a avenida Washington Luiz, se chocando ao prédio da TAM Express, o escritório de carga da companhia. A empresa informou que havia 186 pessoas dentro da aeronave, entre passageiros, tripulantes e funcionários. A possibilidade de existirem sobreviventes é praticamente nula. Com as vítimas em solo, o número de mortos deve passar dos 200. Segundo os bombeiros, a temperatura no interior do prédio da TAM Express pode ter chegado a mais de 1.000ºC.

Primeiras denúncias indicam que a pista do aeroporto de congonhas foi liberada sem as devidas condições para decolagem e pouso. Provavelmente, o avião tenha derrapado pela falta do grooving, uma espécie de friso de segurança para escoar a água, segundo informou a Rádio Gaúcha.

Essa foi a terceira derrapagem em dois dias. Na segunda-feira, um avião menor, da companhia Pantanal, e outro da TAM, já haviam derrapado. Mesmo diante de inúmeras evidências, porém, TAM, Infraero e governos, via grande imprensa, afinam o discurso de que poderia ter sido falha do piloto, que não teria reduzido a velocidade do avião no momento do pouso.

E agora, a culpa é de quem?
Em setembro de 2006, um choque entre o vôo 1907 da Gol e um Legacy, dos Estados Unidos, deixou mais de 150 mortos e abriu uma crise sem precedentes no sistema aéreo brasileiro. Os controladores de vôo, pressionados a assumir a culpa pela tragédia, passaram a denunciar as péssimas condições de trabalho e a defasagem dos equipamentos.

A postura do governo foi “exemplar”: negou a existência de problemas técnicos e puniu os controladores de vôo que ousaram denunciar o problema. Em entrevista à imprensa no final de junho, Lula desconsiderou todos os alertas para a situação de risco do sistema aéreo. “Em todas as conversas que tive com Saito, ele me assegurou que o sistema brasileiro é um dos mais modernos do mundo, um dos mais sofisticados do mundo. Não existe possibilidade de ficar passando terrorismo para a sociedade”, disse. Agora, menos de um mês após a irresponsável declaração, o terror pairou sobre Congonhas.

Em menos de um ano, já são quase 400 vítimas fatais em acidentes aéreos. Além dos dois grandes desastres – da Gol e da Tam – outros pequenos acidentes ocorrem com freqüência na pista principal de Congonhas, antes e depois da reforma. Dessa vez, entretanto, está difícil atribuir a culpa aos controladores de vôo ou a falha humana. Um especialista em Direito Aéreo, Carlos Paiva, confirmou em entrevista à TV Cultura: “falha humana é muito mais difícil, pois o avião pousa praticamente sozinho”.

A corrupção mata
Para completar o quadro da vergonha, no meio da crise aérea, houve denúncias de corrupção na Infraero, órgão que administra os aeroportos do país. A direção da Infraero, segundo denunciou uma empresária à revista Isto É, comanda um esquema de desvio, superfaturando obras em valores que podem ter chegado a 375%. O dinheiro desviado servia para financiar campanhas do deputado e ex-presidente do órgão, Carlos Wilson (PT-PE), e do próprio presidente Lula.

Uma pista sem grooving, alguns milhões no bolso dos corruptos e centenas de mortes. O aeroporto de Congonhas, após R$ 19 milhões, não resistiu às primeiras chuvas.

Esse não foi mais um acidente ocasional. Foi uma tragédia com autor e colaboradores. Uma tragédia planejada. Situação idêntica aconteceu em janeiro, nas obras da Linha 4 do Metrô de São Paulo. Um equipamento – o “tatuzão” – substituído por outro mais barato e uma série de “gambiarras” fez desabar a futura estação Pinheiros. Hoje, sete meses depois, as únicas punidas foram as vítimas e as pessoas que moravam no entorno e perderam tudo o que tinham.

Essas tragédias, longe de serem acidentes naturais, como tentam provar as autoridades, são efeitos do avanço da privatização e da terceirização dos serviços públicos, do descaso com que as empreiteiras executam as obras. Não é acidental, também, que as grandes empreiteiras estejam envolvidas nos maiores escândalos de corrupção do país.

Os culpados têm nome
Essas tragédias continuarão acontecendo. O grande mentor é Lula. Ele preparou este desastre cada vez que virou as costas aos controladores, cada vez que mandou punir o movimento e quando chamou as Forças Armadas para reprimir a categoria. Lula preparou o acidente quando defendeu a militarização do setor.

Esse acidente foi preparado em cada escândalo de corrupção, em que milhões são desviados e faltam “ranhuras” nas pistas dos aeroportos. Foi possibilitado por todos os bilhões que são desviados para pagar a dívida externa e que deveriam ser investidos em infra-estrutura no país.

Esse acidente e muitos outros são planejados a cada dia nos corredores do Planalto, por Renans e Rorizes, por empreiteiras e pela utilização dos serviços públicos como moeda de troca para manter a base de sustentação do governo. São culpados, também, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), e o prefeito da capital paulista, Gilberto Kassab (DEM), que, em níveis estadual e municipal, aplicam a mesma política de precarização e terceirização dos serviços públicos. Foi, afinal, o PSDB, que agora faz demagogia ao dizer que alertou para os riscos de Congonhas, o responsável principal pelo desabamento da obra do Metrô. Esses partidos iniciaram o desmonte do setor público no Brasil e são protagonistas de grandes escândalos de corrupção tanto quanto o PT de Lula.

A próxima tragédia pode ser evitada
Espera-se que, diante de fato de tal gravidade, o governo revogue as punições aos controladores de vôo – que nunca deveriam ter sido punidos, mas ouvidos e atendidos em suas reivindicações. É urgente, ainda, a desmilitarização do tráfego aéreo para que esse possa ser controlado pelo Estado e diretamente por aqueles que trabalham no setor e convivem diariamente com os problemas e falhas existentes.

Assim, não é possível que as investigações fiquem por conta dos principais responsáveis pelo desastre. É necessário que haja uma investigação que independa das companhias aéreas, do governo e da Infraero, levada adiante por representantes das vítimas e por entidades como os sindicatos dos controladores de vôo e dos aeronautas.

Uma investigação não será séria se não forem abertos os sigilos bancário e fiscal de todos os envolvidos no escândalo de corrupção da Infraero, que devem ser presos e ter seus bens confiscados. Do contrário, sem estas e outras medidas, este será mais um episódio sem desfecho, aguardando a próxima tragédia.

Atualizada em 18/7/2007, às 22h08