LIT-QI

Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional

Alejandro Iturbe

A situação política venezuelana está cada vez mais aguda e, ao mesmo tempo, se acirram também os debates dentro da esquerda latino-americana e mundial sobre a política a ser adotada nessa situação. Em linhas gerais, se apresentam duas posturas: uma de apoio e defesa do governo de Maduro e o regime chavista (majoritária, se consideramos o número de organizações) e outra de oposição a eles. Por sua vez, em cada um desses “blocos” existem diferentes razões, vinculadas a distintas estratégias.

Como desenvolvemos em inúmeros artigos e trabalhos durante anos e em várias publicações recentes1, nós, da LIT-QI, sempre nos colocamos na oposição de esquerda ao chavismo, em defesa dos interesses da classe operária. Isso nos ocasionou ser acusados, reiteradas vezes, de “agentes do imperialismo” e de “sermos úteis à direita”. Os trotskistas estamos acostumados a este mecanismo (generalizado pelo estalinismo no século XX) de tentar ocultar os conteúdos dos debates por meio de insultos ou epítetos, e respondemos com análises e raciocínios marxistas, respaldados pelos fatos.

Por isso, sem abandonar nossa oposição de esquerda ao chavismo, defendemos o governo de Chávez, incentivando ativamente as mobilizações operárias e populares, quando a coalizão do imperialismo com a burguesia tradicional venezuelana tentou derrubá-lo em 2002. E também encorajamos e interviemos na ação operária que desmontou o locaute patronal nos meses seguintes. Nesse processo, os trabalhadores tomaram as fábricas e refinarias e colocaram-nas para funcionar, sob o controle operário. E se a ameaça de Trump de agressão militar se materializar, não hesitaremos um segundo sequer em incentivar esta política novamente.

O castro-chavismo
O primeiro lugar na defesa do governo Maduro é ocupado pela corrente que denominamos castro-chavista. Isto é, o reagrupamento de alguns partidos comunistas latino-americanos, e setores afins, que tomam como referência os governos de Cuba e da Venezuela.

Para eles, o “socialismo do século XXI” está sendo construído na Venezuela, e o que está colocado é a defesa dessa revolução contra um processo de mobilização fascista e contrarrevolucionário, que quer destruí-lo. Portanto, defendem incondicionalmente o governo, todas as suas medidas e manobras (como a recente Constituinte) e também a duríssima repressão contra as mobilizações da oposição.

Nos diferentes artigos que citamos, analisamos e demonstramos que, na Venezuela, não houve nenhuma construção socialista ou um avanço apontando para ela. Que, de qualquer plano a partir do qual se analise a realidade (o conteúdo profundo das Constituições aprovadas nestes anos, o funcionamento da economia, o papel do Estado, etc.), tratava-se de um processo burguês até os ossos. E que o “socialismo do século XXI” era apenas um “discurso vermelho” para encobrir esta realidade.

O principal beneficiário desta economia capitalista dentro da Venezuela é a “boliburguesia” (ou burguesia bolivariana), nascida como parasita do aparelho do Estado, especialmente os membros e ex-membros da cúpula das forças armadas. Sua acumulação capitalista deriva da intermediação dos negócios do petróleo no exterior, da corrupção aberta nos contratos públicos, e das fraudes com o mercado de câmbio. Com este enriquecimento, os novos burgueses passaram a comprar ou construir empresas.

O grupo mais forte é o de Diosdado Cabello, ex-oficial de alta patente das forças armadas e um dos principais dirigentes do PSUV. Atualmente, é o segundo grupo empresarial do país (possui bancos, indústrias e empresas de serviços). Um segundo grupo importante é de propriedade de Jesse Chacón, também oficial aposentado (possui um banco, uma fábrica de leite em pó e fazendas). Existem, ademais, outros grupos controlados por ex-militares. A eles devemos agregar empresários e banqueiros que se aproximaram do chavismo e assim aumentaram suas fortunas (Alberto Cudemus, presidente da Federação dos criadores de porcos, Feporcina; Alberto Vollmer, dono da empresa de rum Santa Teresa; Miguel Pérez Abad, presidente da Federação de Pequenas e Médias Empresas, Fedeindustria, e funcionário do governo; e Víctor Vargas Irasqüín, do Banco Ocidental de Desconto; entre outros). E, em negócios menores, muitos militares em atividade, que estão diretamente ligados ao tráfico de alimentos.

Esta boliburguesia mostra ostentosamente sua riqueza, com automóveis, casas luxuosas e festas de altíssimo nível, contrastando com a situação social desesperadora e a miséria das massas venezuelanas. Neste contexto, falar de “defesa do socialismo” é um deboche muito cruel. Ao outro aspecto das posições deste setor (o suposto golpe fascista em curso), vamos nos dedicar mais profundamente nos próximos pontos.

O reformismo e o neorreformismo pró-Maduro
Em uma segunda linha de defesa e apoio ao governo Maduro situa-se a maioria das organizações de esquerda reformistas e neorreformistas. É o caso do PT e da maioria do PSOL brasileiros, do Podemos (Estado espanhol) e Die Linke (Alemanha).

Estas correntes abandonaram, há muitos anos, a luta pelo poder operário e o socialismo. Consequentemente, também abandonaram qualquer tentativa de análise e definição marxista e de classe dos Estados, regimes políticos e partidos. Para encobrir seu apoio e defesa de governos burgueses (quando não os encabeçaram diretamente, como no caso do PT brasileiro), definem os processos políticos sob a dicotomia de “progressistas ou reacionários” (tal como fez o estalinismo).

Com esse enfoque falso, apoiam agora o governo “progressista” de Maduro “contra a reação e a direita”. Defendem assim a terrível realidade capitalista e corrupta do regime chavista e do governo Maduro, caracterizando que as massas que romperam com eles e os confrontam (80% da população, segundo pesquisas independentes) foram “ganhas pela reação”. Ao mesmo tempo, tornam-se cúmplices da repressão do governo antidemocrático venezuelano, que já provocou mais de 100 mortos e centenas de presos. Desta forma, fazem o jogo da propaganda da imprensa burguesa e imperialista, quando afirmam que a Venezuela demonstra o “fracasso do socialismo e das propostas da esquerda”. Um verdadeiro crime político, que deve ser combatido com toda força.

Uma defesa mais elaborada
Ao “círculo dos defensores de Maduro”, agregam-se também correntes que se dizem trotskistas, como o CWI (siglas em inglês do Comitê Internacional dos Trabalhadores) e o MAIS brasileiro (surgido de uma recente ruptura do PSTU)2.

Estas correntes elaboram um raciocínio mais complexo e sofisticado, mas chegam à mesma posição das organizações anteriores. Queremos nos deter especialmente nos argumentos do MAIS, porque pretende justificá-los com falsificações das elaborações de Nahuel Moreno.

Quem expõe com maior clareza estes argumentos é Valério Arcary, principal figura pública do MAIS3. Ele expressa: “Não apoiamos a retórica do socialismo do século XXI” (…) “O governo de Maduro é um governo burguês, apoiado em uma fração burguesa minoritária em formação, a ‘boliburguesia’”. Que este governo “se apoia em um regime bonapartista sustentado, crescentemente, pelas Forças Armadas”. Por isso, “Maduro não merece nenhum apoio político”. Até aqui, coincidimos com ele.

Mas, depois, começa seu giro para a defesa desse governo e nos diz: “é um governo independente”, por isso é atacado pelo imperialismo e o setor mais ultrarreacionário da burguesia venezuelana, que querem derrubá-lo para se apropriar dos riquíssimos recursos petrolíferos do país. Então, “a questão central da análise sobre a Venezuela me parece ser o reconhecimento do perigo real e iminente de um golpe ou não”. A essa alternativa, responde: “a luta contra o golpe passou a ser central”.

Nesse contexto, os revolucionários deveriam se localizar “no campo político-militar do governo Maduro contra o golpe” e estimular uma “frente única” contra ele. Em outras palavras, Valério Arcary apresenta-nos a situação atual como essencialmente igual à de 2002, que colocava a necessidade de defender o governo de Chávez. Mas a verdade é que tais realidades são completamente diferentes e, em muitos aspectos, opostas.

O raciocínio de Valério Arcary contém toda uma série de erros, porque se equivoca inclusive nas táticas que deveriam ser aplicadas se a situação fosse realmente aquela que ele caracteriza. Vejamos com mais profundidade.

Um governo independente?
O primeiro erro é definir que na Venezuela existe “um governo independente”. Nesta caracterização, Arcary tenta se apoiar nas elaborações de Nahuel Moreno da década de 1980, apresentadas em congressos e reuniões da direção da LIT-QI4, nas quais retoma elaborações de Lenin, Trotsky e suas próprias. É necessário ressaltar que Moreno não pôde precisar cuidadosamente estas definições (morreria poucos meses depois) e que elas devem ser associadas a outras elaborações dele.

De modo resumido, Moreno analisava que, além dos Estados operários, o mundo estava dividido majoritariamente entre um pequeno grupo de países imperialistas e uma grande maioria de nações dominadas. Mas que, nesse cenário, existiam alguns poucos “países independentes”, surgidos de circunstâncias excepcionais: guerras anticoloniais vitoriosas e certas revoluções triunfantes contra ditaduras, dirigidas por direções pequeno-burguesas ou nacionalistas burguesas independentes e que tinham destruído as forças armadas do regime anterior.

A partir daí, [estas direções] construíram ou reconstruíram Estados, regimes e governos burgueses que, por sua gênese, eram relativamente independentes ou autônomos em relação ao imperialismo (enfatizamos o conceito de “relativamente”) e, em muitos casos, o imperialismo lhes atacava. Naquela época, essa categoria incluía países como Argélia, Líbia, Nicarágua, Irã e Angola.

Como governos burgueses, são inimigos dos trabalhadores e deveriam ser combatidos. Mas, como “países independentes”, nós os defenderíamos dos ataques do imperialismo, especialmente se este tentasse derrubá-los. É nesta definição que Valério Arcary tenta se apoiar para justificar sua posição política atual.

“Esquece”, no entanto, um aspecto central que Moreno enfatizou com nitidez: esta categoria de “país independente” é extremamente instável e transitória, porque seus governos corroem continuamente tal independência. Por essa razão, referindo-se à Líbia e a seu líder daqueles anos, Moreno assinalou:

Kadafi é um cavalo de Troia contra a independência. Pois, enquanto não se avança na expropriação da burguesia e na implantação de um Estado operário e uma economia planificada, o perigo de que a crise leve a burguesia independente a se submeter à dependência política do imperialismo sempre existirá. Toda a política da pequeno-burguesia ou da burguesia nativa à frente desses Estados leva sempre à perda da independência, a um beco sem saída: para manter a independência, devem avançar ao socialismo, mas não querem ir nessa direção”.

O curso posterior desses países e a transformação da maioria desses governos em agentes do imperialismo (em muitos casos também em regimes ditatoriais) confirmaram plenamente esta consideração de Moreno.

O que aconteceu na Venezuela?
Existe uma diferença muito importante entre os processos que deram origem aos “países independentes” analisados por Moreno e o processo que levou o chavismo ao poder. Na Venezuela, existiu sim um processo revolucionário, aberto com o Caracazo de 1989. Mas o chavismo não foi sua direção (pelo contrário, Chávez, nesse momento, foi parte dos repressores) nem acedeu ao poder como resultado direto dessa revolução. Em materiais anteriores, analisamos:

Para a maioria das correntes de esquerda que reivindicam o chavismo, seu triunfo eleitoral e posterior governo são o produto direto do Caracazo e do ascenso que o sucedeu, isto é, sua genuína e progressiva expressão política. Para nós, ao contrário, sendo um subproduto do ‘Caracazo’ e do ascenso, o chavismo é um movimento da segunda linha da oficialidade militar, que cavalgou sobre o ascenso para freá-lo ou, ao menos, controlá-lo, para que não transbordasse rumo à revolução socialista e, essencialmente, para fechar a fratura das Forças Armadas e assim reconstruir plenamente o Estado burguês”.

Ou seja, o chavismo não apenas não destrói as forças armadas burguesas, como as recompõe e fortalece. Desde o início, acentuou-se este aspecto regressivo contra a revolução e, portanto, seu grau de independência sempre foi muito menor que o dos outros processos.

Mas, além desta consideração, é verdade que Chávez teve confrontos reais com o governo de George Bush e que este tentou derrubá-lo (junto à burguesia tradicional da Venezuela), por meio de um golpe e do locaute patronal em 2002. Naquele momento, aplicavam-se as considerações de Moreno e cabia lutar pela defesa do governo de Chávez, como fizeram a LIT-QI e seus militantes na Venezuela.

Mas, desta época até hoje muitas águas rolaram e a situação é totalmente diferente. Após o fracasso do golpe e do locaute houve uma mudança central. Por um lado, Chávez perdoou os golpistas, fortaleceu as forças armadas burguesas e deu-lhes grandes privilégios econômicos, reconciliando-se com vários grupos econômicos que apoiaram o golpe (como Cisneros e Polar-Mendoza). Mudou toda a cúpula das forças armadas e integrou-a com generais que lhes eram totalmente fiéis, aos quais cedeu proveitosos negócios. É a mesma cúpula que se mantém com Maduro.

Por outro lado, o imperialismo estadunidense mudou sua política golpista e passou à “coexistência” com os governos chavistas, aproveitando para fazer bons negócios, especialmente na exploração do petróleo. A boliburguesia começou até mesmo a fazer investimentos em empresas e propriedades nos EUA. Ao mesmo tempo, o imperialismo apoiou a oposição de direita, para capitalizar eleitoralmente o desgaste dos governos chavistas e reconquistar o governo mais tarde. Ou seja, enquadrou sua política na tática que chamamos “reação democrática”. É bom lembrar que Chávez governou por catorze anos e Maduro já está há quatro.

[A reação democrática] É uma política que começou a ser aplicada desde 1976 (com o governo de Jimmy Carter, após a derrota ianque na guerra do Vietnã) e que se apoia nos mecanismos da democracia burguesa (eleições, parlamentos, etc.) para controlar e desviar as revoluções. É uma tática diferente para conquistar os mesmos objetivos de dominação, adequada a uma realidade mais difícil para o imperialismo. Depois da derrota da política bem mais agressiva de Bush (no Iraque e Afeganistão), Obama retomou-a plenamente. Trump tem uma política mais oscilante, mas a “realidade” obriga-o a não a abandonar.

A prova dos fatos
Para avaliar se a Venezuela e o governo de Maduro são “independentes”, é necessário sair de sua retórica e submetê-lo à “dura prova” dos fatos (isto é, de sua política real).

O centro da economia venezuelana é a extração de petróleo e, na década de 1970, o governo de Carlos Andrés Pérez criou a PDVSA como monopólio estatal. A realidade é que, em todos os seus governos, o chavismo intensificou em muito a “abertura petrolífera” iniciada na década de 1990 por Rafael Caldera. Por meio das empresas mistas em associação com a PDVSA ou de concessões diretas de exploração, as empresas estrangeiras (desde a estadunidense Chevron até a Petrochina) controlam 50% do petróleo e do gás venezuelanos. No caso da chamada Faixa do Orinoco (no leste do país), [o chavismo] outorgou-lhes o controle de partes inteiras do território. Nessa região, além disso, está entregando a exploração mineira.

Em segundo lugar, esses governos pagaram pontualmente (às vezes antecipadamente, na época de Chávez) a enorme dívida externa venezuelana e seus juros. Até mesmo no meio da agudíssima crise social vivida pela maioria dos venezuelanos, o próprio presidente Maduro informou há pouco tempo que “A Venezuela pagou 60 bilhões de dólares em compromissos internacionais durante os últimos dois anos”5.

Entrega do petróleo a empresas estrangeiras e pagamento da dívida externa às custas da fome de seu povo. Que diferença, do ponto de vista da verdadeira independência do país e das necessidades dos trabalhadores e o povo, há entre o governo “independente” de Maduro e outros declaradamente agentes do imperialismo, como Temer no Brasil ou Macri na Argentina? Na verdade, o que o governo de Maduro está fazendo é ainda pior, porque pagar a dívida externa hoje na Venezuela é condenar seu povo à fome. Nós não falamos figurativamente: famílias venezuelanas disseram-nos que, como resultado da situação, seus membros chegaram a perder até nove quilos de peso.

É uma verdadeira falsificação da realidade afirmar que a atual luta na Venezuela é entre um “governo independente” que defende (tão pouco) a soberania do país contra outros que querem se apoderar e entregar os recursos naturais, porque essa entrega já está sendo feita pelo próprio chavismo.

Qual é, então, a razão da disputa entre a boliburguesia e os setores burgueses representados na MUD? É a luta entre dois setores burgueses pelo usufruto da parte do lucro do petróleo que fica no país e no Estado. São dois projetos entreguistas que lutam pelo controle dessa entrega. Na melhor das hipóteses, têm apenas diferenças de quantidade, porque possivelmente a MUD está disposta a aumentar a percentagem de entrega do petróleo (pagar mais da dívida externa seria difícil) e eliminar definitivamente os já deteriorados programas sociais.

Qual é a verdadeira política do imperialismo?
Valério Arcary e todos os que defendem o governo de Maduro podem argumentar que, apesar disso, Trump ameaçou a Venezuela com ações militares em nome de uma hipócrita “defesa da democracia”. Nós repudiamos estas ameaças e, se as ações se concretizarem, não hesitaremos por um segundo em defender a Venezuela agredida, como afirma a recente declaração da LIT-QI.

O governo dos Estados Unidos até mesmo impôs sanções econômicas menores, como o bloqueio dos bens de Maduro nos Estados Unidos. Contudo, se Trump realmente quisesse atacar e isolar economicamente o governo venezuelano, simplesmente teria que parar de comprar petróleo venezuelano, e sua situação se tornaria insustentável.

É por isso que se torna necessário limpar o ruído e ver qual é a verdadeira política do imperialismo. Enquanto Trump atua publicamente com o papel de “policial mau”, sua política de fundo (e a do imperialismo) é pressionar Maduro para que faça um acordo com a MUD e permita eleições presidenciais e parlamentares que, provavelmente, seriam ganhas pela MUD. Foi a política que o ex-presidente espanhol Zapatero tentou negociar (em meio às eleições para a Assembleia Constituinte). Uma variante um pouco mais agressiva verbalmente, para impor a “reação democrática”.

O imperialismo aprendeu com o fracasso de sua política em 2002 (e o fracasso mais geral da política de George Bush no mundo). Agora aplica outra tática. Um de seus porta-vozes mais lúcidos, o New York Times, publicou um artigo explicando porque o governo dos Estados Unidos não intervém militarmente: isso poderia desencadear um “choque mais violento” no país e na América Latina. Essas “ondas de choque em todo o hemisfério poderiam criar mais complicações para o governo americano, no momento em que tenta se concentrar na Coreia do Norte e no Irã”.

É possível que, no futuro, caso Maduro e o chavismo não concordem com essa negociação, o imperialismo e a burguesia opositora de direita passem a um ataque mais decidido para derrubá-lo pela via armada? Claro que sim, ainda mais se tratando de uma figura bastante imprevisível como Trump. Nesse caso, estaria sim colocada para os revolucionários uma política como a de 2002 (defesa do país contra os ataques do imperialismo), e não hesitaríamos por um segundo em promovê-la e estar na linha de frente da luta. Mas essa não é a realidade atual, e se confundir nessa apreciação levará inevitavelmente a políticas totalmente equivocadas.

Quem está dando o golpe?
No entanto, os castro-chavistas e Valério Arcary têm razão quando dizem que um golpe está em curso na Venezuela. Mas aqueles que estão dando esse golpe são o governo de Maduro e o chavismo. Por que dizemos isto?

A crise econômica e a queda dos preços do petróleo colapsaram a base material do chavismo. A resultante política foi a ruptura dos setores populares que tradicionalmente apoiavam o chavismo. É por isso que, em 2015, a oposição de direita ganhou amplamente as eleições parlamentares (obtendo mais de dois terços das cadeiras). A partir daí, os elementos democráticos secundários tornaram-se um obstáculo para o regime chavista.

Foi então que começou o golpe. Maduro ignorou o Parlamento eleito, adiou as eleições para governadores (que seriam realizadas em dezembro de 2016) e impediu a convocação de um “referendo revogatório” (mecanismo previsto na Constituição chavista de 2004), apesar de obter as assinaturas previstas, porque Maduro sabia que seria destituído.

Nesse contexto, convocou uma “Assembleia Constituinte” que, na melhor das hipóteses, tem o apoio de 20% dos venezuelanos. Esta “Constituinte” se declarou como “poder supremo” da Venezuela, eliminou o voto universal para a eleição de parlamentares e distorceu completamente os critérios de representação. Tudo isso para transformar uma minoria em maioria. O governo de Maduro e o regime chavista são hoje totalmente minoritários. A instituição fundamental em que se apoiam passou a ser as forças armadas, e a “Constituinte” é apenas uma ferramenta para exercer esse domínio do Estado. Isso em relação às instituições. Em seu conteúdo profundo, é um regime para garantir a entrega do petróleo, o pagamento da dívida externa e os negócios da boliburguesia.

No cenário de uma situação social desesperadora para as massas (que estão literalmente passando fome) e com a boliburguesia ostentando sua riqueza, Maduro e o chavismo não podem se sustentar e impor seu golpe sem uma duríssima repressão: mais de cem mortos e centenas de presos e leis que criminalizam o protesto (como castigar aqueles que manifestem “ódio”). Junto desta repressão “oficial”, existem elementos crescentes de repressão paramilitar que provêm do governo e do regime: são os “coletivos”, grupos chavistas que reprimem as mobilizações e matam os opositores.

Com Valério Arcary, partimos de um elemento comum de caracterização: o governo de Maduro “se apoia em um regime bonapartista sustentado, crescentemente, nas Forças Armadas”. Este tipo de regime (bonapartista sui generis, para ser mais exato) foi caracterizado por Trotsky no México, no final da década de 1930, como a alternativa que as burguesias de certos países dominados pelo imperialismo construíam para conseguir um espaço maior de controle da economia. Era típico, por exemplo, dos “países independentes”, que Moreno analisava.

É um regime diferente do democrático-burguês já que, neste tipo de bonapartismo, as instituições centrais são (com diferentes graus de importância, dependendo do caso) o líder ou comandante, o partido-Estado e as forças armadas. Às vezes, elas se compatibilizam com instituições da democracia burguesa, como as eleições presidenciais e parlamentares. Mas estas sempre cumprem um papel secundário e coadjuvante e são utilizadas apenas diante da certeza de que o núcleo governante vencerá essas eleições. Em sua etapa de apogeu, a partir do apoio das massas, e, em sua decadência, por meio da fraude (quando não são diretamente eliminadas).

Mesmo em seu apogeu, os mais fortes destes movimentos (como o peronismo argentino ou o nasserismo egípcio) sempre tiveram um importante componente repressivo. Neste sentido, o chavismo não foi uma exceção: mesmo em seus “anos de glória”, quando Chávez era vivo, existem numerosos exemplos de repressão e assassinatos ao movimento operário e de massas.

O que vemos na Venezuela não é novo: é o processo de transformação regressiva destes movimentos nacionalistas burgueses e regimes bonapartistas sui generis que perdem todos os aspectos progressivos e, além de burgueses, tornam-se completamente corruptos, ditatoriais, repressivos e antidemocráticos. Já vimos isto, por exemplo, com Kadafi na Líbia e Assad na Síria. Em todos estes países, além disso, o apoio de massas que estes regimes tiveram, em algum momento, transformou-se em seu oposto: ruptura das massas com eles e luta para derrubá-los. Sobre a base de uma análise marxista, podemos dizer que é o curso inevitável destes movimentos se os trabalhadores não os derrubam e tomam o poder. É por isso que, na Líbia, apoiamos a luta contra Kadafi, e agora fazemos o mesmo contra Assad na Síria.

Uma metodologia equivocada
Valério Arcary se equivoca grosseiramente com o “campo de luta” que escolheu: chama a defesa de um “governo independente” que não existe e a luta contra o golpe errado. Mas, mesmo que sua localização estivesse correta, “passa longe” em suas propostas políticas para a situação: propõe-nos estar no “campo político-militar” do chavismo e formar uma “frente única” com o governo de Maduro.

Moreno (a quem Valério Arcary pretende reivindicar) dizia com absoluta clareza que se, por circunstâncias excepcionais (enfrentar um golpe militar, intervir em uma guerra civil, lutar para derrubar uma ditadura), devemos estar no mesmo campo militar ou lutar com setores ou governos burgueses, esta unidade é apenas circunstancial e transitória.

Sem abandonar, nem por um momento, o combate político contra eles, fazemos uma “unidade de ação” limitada no tempo definido pela luta. Foi o que os bolcheviques fizeram com Kerensky face ao golpe de Kornilov, os trotskistas com a burguesia republicana na guerra civil espanhola, ou os militantes da LIT-QI diante do golpe de 2002 contra Chávez. Neste aspecto, Moreno foi sempre muito direto: nunca, nunca, nunca… (nem mesmo nessas circunstâncias excepcionais em que devemos estar no mesmo campo militar) estamos no mesmo campo político que a burguesia nem formamos uma “frente única” com governos burgueses. Essa é a política do estalinismo, não a trotskista, nem a morenista.

Por trás dos erros grosseiros de Valério Arcary e do MAIS, há um problema bem mais profundo: eles também substituíram a análise marxista da luta de classes por um método no qual os processos são produzidos pelo confronto entre “campos progressivos” e “campos reacionários” permanentes. Ao eliminar ou subordinar a análise de classe à definição destes campos, a política proposta é de total capitulação, de “braço esquerdo” do setor burguês que integra o “campo progressivo”, ao qual conferem um “verniz de esquerda”.

Para este método e esta política, é sempre bom ter à mão um “golpe para enfrentar” porque esta situação serve para encobrir a capitulação. E se não há [um golpe], inventam. Por essa razão, no Brasil, precisaram inventar que a manobra parlamentar (prevista na Constituição que rege o regime democrático burguês brasileiro) que destituiu Dilma e levou Temer ao poder era um “golpe”, para justificar assim sua capitulação ao PT. A partir daí, sua política central foi sair em defesa do governo Dilma e depois justificar sua integração à Frente do Povo sem Medo e a Frente pelas Diretas Já (uma frente política que inclui o PT).

Na Venezuela, para justificar sua integração ao campo progressivo que definiram, são forçados a ignorar o verdadeiro golpe que Maduro e o chavismo estão dando e inventar um “golpe pró-imperialista”, que hoje não existe. Sejamos honestos, eles não são os únicos que fazem isto: estão acompanhados pela maioria da esquerda mundial, que adotou como próprio este método estalinista de raciocínio.

No entanto, não estamos discutindo problemas metodológicos ou políticos em abstrato. Estamos discutindo num contexto dramático de fome e miséria das massas venezuelanas e da feroz repressão aplicada por um governo e um regime bonapartista ditatorial. Ao definir sua localização no “campo político-militar” do governo Maduro e do regime chavista, Valério Arcary e o MAIS tornam-se cúmplices desta repressão e do golpe em curso. Fazem o mesmo que as correntes que defendem o regime de Assad na Síria, com o mesmo tipo de argumentos. Um papel muito triste para um dirigente e uma organização cujos membros eram, até recentemente, militantes revolucionários.

Os “nem-nem”
Ainda que seja breve, queremos nos referir a algumas organizações que se opõem à Assembleia Constituinte de Maduro e seu governo. Com estas organizações está colocada, obviamente, a possibilidade e a necessidade de realizar ações unitárias na Venezuela e no mundo. É importante que existam setores da esquerda que se opõem à ditadura de Maduro e que não endossam sua vergonhosa repressão. Nesse contexto, vemos contradições em suas abordagens e em suas propostas políticas.

Existe um setor que adota uma posição centrista (podemos chamá-la de “nem-nem”), expressado pelas organizações argentinas PO, PTS e Novo MAS, e suas correntes internacionais. O PTS tem uma organização irmã na Venezuela e, em um artigo recente de seu principal dirigente, chama a lutar contra o governo Maduro e a fraude da Assembleia Constituinte: “A ‘força’ do governo Maduro advém do grande apoio e sustentação das Forças Armadas, até agora incondicional, no âmbito de uma degradação bonapartista, sendo um ator crucial que acumulou interesses políticos e econômicos próprios que as colocam em uma posição absolutamente antagônica ao sofrimento cotidiano dos trabalhadores e do povo da Venezuela”6.

No entanto, como a principal força de oposição é a MUD (a qual qualificam corretamente como pró-imperialista e reacionária), não levantam como tarefa imediata a palavra de ordem “Fora Maduro e o regime chavista”, mas um chamado a “enfrentar ambos os bandos reacionários”. Embora convoquem corretamente para “lutar por uma alternativa independente dos trabalhadores”, sua proposta é abstrata, porque não propõe fazê-lo a partir da luta necessária contra a ditadura de Maduro, de modo a ficar como propaganda geral.

Nesse sentido, o PTS comete novamente o erro metodológico com o qual debatemos nos casos da luta contra Kadafi na Líbia e Assad na Síria7: confundir os processos progressivos de luta e as tarefas que surgem objetivamente deles com as direções que influenciam esses processos. Como lutar contra a “degradação bonapartista” do chavismo e sua “posição absolutamente antagônica ao sofrimento cotidiano dos trabalhadores e do povo da Venezuela” sem apresentar como tarefa imediata a derrubada desse governo e regime? Ao mesmo tempo, como combater a influência reacionária e pró-imperialista da MUD e construir “uma alternativa independente dos trabalhadores” se não disputamos a direção nas condições concretas em que a luta ocorre?

Este método do PTS (e das demais correntes que o compartilham) tem graves consequências políticas. Na Líbia, levou-os a abandonar o chamado à luta contra Kadafi e a caracterizar sua queda como uma “derrota do movimento de massas” porque os “rebeldes” se transformaram em “tropa terrestre do imperialismo”. Na Venezuela, ao não levantar o “Fora Maduro”, capitulam de maneira indireta ao regime “bonapartista degradado” do chavismo e o governo de Maduro.

O “chavismo crítico”
Outra posição é a do chamado “chavismo crítico”: isto é, aqueles que apoiaram o chavismo e agora tomam distância e são opositores ao governo de Maduro e do PSUV. Seu principal expoente é a organização venezuelana Marea Socialista. Em uma recente declaração8, afirma:

O madurismo e a cúpula do PSUV cruzaram a linha que separava sua vocação autoritária com máscara ‘democrática e pacífica’ para levá-lo ao terreno da tentativa de uma contrarrevolução aberta, com métodos de guerra civil seletiva, que já estão sendo aplicados”. Depois de denunciar a MUD e a “falsa polarização” com Maduro-PSUV, afirmam que“há um terceiro setor que vem ganhando força nos últimos meses, vem crescendo, formando sua personalidade, e começa a aparecer como uma nova referência política por fora destes dois campos. É o que a imprensa local e internacional chamou de ‘chavismo crítico’”. Para a construção deste terceiro setor, “trata-se, a partir de uma revisão crítica e autocrítica dos erros do processo bolivariano, de reconstruir desde os alicerces um projeto nacional e americano”.

Existe, então, em primeiro lugar, um debate sobre o balanço de toda a experiência chavista. Lembremos que Marea Socialista apoiou o “Socialismo do Século XXI” e foi, até recentemente, parte do PSUV. Portanto, para esta organização, a cara feia do governo de Maduro e do PSUV não é a consequência inevitável (e, portanto, seus verdadeiros herdeiros) da raiz de classe burguesa do chavismo e sua política de frear a revolução socialista, mas da “vocação autoritária” da atual direção. Como conclusão, suas propostas se limitam a retomar o “chavismo das origens”, apenas melhorando um pouco.

Além do debate sobre este balanço necessário para preparar o futuro, colocamos para a Marea Socialista a mesma crítica que às organizações anteriores: não propõem ao movimento de massas, como tarefa concreta e imediata, a derrubada do governo de Maduro e seu regime, apesar de caracterizar que impulsionam uma “tentativa de uma contrarrevolução aberta, com métodos de guerra civil”. Se essa é a caracterização, não há alternativa a enfrentá-la, derrotá-la e derrubar este regime e este governo. Sem mencionar isso, eles também capitulam, indiretamente, ao governo de Maduro.

Os “democráticos”
Existem também setores reformistas e neorreformistas mais próximos à socialdemocracia, que se opõem, embora de forma limitada, ao governo de Maduro e sua política antidemocrática. É o caso do Bloco de Esquerda (Portugal), Jean-Luc Melenchón (Front de Gauche, França) e uma parte do PSOL brasileiro. A presidente do Chile, Michelle Bachelet, pronunciou-se contra o golpe de Maduro, e o governo uruguaio da Frente Ampla apoiou a suspensão da Venezuela no Mercosul.

Insistimos que é bom que haja setores de esquerda, ou que assim são vistos pelas massas, que estejam contra a repressão de Maduro. Mas estas organizações e estes governos têm profundas limitações, porque sua política sempre se concentra nas eleições. Contudo, existe outra crítica mais importante: estas organizações e governos acompanham (alguns com argumentos um pouco mais à esquerda) a política do imperialismo europeu, de pressionar Maduro a negociar com a MUD para convocar eleições gerais. Claro, não querem derrubar Maduro por meio da ação revolucionária das massas, mas substituí-lo a partir dos mecanismos da “reação democrática burguesa”.

Nossas propostas
Na declaração da LIT-QI e nos artigos da UST, já mencionados, desenvolvemos mais detalhadamente a política que propomos. Aqui, apresentamos um resumo.

A principal tarefa imediata que propomos aos trabalhadores e às massas venezuelanas é lutar contra o verdadeiro golpe em curso e pelo Fora Maduro! Para derrubar o governo e o regime, propomos uma greve geral organizada a partir da base e um “venezuelazo” que unifique todas as lutas contra Maduro.

Imediatamente, propomos a luta contra a repressão e a realização de eleições gerais livres. Liberdade e autonomia sindical: eleições livres em todos os sindicatos, sem interferência do Estado! Para realizar estas tarefas, estimulamos a mais ampla unidade de ação contra a ditadura de Maduro.

Nesse contexto, não damos nenhum apoio e combatemos à MUD, que quer capitalizar o descontentamento da população contra Maduro para impor um governo que aplique um plano econômico igual ou pior. No âmbito desta luta, é necessário impulsionar a independência política dos trabalhadores em relação aos dois blocos burgueses.

Para resolver as necessidades urgentes das massas, propomos a aplicação de um programa econômico dos trabalhadores e do povo, baseado na expropriação das multinacionais e das grandes empresas, incluídas as da boliburguesia. Prisão dos especuladores e expropriação. Pelo não pagamento da dívida externa. Escala móvel de salários de acordo com a inflação! Congelamento imediato dos preços dos alimentos, e controle operário e popular da sua produção e distribuição.

Diante do golpe e a repressão de Maduro, impulsionamos a autodefesa dos trabalhadores e chamamos às bases dasForças Armadas a romperem com sua direção, não reprimir os trabalhadores e se somar às mobilizações com suas armas.

Por um governo socialista dos trabalhadores, que rompa a falsa dicotomia Maduro-MUD! Pela construção de uma direção revolucionária na Venezuela.

Algumas considerações finais
Correndo o risco de ser repetitivos, queremos reafirmar que as organizações que apoiam e/ou defendem o governo Maduro estão manchando suas bandeiras com o sangue dos trabalhadores e do povo, provocado por uma ditadura burguesa, corrupta e assassina. A LIT-QI não tem nada a ver com esta traição e se localiza, sem hesitação, no campo dos trabalhadores e povo venezuelanos. Isto significa que, na Venezuela, estaremos em trincheiras opostas.

Notas:

1 Ver, por exemplo, a declaração “Aonde vai Venezuela?” do Secretariado Internacional da LIT-QI emhttps://litci.org/pt/especiais/crise-do-chavismo/aonde-vai-a-venezuela/

O MAIS surgiu de uma ruptura recente do PSTU brasileiro e da LIT-QI (2016). Nahuel Moreno foi o fundador da LIT-QI (1982) e faleceu em 1987.

3 As citações a seguir foram retiradas da página facebook do MAIS (https://www.facebook.com/portalesquerdaonline/videos/861664830668007/) e de um recente “pós-esclarecimento”, datado de 06/08/2017, publicada pelo próprio Valério Arcary em sua página (https://www.facebook.com/valerio.arcary.9/posts/1131290907004392).

4 Entre elas, “Intervenções no CEI de abril de 1986”, disponível emhttp://www.geocities.ws/moreno_nahuel/49_nm.html#_Toc536853247

5 http://rnv.gob.ve/venezuela-ha-pagado-60-000-millones-de-dolares-en-compromisos-internacionales/

6 http://www.laizquierdadiario.com.ve/Se-instala-la-fraudulenta-Constituyente-y-la-MUD-apuesta-a-la-presion-imperialista?id_rubrique=5442

7 Vide o artigo “Em defesa da revolução permanente”, disponível na Revista Marxismo Vivo Nova Época nº 3 (São Paulo, 2013).

8 https://mst.org.ar/2017/08/01/venezuela-carta-de-marea-socialista-izquierda-autonoma-al-chavismo-critico/

Tradução: Rosangela Botelho

Publicado originalmente no Portal da LIT-QI