Traição de antigos dirigentes e cooptação de sindicatos e movimentos sociais. Uma história que os trabalhadores brasileiros já conhecem muito bem. No entanto, essa é a realidade também na Bolívia, sob o governo do ex-líder “cocalero” Evo Morales. O Opinião Socialista conversou com o dirigente da histórica Central Operária Boliviana (COB), Ramiro Condori, Secretário de Finanças da entidade. Condori participou do Encontro Nacional contra as Reformas e da reunião internacional realizada pela Conlutas, no dia 23 de março.

Na entrevista, Ramiro desmistifica as “nacionalizações” feitas pelo governo boliviano e denuncia a intervenção de Morales nos sindicatos e na COB.

Opinião Socialista – Morales foi eleito defendendo a nacionalização dos recursos naturais bolivianos. No entanto, a nacionalização anunciada por ele não corresponde às reivindicações dos movimentos sociais do país. Qual é a posição da COB diante disso?
Ramiro – Nós temos denunciado que o exemplo de nacionalização dos recursos que está sendo aplicado não é, de fato, uma “nacionalização”. É uma revisão dos contratos firmados pelos governos anteriores com as empresas transnacionais. Na verdade, é apenas uma adequação dos contratos que, todavia, seguem nas mãos das empresas transnacionais. Para nós, não há nenhuma nacionalização. O mesmo ocorre com as mineradoras. O que Evo está fazendo com a Mina Huanuni, na verdade, não é nacionalização. Estão mentindo para o povo boliviano e para todo o mundo quando dizem que a Bolívia está recuperando os recursos naturais para os bolivianos. Isso é uma completa falácia, uma mentira criada pelo governo.

Qual é a relação da COB e dos movimentos sociais da Bolívia com o presidente Evo Morales?
Ramiro – Lamentavelmente, nós bolivianos apostamos numa mudança nas eleições de 2003 e 2005. Uma mudança do modelo neoliberal. Mas parece que estávamos equivocados, porque a pessoa que apoiamos nas urnas foi o então companheiro Evo Morales. Contudo, desde que assumiu a presidência, Morales está tentando dividir os diferentes setores sociais, ou seja, os sindicatos, federações e confederações. Hoje, o movimento operário na Bolívia está muito incomodado com essa atitude. Seguramente, agora vamos fazer a luta frontal contra esta situação e, para tal, elaboramos uma pauta unificada dos trabalhadores da Bolívia, reivindicando que nossas demandas sejam atendidas. Caso não nos atendam, temos conversado com os demais setores sociais para que seja realizada uma greve nacional com todos os setores estratégicos do país, como mineiros, trabalhadores universitários e camponeses. Se não houver uma resposta rápida, iremos fazer marchas e bloqueios de estradas até que o governo nos atenda.

Como Morales está dividindo os movimentos sociais?
Ramiro – Evo está promovendo a participação dos dirigentes em seu governo, buscando a cooptação dessas entidades. Companheiros que eram comprometidos unicamente com as lutas dos trabalhadores, agora estão ocupando cargos na administração pública, como Abel Mamani (ex-líder da federação das associações de moradores da região de El Alto), que é Ministro de Águas e tem buscado cooptar o resto do movimento. Outro dirigente, que acaba de sair do ministério, é o companheiro Alex Galvez, um ex-metalúrgico. O mesmo aconteceu com outros companheiros que se venderam a esse governo por dinheiro. Quanto a isto, nós, da COB, temos uma posição clara: todos os dirigentes devem ter independência sindical e política para que a Central não se comprometa, institucionalmente, com nenhum partido político, mas, sim, lute em defesa de todos os trabalhadores bolivianos.

Qual é a posição da COB diante desta situação?
Ramiro – Antes de entrar no governo, Evo firmou um pacto com a COB, dizendo que iria lutar para respeitá-lo. Mas, agora, ele está descumprindo esse acordo. Temos denúncias e as fazemos publicamente. Antes de chegar ao governo, Morales, por exemplo, prometeu um salário mínimo de 1800 bolivianos. Atualmente, contudo, o salário é de 550 bolivianos, o que equivale a cerca de 75 dólares. Nesse sentido, esse governo é uma mentira. Vamos continuar esperando que o governo nos receba com nossas reivindicações. Se não nos receber, vamos impulsionar uma série de mobilizações.

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