Para Dirceu Travesso, da Conlutas, sindicatos devem defender estabilidade no emprego, redução das tarifas e estatização do sistema financeiroNa segunda-feira, 3 de novembro, dois dos maiores bancos brasileiros assinaram um contrato de associação. A fusão entre Itaú e Unibanco aumenta ainda mais a concentração bancária. A Itaú Unibanco Holding S.A., como será chamada, tem em mãos 19% de todo o crédito do país, com 14 milhões de clientes. Este será o maior banco do hemisfério sul, com presença em todos os países do Mercosul, e estará entre os 20 maiores do mundo.

Juntos, Unibanco e Itaú somam um patrimônio ativo de mais de R$ 570 bilhões e um patrimônio líquido de R$ 51,7 bilhões. O lucro líquido da nova instituição está estimado em R$ 8 bilhões. Unibanco e Itaú estão entre os bancos que mais lucraram nos últimos anos.

Nada a ver com a crise?
Os dois bancos afirmam que a operação não teria a ver com a crise e que as negociações vinham sendo feitas em sigilo há 15 meses. No entanto, o próprio presidente do Itaú e agora presidente do Conselho Administrativo da nova instituição, Roberto Egydio Setúbal, admite que “talvez a crise tenha criado uma oportunidade, a crise apenas ajudou a amadurecer a idéia. A gente entendeu que tinha que ficar mais forte para enfrentar todo esse processo”. A fusão mostra que o sistema bancário brasileiro não está tão sólido quanto o governo garante.

O Unibanco era responsável, no Brasil, pela atuação da maior seguradora do mundo, a AIG, que quebrou nos EUA. O governo norte-americano, na época, para evitar a falência, injetou US$ 85 bilhões na empresa e, supostamente, a estatizou. A AIG representava 50% da seguradora Unibanco. Por outro lado, o Itaú teve queda de 8% em seus lucros no período de janeiro a setembro de 2008.

Para o bancário Dirceu Travesso, da Conlutas, “Os que dizem que a fusão não tem a ver com a crise parecem o Lula falando que a crise não chegaria aqui e depois jogando R$ 160 bilhões para os banqueiros”.

A medida não é novidade. Desde o início da crise, a concentração bancária e do sistema financeiro em geral tem aumentado muito. Nos Estados Unidos, os bancos JP Morgan e Bank of América, dois dos maiores do país, compraram, cada um, dois concorrentes. E o Wells Fargo, também norte-americano, comprou o Wachovia em outubro. “Em tempos de crise, a concentração aumenta, pelas dificuldades de alguns e porque um dos centros da saída é buscar o aumento da taxa de lucro, explorando mais e ganhando em escala com as fusões”, afirma Dirceu Travesso.

O discurso e a prática
A possibilidade de demissões não foi contestada pelos executivos dos bancos. Juntos, Itaú e Unibanco têm 80 mil bancários, quase 20% de toda a categoria no país. A experiência de outras fusões mostra que muitas agências são fechadas e e áreas comuns são fundidas. Grande parte dos bancários não é relocalizada, mas demitida.

O Itaú, quando comprou o Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj), um banco menor que o Unibanco, demitiu quase mil funcionários. Um ano depois, em 1998, comprou o Banco do Estado de Minas Gerais (Bemge) e desligou quase dois mil bancários. Na compra do Banestado, já em 2001, a diminuição de postos de trabalho foi de 3.754. Em 2002 e 2003, adquiriu o BBA e o Banco Fiat, respectivamente, e demitiu 3.982 trabalhadores. Isso sem falar na experiência de outras fusões como a do Santander-Banespa ou do Real-ABN Amro.

Ao todo, os dois bancos têm, hoje, 4.700 agências espalhadas pelo país. Isso representa 18% da rede de bancos no Brasil. Embora os diretores das duas instituições tenham dito que não fechariam agências, é difícil imaginar que, por exemplo, onde haja uma agência do Itaú ao lado de uma do Unibanco, as duas sejam mantidas. Uma delas, provavelmente, fechará.

A população usuária dos bancos também deverá sofrer as conseqüências. O valor das tarifas e os juros de cartões e limites bancários tendem a aumentar. Esta também é uma forma de aumentar os lucros – ou de reduzir prejuízos no caso de a crise se agravar ainda mais. Prevenindo-se, o Unibanco aumentou todas as tarifas em 6% no dia 30 de outubro, último dia útil antes do anúncio da fusão.

Bola de neve
A crise econômica foi, em boa medida, causada pela concentração de capitais. Mesmo assim, a alternativa apresentada pelos capitalistas é, justamente, ampliar a concentração. A crise no sistema financeiro não afasta a hipótese de novas quebradeiras de bancos e seguradoras. Para desespero de seus funcionários e clientes.

Para Dirceu Travesso, é preciso denunciar as conseqüências da fusão, como um todo. “A defesa dos empregos é fundamental, mas não é o único ponto. Se não defendermos o conjunto dos trabalhadores das conseqüências de tamanha concentração de capital, não conseguiremos defender os bancários. Temos de defender a estabilidade do emprego, denunciar a fusão e exigir a estatização do sistema financeiro, sob o controle dos trabalhadores. Só assim estaremos defendendo todos os trabalhadores, contra os interesses dos agiotas legalizados que formam o sistema financeiro privado.”

Medidas como a estatização do sistema financeiro, que garantam os empregos e reduzam o valor das tarifas são medidas que se chocam com os banqueiros. O governo Lula, caso a crise se aprofunde, irá tomar medidas desse tipo? Afinal, o presidente, deputados e senadores são financiados, nas campanhas eleitorais, pelos grandes bancos. Setúbal apoiou Serra, em 2002, mas tornou-se um ardoroso defensor do governo petista. “Quando ele foi eleito, eu tive uma preocupação de que levasse o governo para uma linha de esquerda, mas ele foi mais conservador do que eu esperava”, afirmou o banqueiro durante a campanha de 2006. “Não tem diferença do ponto de vista do modelo econômico. Eu acho que a eleição do Lula ou do Alckmin é igual”, completou.

O Itaú foi um dos maiores doadores na última campanha de Lula e contribui com deputados e senadores. O PT de Lula iria agora se enfrentar com os banqueiros e seus lucros, para defender os trabalhadores? De que lado o governo vai ficar?