Em 2005, serão realizados plebiscitos em vários países da Europa sobre a adoção da Constituição Européia. Mentindo para a população, os governos do velho continente dizem que a adoção da Constituição irá forjar uma “Europa Social”Depois da derrota da Alemanha e do Japão na II Guerra, os EUA emergiram como a grande potência imperialista, ultrapassando definitivamente a Grã-Bretanha. A Europa enfrentava uma colossal devastação e assistia ao surgimento de uma situação revolucionária em países como a França ou a Itália.

Esse perigo revolucionário convenceu o imperialismo americano a impulsionar a reconstrução do velho continente com o Plano Marshall. A reconstrução, porém, era impossível com as velhas fronteiras. Assim, sob o controle dos EUA, os debilitados imperialismos francês e alemão – forçados pela necessidade de reconstrução e ameaçados pela pressão revolucionária – pactuaram as primeiras instituições comuns, que deram base ao processo que levou ao Mercado Comum e, depois, à União Européia (UE).

A UE é, portanto, a última e contraditória tentativa das potências européias de unificar o continente, agora no marco da globalização, dirigida a acabar com conquistas históricas dos trabalhadores e a recolonizar os povos do mundo.

Desde a Ata Única Européia, em 1986, os imperialistas europeus iniciaram suas ofensivas neoliberais, cuja base cuminou no “Mercado Único”. A queda do muro de Berlim, em 1989, abriu espaço à reunificação alemã e ao posterior colapso, separando a URSS dos países do Leste. O poderoso aparelho stalinista internacional entrou em crise e, com ele, caíram os acordos que repartiam o mundo entre os EUA e a burocracia da URSS, permitindo que os EUA emergissem como a única grande potência militar e econômica do planeta.

O Tratado de Maastrich e a Moeda Única
Em 1991, foi firmado o “Tratado de Maastrich”, com calendário e condições para a unificação monetária da Europa. Em 1994, abriu-se a última fase, a dos “critérios de Maastrich”, que representaram um verdadeiro plano de cortes sociais. Contudo, houve resistência dos trabalhadores que derrubaram os governos de direita da França, Alemanha, Inglaterra e Itália, que foram substituídos por governos social-democratas. No entanto, foram esses “governos de esquerda” que geriram a implantação do euro, assaltando o poder aquisitivo popular e mantendo a ofensiva neoliberal.

A “Estratégia de Lisboa”
Esses governos comprometeram-se, em 2000, em Lisboa, a fazer com que a Europa, num prazo de dez anos, atinja os EUA e se torne a “mais competitiva do mundo”. Claro que não há outra maneira de “atingir” os EUA senão mediante um retrocesso às conquistas sociais e trabalhistas conseguidas desde a II Guerra.

O componente essencial da “estratégia de Lisboa” é a “ampliação ao Leste”, o que representa uma “anexação colonial”. Aproveitando-se das enormes diferenças salariais e sociais, essa estratégia visa a jogar os trabalhadores uns contra os outros para impor um retrocesso geral.

Uma Constituição contra os trabalhadores
A “ampliação” aos países do Leste foi a desculpa para propor uma Constituição Européia. Dessa maneira, pretende-se, pela primeira vez, “constitucionalizar” o neoliberalismo e o intervencionismo imperialista, convertendo-o em lei suprema européia, que deverá submeter parlamentos e governos. A Constituição será imodificável, já que ninguém poderá alterá-la sem a unanimidade dos 25 governos que compõem a UE.

Uma “Europa social” ou um golpe neoliberal?
Os apoiadores do “Sim” nos plebiscitos realizados sobre a adoção da Constituição Européia, dizem que apoiá-la significa apoiar a “Europa social”. Isso, entretanto, se torna literalmente impossível já que nenhum governo poderá aplicar políticas contrárias ao dogma neoliberal. Tudo ficará subordinado a uma “economia de mercado aberta e de livre concorrência”, a um mercado único em que as multinacionais podem fazer e desfazer, mover com inteira liberdade seus capitais e mercadorias, precarizar mais ainda os trabalhadores, rebaixar salários e transferir empresas.

O “direito ao trabalho” das atuais Constituições nacionais – que já era puro formalismo – será substituído pela liberdade “e o direito a trabalhar” (!). Também mudaram a fraseologia do “pleno emprego” pela flexibilização do mercado trabalhista: “potencializar uma mão-de-obra qualificada, formada e adaptável e mercados trabalhistas capazes de reagir rapidamente” (Art. III-203).

Os serviços públicos convertidos
Os serviços públicos se converterão em serviços “de interesse econômico geral”, submetidos às normas da livre concorrência. Aqui a Constituição não obriga a nada aos Estados e se limita a reconhecer “e respeitar o acesso” aos referidos serviços, “segundo as legislações e práticas nacionais”. Caso seja aprovada a Diretriz Bolkestein, apresentada à Comissão Européia em janeiro, serão abertas as portas para um processo generalizado de privatização e degradação dos serviços públicos em toda a Europa.

Os EUA ganham caso a Constituição Européia fracasse?
Este é um dos argumentos mais cínicos para apoiar a Constituição. Custa, porém, sustentá-lo quando a Constituição deixa bem claro que “a política exterior e de defesa” se ajustará aos compromissos da OTAN “que seguirá sendo o fundamento de sua defesa coletiva e o organismo de execução desta”. E pelo que sabemos, quem manda na OTAN é Bush e seus generais.

Xenofobia e ataque às liberdades democráticas
A Constituição define uma Europa xenófoba, convertida em fortaleza, para uma imigração que ela mesma provoca, com seu espólio aos países dominados. Os direitos dos imigrantes não se regerão pela Constituição, mas sim pelas leis de assuntos para estrangeiros de cada nação. Nem sequer suas condições trabalhistas serão iguais às dos trabalhadores comunitários, senão “equivalentes”.

A melhor mostra da Europa que pretendem são os acordos que Schröder, Blair e Berlusconi estão negociando com os países do norte de África para instalar “campos” para os imigrantes expulsos, onde estes permaneceriam no limbo legal, sem direitos e nem controle algum.

A Europa dessa Constituição é uma coligação das diferentes burguesias européias para atacar as conquistas da classe trabalhadora. Em todo o continente, os trabalhadores devem se unir para impedir esse retrocesso, votando pelo “Não” nos plebiscitos.

* Tradução de Cibeli Luz

Post author Felipe Alegria*, de Madri
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