Revolução Árabe coloca o Estado de Israel em cheque. Protestos nas embaixadas do Egito e Jordânia, atritos com governos da Turquia e Egito e protestos em Tel Aviv refletem aumento do sentimento anti-sionista nos povos árabesAlguns jornalistas e escritores acreditam que os processos revolucionários na Tunísia, Egito e Líbia fortalecem o imperialismo e seus representantes na região, como o Estado de Israel. Mas o processo revolucionário árabe caminha em sentido inverso: ameaça as ditaduras apoiadas pelo governo norte-americano, fortalece a causa palestina e questiona diretamente a existência do Estado de Israel. Alguns dos pilares do poder colonial, como o regime de Hosni Mubarak e Muamar Kadafi caíram, deixando um vazio político em seus paises.

Agora Israel está perdendo seus aliados na região e enfrentando o crescimento dos protestos, demonstrando para onde caminha a Primavera Árabe. No dia 9 de setembro, um ato na embaixada de Israel no Cairo chegou a derrubar a bandeira de Israel e obrigou o embaixador e sua equipe a fugir no meio da noite. Protestos se repetiram na Jordânia e, por outros motivos, em Tel Aviv. Na Turquia, cresce o tom contra Israel e as tensões entre os dois governos.

O FIM DA PAZ DOS CEMITÉRIOS
Em 1979 foi assinado o Tratado de Paz entre Israel e Egito, após os Acordos de Camp David (1978). Com eles, o Egito se tornou o primeiro país árabe a reconhecer oficialmente o Estado de Israel.

A Península do Sinai, que esteve entre os territórios ocupados desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967, foi devolvida ao Egito alguns anos depois, em 1982. Com a condição de sua desmilitarização.

Em janeiro deste ano, o governo de Israel foi obrigado a aceitar a entrada de 800 soldados do Egito no Sinai. Diante disso e de muitas manifestações de massas, em maio o governo provisório egípcio determinou a abertura da passagem de Rafah, que liga a península do Sinai à Faixa de Gaza, ocupada por Israel até 2005. A liberação permitiu a entrada de ajuda humanitária, aliviando o bloqueio mantido por Israel. Rafah é o único ponto de passagem para a Faixa de Gaza não controlado por Israel.

Um gesto simbólico no mesmo mês em que os palestinos celebram a Nakba (Catástrofe), que lembra a expulsão e usurpação palestina com a criação do Estado de Israel, em 1948.

Mubarak havia determinado, a mando de Israel, a restrição da entrada de pessoas e bens no território, em 2007, quando o Hamas tomou o controle da Faixa de Gaza. A justificativa era a mesma de Israel, de que o Hamas utilizaria a fronteira com o Egito para contrabando de armas.

EGITO: CRISE E PROTESTOS
O primeiro-ministro egípcio, Esam Sharaf, tenta afastar-se das políticas de Mubarak pró-Israel, para apaziguar as demandas populares, e afirma que o “tratado de Camp David pode a qualquer momento ser discutido ou modificado”. No entanto, sua resposta frágil diante do assassinato de soldados egípcios por Israel desencadeou uma ação popular dramática.

Israel matou quatro agentes de segurança egípcios quando um avião israelense, alegando perseguir dois terroristas, disparou contra membros das forças egípcias. Israel alega que o grupo entrou no pais pela Faixa de Gaza, através do deserto do Sinai.

O ministro da Defesa israelense, Ehud Barak, disse lamentar as mortes. O governo do Egito tentou neutralizar a crise diplomática, mas começaram os protestos.

Mas logo um manifestante escalou vários andares da embaixada de Israel no Cairo para tirar a bandeira israelita e substituí-la pela do Egito. Ahmad al-Shahat ficou conhecido no Twitter como “Flagman”, enquanto os jornais passaram a considerá-lo um herói.

Centenas de manifestantes permaneceram na frente da embaixada, à beira do Rio Nilo, vigiados por soldados e policiais. Um protesto de qualquer tamanho, perto da embaixada de Israel, teria sido rapidamente sufocado nos tempos do ex-presidente Hosni Mubarak.

Então, depois de semanas de protestos, o povo egípcio invadiu a embaixada israelense em 9 de Setembro e expulsou o embaixador e sua equipe de volta para Tel Aviv. Isso depois de mais de mil feridos e três manifestantes mortos.

JORDÂNIA: EMBAIXADA ESVAZIADA
Dias após o embaixador israelense no Egito ter deixado o país em virtude dos protestos, combates semelhantes surgiram em torno da Embaixada de Israel na Jordânia, forçando a saída dos diplomatas.

Foi convocada uma “marcha de um milhão” contra a embaixada israelense, em um dos dois únicos países árabes que têm acordos de paz com Israel. Contraditoriamente, mais da metade dos seis milhões de habitantes da Jordânia são de descendência palestina.

Forças de segurança jordanianas montaram um cordão de isolamento ao redor do prédio, impedindo o acesso dos manifestantes, no dia 15. A representação de Israel em Amã foi esvaziada de forma preventiva por temor de que a situação se tornasse insustentável, como no Cairo.

TURQUIA: ESTREMECIMENTOS E EXPULSÃO DE DIPLOMATAS
A Turquia é um importante aliado israelense, mas as relações diplomáticas estão criando grandes inconvenientes para o governo após o episódio com a Frota pela Liberdade de Gaza, atacada pela marinha israelense e seus comandos. No episódio, os militares mataram oito cidadãos turcos e um cidadão dos EUA de origem turca, em águas internacionais do Mediterrâneo.

Por muito tempo o governo turco apoiou a indústria de guerra israelenses e a ocupação da Palestina. A Turquia é o segundo maior importador de armas de Israel, importou mais que o dobro do que qualquer outro país em 2009, e realizou exercícios conjuntos de treinamento militar.

No entanto a negativa de Israel a se desculpar pelo ataque em 2010 cria atritos entre os governos e enfurece a população turca.

No inicio de setembro pelo menos três diplomatas israelenses foram expulsos da Embaixada de Israel em Ankara. Além disso o governo suspendeu sua cooperação militar com Israel e anunciou um aumento da presença militar turca no leste do Mar Mediterrâneo.

Para se compatibilizar com a revolta da população turca, o primeiro-ministro, Recip Tayyip Erdogan, em visita ao Egito, disse que Israel se isolou e terá de “pagar o preço”, chamando-o de “menino mimado” da região e de apoiar o “terrorismo de Estado”. Ao mesmo tempo, Erdogan está apresentando-se mais e mais como um defensor para os palestinos.

Logicamente os planos do político burguês Erdogan é tentar transformar a Turquia em uma potência regional semelhante a parte do status que detinha como Império Otomano e ganhar credibilidade na região para negociar em melhores condições com a União Européia.

Seja como for, nada isso é bom para o governo de Israel.

PROTESTOS EM CASA
Para complicar ainda mais a vida do governo de Israel mais de 70 mil pessoas participaram de manifestações por justiça social, em mais de uma dezena de cidades. Reclamam que as aposentadorias estão baixas, os hospitais lotados e do preço dos aluguéis e dos alimentos.

Sua lista de reivindicações inclui a redução no imposto do valor agregado, controle de aluguéis, creches gratuitas, aumento no salário mínimo e fim da privatização.

Muitos que sobreviveram ao Holocausto nazista, hoje são pobres. A pobreza afeta quase 20% de todas as famílias de Israel. Os protestos unem uma nação dividida e aproximam judeus e árabes israelenses. Cerca de 87% dos israelenses apóiam os protestos.

Parte importante dos que protestam são cidadãos que fazem serviço militar obrigatório, pagam impostos e tentam pagar suas dívidas, ficando sem nada no final de cada mês.

Para tentar conter as mobilizações, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, estabeleceu uma comissão de especialistas e adiou um aumento nos preços da gasolina. O orçamento do setor de Defesa provavelmente também será congelado.

Durante anos, a política israelense girou em torno do terrorismo e da proteção do país contra ataques externos, com a política social sendo marginalizada. Os gastos sociais estão caindo consistentemente, enquanto os gastos com defesa estão entre os mais altos do mundo.

Do ponto de vista social, Israel esta se transformando em um país de Terceiro Mundo. Enquanto isso, magnatas têm permissão para construir monopólios. Colonos ganham novas estradas e empréstimos a juros baixos, e os judeus ortodoxos ganham bolsas para poderem se dedicar mais ao estudo da Torá.

Ainda há limites no movimento que organiza os protestos. Seus líderes se recusam a incluir o conflito palestino em suas reivindicações, dizem querer resolver primeiro os “problemas internos”. No entanto, em algumas cidades árabes e judeus se sentam juntos para preparar as mobilizações. Este novo espírito de comunidade está rompendo barreiras dentro da sociedade. Por isso a dinâmica dos protestos pode destruir os pilares que sustentam a política de ocupação sionista. E com isso objetivamente ajudar também a causa palestina.

ISOLAMENTO
Com a Revolução Árabe, há protestos, tensões e um sentimento anti-Israel, como não se via em um décadas. Com certeza a sensação do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e seu governo é que o país está cercado por inimigos. A diferença com o passado é que agora não são somente governos de países vizinhos. Ao contrário, muitos deles ajudaram a sustentar Israel no ultimo período, o problema é que agora os povos árabes os vêem claramente como inimigos.

O jornal israelense “Haaretz” insiste que as negociações são a única maneira de aliviar as tensões políticas. Opinião compartilhada por vários ex-chefes de inteligência nos últimos meses.

A pergunta que fica é: “Os israelenses poderão ficar mais seguros cercado por “democracias” árabes? Ou estes processos revolucionários fazem a luta do povo palestino avançar?”.

Os eventos do Oriente Médio indicam as mudanças nas relações de força na região e da tempestade que se forma.