A chamada “Alca Light” é apresentada por setores da esquerda como uma conquista
da “negociação soberana”. Mas não passa de outra versão do mesmo projeto imperialista que atende aos interesses do imperialismo e da classe dominante brasileira

Na semana de 1º a 7 de setembro, a Campanha Nacional Contra a Alca realizará um mutirão nacional de coleta de assinaturas pelo Plebiscito Oficial. No dia 16, o abaixo-assinado será entregue em Brasília. Nos próximos dias, todos devem se empenhar nestas duas tarefas.

Na nossa opinião, é necessário depois disso realizar uma plenária nacional da campanha que debata a continuidade da mesma e suas ações. Pois o governo Lula segue nas negociações e é preciso discutir claramente como e com que objetivos continuar a campanha, já que existem, no mínimo, tensões sobre como a campanha deve se comportar em relação à estratégia levada adiante pelo governo brasileiro em relação à Alca. Acreditamos que a campanha precisa estar orientada para derrotar a estratégia de Lula ou, do contrário, não derrotaremos a Alca e no máximo ficaremos à reboque das “negociações soberanas”.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, não deixa dúvidas sobre as intenções do governo: “Não aderir a um acordo de que o país participou (das negociações) teria um elevado custo político”.
Parte dos integrantes da campanha tem expectativa de que o governo Lula não assinará a proposta original dos EUA e considera “progressista” a política do Itamaraty. O deputado Luís Eduardo Greenhalgh, por exemplo, palestrante oficial do Encontro Jurídico sobre a Alca, defendeu abertamente a “Alca light” e a competência negociadora do governo.

Mas, segundo Amorim, “não se trata de aderir ou não à Alca… cabe ao Brasil definir seus contornos, conciliando interesses ofensivos – no caso do Brasil, acesso ao mercado dos EUA para produtos como aço, calçados, suco de laranja, açúcar…” (jornal O Estado de S. Paulo).

Se há algo claro na estratégia de negociação do governo é que, para ele, não existe hipótese de que o Brasil fique fora do acordo da Alca. A política do governo se resume a que o Brasil utilize sua influência, atraindo outros países da América Latina, para definir os contornos deste acordo, preservando os “interesses nacionais”.

Segundo um alto funcionário do Itamaraty, Antônio Patriota, em palestra na reunião da SBPC em Recife: “a estratégia do governo é aderir a uma Alca light”. Mas o que é a “Alca light”?

Nas palavras de Celso Amorim, a tal “Alca light” seria centrada em “ajustes ofensivos” no processo negociador em andamento, baseados em três eixos:

1. Temas como acesso a mercados e, de forma limitada, serviços e investimentos seriam tratados em negociação entre o Mercosul e os EUA (o chamado “4+1”);

2. As negociações atuais da Alca se concentrariam em solução de controvérsias (disputas entre partes), tratamento especial para países em desenvolvimento, fundos de compensação, regras fitossanitárias e facilitação de comércio;

3. Os temas como propriedade intelectual, serviços, investimentos e compras governamentais seriam transferidos para OMC.

Em nossa opinião, o objetivo de nosso movimento – a ruptura das negociações – não pode ser alterado em troca do apoio ao governo para assinatura de uma “Alca possível”.

Pois a “Alca light” não muda em nada o conteúdo central das negociações originais do projeto lançado pelo imperialismo americano e aceito pelo governo de FHC. A “Alca light” é a negociação da Alca em partes. Na medida em que se fazem acordos sobre alguns temas, o projeto avança para os mais polêmicos, de forma a cumprir o prazo acertado com Bush.

Os chamados pontos “sensíveis” serão remetidos para a OMC e discutidos nos marcos de uma negociação com outros países. Mas isto não muda o conteúdo de liberalização comercial em benefício do capital, apenas aumenta a quantidade de “países” envolvidos. Foi o que o governo americano fez com relação aos temas sobre subsídios agrícolas e regras antidumping (preços de mercadorias subsidiados pelos governos) para tentar quebrar a concorrência dos agronegociantes europeus.

Não importa se a Alca for negociada de uma só vez ou por partes. O pilar do projeto está sendo preservado: o “livre comércio” para empresas americanas explorarem setores como educação, comunicações, planos de saúde, Previdência, propriedade intelectual, energia, transportes e demais serviços (privados ou públicos), compras governamentais etc, gerando mais privatizações, desemprego e mais e mais problemas sociais.

Os “interesses nacionais”

Se o governo Lula e a burguesia brasileira estivessem dispostos a defender os interesses nacionais e nossa soberania, deveriam romper com as negociações, pois qualquer acordo que saia daí será lesivo ao país. Ao contrário disso, o que faz o governo é barganhar melhores condições para os setores da burguesia brasileira aumentar suas exportações ao mercado americano.
Setores do empresariado brasileiro, concentrados na Fiesp, defendem uma “Alca realista”, ou seja assinar o que vier, pois têm garantidas suas exportações para os EUA.

No entanto, a negativa norte-americana de abrir completamente seu mercado agrícola, leva o governo a negociar uma “Alca light” em função dos interesses dos grandes latifundiários. O setor agrícola é responsável por cerca de 1/3 das exportações brasileiras. Em 2003, a safra será 23,21% superior à produção de 2002. No entanto, o resultado destas exportações beneficia somente os capitalistas. Para os trabalhadores sobra desemprego, pobreza e a manutenção de um modelo agrícola baseado no grande latifúndio para exportação.

Para os trabalhadores da cidade e do campo esta Alca não tem nada de “light”, ela responde às necessidades da classe dominante. O governo Lula está abrindo mão dos verdadeiros interesses nacionais para favorecer as exportações, às custas da maioria da população e dos trabalhadores. A Campanha Nacional Contra a Alca deve lutar para derrotar este projeto.

Post author David Cavalcante,
de Recife (PE) e Mariúcha Fontana, da redação
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