Elysium é o novo filme do diretor Neil Blomkamp, o mesmo de Distrito 9

Historicamente, o gênero de ficção científica tem servido, tanto na literatura como no cinema, como um meio para se discutir e refletir sobre os temas e contradições da atualidade, retratados de forma metafórica e por vezes despretensiosa.

O thriller de ficção científica Elysium, do diretor Neil Blokamp, não foge a regra e lança mão de muita ação e uma boa dose de efeitos especiais para expor as contradições de nossa sociedade, sem contudo, se aprofundar na questão chave de como superá-las. Nada que chegue a surpreender, já que se trata de mais um blockbuster hollywoodiano. O que, porém, não significa que um espectador com uma mente crítica e consciente dos desafios colocados para a humanidade em nossa época não possa tirar da película importantes lições.

Neil Blomkamp é um cineastra sul-africano naturalizado canadense que parece ter caído nas graças de Hollywood, onde teve como padrinho ninguém menos do que o badalado Peter Jackson. Após trabalhar com designer de efeitos visuais em Vancouver e dirigir uma meia dúzia de curtas metragens ambientados no universo do icônico game Halo e outros cenários de ficção científica, estreou em grande estilo com o interessantíssimo Distrito 9.

Elysium, o segundo e mais recente filme do jovem diretor, traz no elenco o nome de dois atores brasileiros que interpretam papeis de grande relevância à trama: Alice Braga, uma veterana em Hollywood, e Wagner Moura, um estreante entre os gringos, que recebeu o papel após ganhar notoriedade internacional com seu papel como Capitão Nascimento nos filmes Tropa de Elite e Tropa de Elite 2.

O roteiro nos leva a Los Angeles do Século XXII, onde a divisão de classes na sociedade atingiu patamares surreais e a humanidade é dividida entre multibilhonários que deixaram a Terra para trás para viver em uma estação orbital paradisíaca chamada Elysium. Lugar onde não existe miséria, as pessoas são permanentemente servidas por máquinas dotadas de inteligência artificial que realizam todo o trabalho pesado, e as doenças e todo tipo de males à saúde foram eliminados por uma tecnologia médica miraculosa disponível apenas aos cidadãos de Elysium, ou seja, àqueles que podem pagar. O restante da população, que permanece na Terra, está condenado a viver em mega-favelas em meio ao lixo, violência e todo tipo de degradação, monitorados por robôs-policiais quase tão truculentos quanto os agentes do BOPE em incursão a uma comunidade da periferia carioca.

Fica clara que a intenção do roteiro ao elevar à máxima potência a contradição entre as classes é expor da forma mais explícita possível a relação de exploração de nossa sociedade, que cria riqueza extrema em um pólo em detrimento da maioria da humanidade, condenada à miséria e degradação no pólo oposto. A opção por focar centralmente a questão da saúde é um elemento que expõem ainda mais claramente o caráter brutal da sociedade de classes. É impossível não traçar um paralelo entre os corredores lotados dos pronto socorros municipais por todo país e as filas da morte do SUS, onde os pacientes morrem apenas por não conseguir acesso ao tratamento, com a corrida desesperada dos famélicos cidadãos da Terra para alcançar uma das miraculosas câmaras médicas de Elysium.

*SPOILERS – Daqui pra frente o texto pode conter revelações sobre a trama *

Na trama, Matt Damon, o eterno Jason Bourne, vive o operário e ex-presidiário Max da Costa, que têm a irônica tarefa de fabricar os robôs que servem para reprimir e aterrorizar a população da Terra, ao mesmo tempo em que garantem os lucros de um empresário do ramo da indústria bélica que é cidadão de Elysium. Após um acidente na fábrica, resultante da coação de um encarregado truculento que impõem aos operários um ritmo desumano de exploração para garantir os lucros de seu patrão, Max é informado que foi exposto a uma dose letal de radiação e que tem apenas 5 dias de vida, a menos que consiga acesso a tecnologia médica de Elysium, algo que ele jamais teria condições de pagar com seu miserável salário de operário (Qualquer semelhança com a situação dos operários da vida real não é mera coincidência!). Assim, Max inicia uma busca desesperada que o levará a abandonar a vida honesta como trabalhador, retomar antigos contatos com o submundo da criminalidade, reencontrar um amor do passado e se envolver acidentalmente em uma tentativa de golpe de Estado que lhe dá a oportunidade de perceber que o que está em jogo é mais do que sua sobrevivência e que pode ser mais importante aproveitar uma chance de tentar eliminar a barreira que divide a humanidade entre excluídos e privilegiados.

Embora o desfecho da trama abra margem para interpretações ingênuas e messiânicas, o contexto de denúncia do caráter excludente da sociedade de classes nos permitem uma interpretação mais ousada que nos leva a refletir sobre a importância de se colocar de lado a mesquinhes de uma suposta saída individual para a situação de barbárie e desespero na qual nos encontramos, para considerar o interesse coletivo na superação da sociedade de classes, ainda que isso nos exija a disposição de fazer certos sacrifícios. Parafraseando uma das mais emblemáticas citações de um celebre personagem de outra obra de ficção científica que voltou as telas em outro recente lançamento de Hollywood: “A necessidade de muitos se sobrepõem a de poucos, ou de um”.

Dados Técnicos:

Gênero: Drama

Direção: Neill Blomkamp

Roteiro: Neill Blomkamp

Nacionalidade: EUA

Lançamento: 20 de setembro de 2013 (1h 50min)

Elenco: Adrian Holmes, Alejandro Peraza, Alejandro Rae, Alex Peraza, Alice Braga, BillyJames, BrandonAuret, Carly Pope, Catherine LoughHaggquist, Christopher Vivanco, Claude Duhamel, Derek Gilroy, DominikaZybko, Emma Tremblay, FaranTahir, Hugo Steele, JaredKeeso, Jodie Foster, Jorge Sulser, Lexie Huber, Matt Damon, Michael Mando, Michael Shanks, OnaGrauer, Pauline Egan, SharltoCopley, Terry Chen, Wagner Moura, William Fichtner