Nos próximos dias, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) vai lançar o edital do TAV, Trem de Alta Velocidade. O também chamado Trem Bala ligará Campinas, no interior de São Paulo, ao Rio de Janeiro, passando pela capital paulista e pelo Vale do Paraíba.

Serão 511 quilômetros, com estimativas de gastos na ordem de R$ 34 bilhões. Desses, R$ 20 bilhões serão financiados pelo BNDES. Esta é mais uma Parceria Público-Privada. O concessionário que ganhar o direito à exploração do serviço, terá 30 anos de uso.

Para efeito de comparação, o governo, no anúncio do PAC 2, prevê a ampliação da malha ferroviária em 11 mil quilômetros de ferrovia no país até 2020, ao custo de R$ 20 bilhões. Enquanto isso, o TAV, com apenas 511 quilômetros custará R$ 34 bilhões.

A situação das formas de transporte no país
O Brasil, com a opção de Juscelino Kubitschek de transformar o país no paraíso das montadoras, inverteu a matriz de transportes no país. Até década de 1950, o transporte ferroviário era um dos principais meios de transporte de mercadorias e pessoas.

De meados dos anos 1950 até hoje, o transporte ferroviário entrou em decadência. As empreiteiras e construtoras de estradas, viadutos etc., junto com as montadoras estrangeiras, ditam as normas do transporte de mercadorias e pessoas no país.

Hoje boa parte das principais rodovias brasileiras está em mãos privadas, depois de o Estado ter construído e mantido estas estradas por décadas. Exemplos disso são a Via Dutra, a Fernão Dias, a Regis Bitencourt, entre outras. A situação das rodovias é deplorável, com quedas constantes de barreiras, desmoronamentos de pistas, e excesso de tráfego. As concessionárias privadas fazem apenas reformas pontuais.

Agora, o governo Lula lançou um pacote para o setor ferroviário de transporte, com o TAV e a construção dos 11 mil quilômetros de ferrovias, interligando várias estradas de ferro pelo país. Com a falta de investimento nas rodovias atuais e um sistema ferroviário deficitário para as necessidades de um país continental como o nosso, o governo vai construir ferrovias para a iniciativa privada lucrar.

Isso sem falar das hidrovias, que poderiam ser uma alternativa de transporte por rios.
No entanto, as políticas desastrosas dos sucessivos governos inviabilizam esta opção barata de transporte em prol das montadoras de carros e empreiteiras. Essa possibilidade está sendo jogada no lixo. Os rios que serviram para o povoamento do país pelos Bandeirantes estão sendo destruídos com projetos monstruosos – como a hidrelétrica de Belo Monte, a transposição do rio São Francisco, realizada pelo governo Lula, a proposta de Serra de transposição do rio Paraíba do Sul para abastecer a Grande São Paulo – num país com uma das maiores bacias hidrográficas do mundo.

Privatização e destruição do patrimônio publico
A Mafersa, empresa estatal construtora de trens e metrôs, foi sucateada e privatizada pelo então presidente Itamar Franco. Também havia a Fábrica Nacional de Vagões (FNV), em Cruzeiro (SP), que hoje pertence ao grupo Maxion, com participação acionária do BNDES.

O patrimônio da antiga Mafersa está nas mãos da Alston, gigante norte-americana envolvida em escândalos de propina com o governo José Serra para o fornecimento de trens para o metrô de São Paulo. Ou seja, da mesma forma que fizeram com as as rodovias, os sucessivos governos privatizaram e destruíram parte do parque industrial que poderia fornecer ao país trens e metrôs resolveriam parte dos problemas de transporte público nas grandes cidades e do transporte de mercadorias pelo país. Isso desafogaria as estradas com a retirada de parte dos caminhões que nelas trafegam e baratearia os custos de transporte das mercadorias, pois o transporte por ferrovias é mais barato.

Eleições, Copa do Mundo e Olimpíadas
O governo federal alega que a construção do TAV é uma necessidade por causa da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil. Ora, o transporte coletivo no país é caótico, os ônibus superlotados e caros, trens entram em pane, metrôs têm extensão diminuta para as necessidades do povo trabalhador e desproporcional ao tamanho das grandes cidades brasileiras. Mas para o governo federal o mais importante é a construção de um trem de alta velocidade para os turistas em 2014 e 2016. Enquanto a população paga caro pelo péssimo transporte no país.

O custo mínimo para tarifa do TAV, será de R$ 0,50 por quilômetro, ou seja, uma viagem de 100 quilômetros no Trem Bala custará R$ 50. Hoje, a tarifa de ônibus intermunicipal no estado de São Paulo custa em torno de R$ 20 pelos mesmos 100 quilômetros. Quem vai andar nesse trem?

Até especialistas burgueses, como o Sr. Ozires Silva, fundador da Embraer, questionam a viabilidade do Trem Bala, por ser muito caro e de retorno a longuíssimo prazo. O governo, de olho nos votos e no apoio da Igreja Católica, colocará no edital uma parada obrigatória em Aparecida do Norte, capital da fé católica do país, com o argumento de que oito milhões de romeiros visitam a cidade por ano e seriam potenciais usuários do TAV.

O que o governo esquece é que estes romeiros, em sua grande maioria, se organizam coletivamente em ônibus fretados, as chamadas Romarias, com custo médio de R$ 15 por 100 quilômetros de viagem, menos que os R$ 20 das empresas de ônibus intermunicipais e muito abaixo dos R$ 50 do TAV.

Romper os laços com montadoras e empreiteiras
Para mudar a matriz de transporte do país, é necessário romper os laços com as montadoras e empreiteiras. Nos últimos 50 anos, as montadoras de carros e as empreiteiras da construção civil dominam, junto com os bancos, os destinos dos transportes de cargas e pessoas no país. Os governos federal, estaduais e municipais, há muito, deixaram de ditar as normas e diretrizes para o transporte público de massas e de mercadorias.

A conversão de parte das montadoras de carros para a construção de ônibus, trens e metrôs, sob controle do Estado e dos trabalhadores, é o que poderia efetivamente mudar a matriz de transporte no país. Essa é a única saída para que a população tenha acesso a um transporte de massa público e de qualidade, melhorando parte das condições de vida nas grandes cidades brasileiras.