Governo estadual e empreiteiras são responsáveis pelo desastre que matou sete pessoasNo dia 12 de janeiro, o país começou a acompanhar a tragédia na capital paulista. O desabamento nas obras da futura estação de Pinheiros do metrô expôs de forma dramática os perigos do avanço da privatização e terceirização no setor público. A cada dia, a revelação de um novo detalhe do descaso e da precariedade com que as empreiteiras dirigiam as obras da linha 4 demonstrava que a tragédia foi mais que anunciada.

As obras vêm sendo realizadas pelo Consórcio Via Amarela, composto pelos grupos Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, OAS, entre outros, sob a liderança da Odebrecht. Nas primeiras horas após o acidente, pouca ou nenhuma informação foi divulgada pelas empresas ou pelo governo. Posteriormente, foi constatado o desaparecimento de sete pessoas na região do desmoronamento.

Diante do desespero dos familiares dos desaparecidos, as construtoras tiveram a cara-de-pau de culpar as chuvas pelo acidente. No entanto, os responsáveis pela tragédia têm nome e sobrenome. Trata-se do governo estadual, com sua crescente terceirização do serviço público, além das empreiteiras, cuja sede pelo lucro fácil é mais forte que o respeito às regras de segurança.

Receita para desastres
O sindicato da categoria denuncia que, nos últimos dois anos, a obra contou com nada menos que 11 acidentes, um com vítima fatal. De acordo com o contrato firmado com as empresas, as próprias empreiteiras seriam responsáveis pela fiscalização da construção.

No dia do acidente, entre o início do deslizamento de terra e o desabamento, passaram-se cerca de 30 minutos. No entanto, o consórcio privado não contava com nenhum esquema de emergência para esse tipo de situação. Os próprios trabalhadores foram quem, uma vez percebidos os sinais de desabamento, efetuaram uma evacuação improvisada impedindo que o desastre fosse ainda pior.

O consórcio optou pela forma de construção mais barata e com maiores riscos para a obra, o NATM (New Austrian Tunneling Method), que utiliza explosões e retroescavadeiras para a abertura do túnel. Segundo geólogos, o tipo de terreno, instável por ser margem de um rio, exigiria um outro método, mais caro, o chamado “tatuzão”. Porém, enquanto o método empregado pelas empreiteiras custa U$ 8 mil por metro, o “tatuzão” necessitaria de cerca de US$ 13 mil. O contrato original, inclusive, previa a utilização desse segundo método.

A verdadeira face da lei das PPP’s de Lula
O contrato estabelecido entre o então governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o consórcio transfere toda a responsabilidade das obras para o conjunto de empresas privadas. Ou seja, ao Estado restaria apenas garantir os pagamentos às empresas, já que a própria fiscalização seria realizada pelo consórcio.

No documento do Metrô, “Estudo de Caso PPP – Tornando o Empreendimento da Linha 4 do Metrô de São Paulo uma realidade“, a estatal utiliza dois argumentos principais para a realização da parceria com a iniciativa privada: a “desoneração do Estado“ e o “cumprimento de acordo com o Banco Mundial, o qual requer uma forma de participação privada no projeto‘‘. Essa exigência ocorre porque o banco financiará R$ 209 milhões da obra. O próprio Alckmin confessou à imprensa que o tipo de contrato estabelecido era uma exigência, ou uma “recomendação”, do Banco.

Uma vez finalizada, a entrega da linha 4 do metrô de São Paulo inaugura a série de PPP’s, parcerias público privadas, no país. Pelo contrato, as empresas privadas poderão explorar a linha por 30 anos. A lei das PPP’s foi aprovada por Lula em dezembro de 2004 e institui uma nova modalidade no capitalismo: o investimento sem riscos. Se a empresa não conseguir o mínimo de lucros garantido em contrato, esse déficit é coberto pelo orçamento público.

Cúmplices
Na prática, as PPP‘s significam a privatização do setor público, com a garantia de lucro fácil. Como afirma a nota do Sindicato dos Metroviários, “o governo do Estado e a direção do Metrô passaram a privilegiar os processos de concessão e terceirização, provocando o desmonte das gerências de Projeto Civil, Construção Civil e Montagem, que sempre acompanharam, gerenciaram e fiscalizaram as obras“.

Além disso, o que o sindicato não fala, o Metrô abriu um PDV (Programa de Demissão Voluntária) em 1999, extinguindo cerca de 400 postos de trabalho das gerências.
O sindicato denuncia apenas Serra e Alckmin, mas se cala diante do governo Lula, que foi quem aprovou as famigeradas PPP‘s. Por isso, o metrô abriu PDV em 1998 e 1999, extinguindo cerca de 673 postos de trabalho dos setores de planejamento, projetos e obras.

Uma relação promíscua
O enorme desrespeito e a desconsideração com as famílias dos mortos, que passaram o fim de semana em um estacionamento, sem informações, chocou o país e revelou a verdadeira face das empreiteiras que crescem às custas de sua relação pouco transparente com o Estado.

De acordo com o jornal Folha de S. Paulo de 17 de janeiro, as três principais empreiteiras que estão à frente das obras da linha 4 doaram nada menos que R$ 1,7 milhão ao comitê eleitoral do então candidato ao governo José Serra. Só a OAS doou R$ 1 milhão à campanha. No entanto, não são apenas os tucanos que nadam no dinheiro das construtoras. A Camargo Corrêa presenteou Lula com R$ 2,5 milhões para sua campanha à reeleição. Lula também recebeu generosas doações das outras empresas que compõem o consórcio.

O deputado federal do PCdoB Aldo Rebelo também foi beneficiado com recursos das construtoras. De acordo com a prestação de contas fornecida ao TSE, o deputado recebeu R$ 250 mil da Camargo Corrêa e R$ 50 mil da Odebrecht. Não é estranho, portanto, que o Sindicato dos Metroviários seja a favor das PPP’s e se negue a realizar uma campanha contra as parcerias. Apesar de contar com um setor minoritário que faz oposição à ala governista, a maioria da direção da entidade é ligada ao PT e ao PCdoB.

Campanha exige apuração
As entidades de classe estão se mobilizando para exigirem a suspensão das obras, apuração e punição dos responsáveis pela tragédia. “É importante que os sindicatos de São Paulo se engajem nessa luta”, afirma Alexandre Leme, da minoria da direção do Sindicato dos Metroviários e militante do PSTU. As entidades exigem a apuração não só da obra da estação Pinheiros, mas de toda a linha 4.

As entidades também defendem a participação dos trabalhadores nas investigações, como os do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), que já se prontificaram a acompanhar a apuração do desastre.

A Conlutas participa ativamente da campanha e defende ainda, junto com outros setores de luta como a Pastoral, revogação imediata das PPP’s. “Não basta fazer uma CPI, como o PCdoB defende, temos que lutar pela revogação das PPP’s, pois este modelo é o que causou a tragédia em São Paulo”, denuncia Leme.
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